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‘A vida das pessoas trans não pode ser apagada por atos monstruosos’

Ato em Alegre pede justiça por assassinato de Thiara Eleotério, conhecida como Bedy

O assassinato de Thiara Eleotério Gonçalves, conhecida como Bedy, uma mulher trans de 27 anos, provocou indignação e mobilizou amigos, familiares e a comunidade LGBTQIA+ de Alegre, no sul do Estado, cidade onde ela morava, em busca de justiça pelo crime. Após semanas desaparecida, o corpo de Bedy foi reconhecido pela perícia como o encontrado carbonizado em setembro deste ano em Guaçuí, município vizinho. O sepultamento aconteceu na tarde dessa terça-feira (19), e um ato em sua memória será realizado nesta sexta-feira (22), às 18h, na Praça Ó de Janeiro, em Alegre.

A irmã de Thiara, Élica Gonçalves, descreve a dor pela perda, agravada pela demora em alcançar a responsabilização dos envolvidos. “Tem sido um pesadelo”, lamentou. Segundo ela, o celular de Thiara, peça importante para o esclarecimento do caso, foi enviado para perícia apenas meses após ser entregue à Delegacia de Alegre. “A Justiça está sendo muito lenta”, desabafou. Até o momento, a investigação não identificou suspeitos ou a motivação do crime, e a família conta com um advogado particular para buscar a responsabilização do autor. O poder público local, incluindo a Prefeitura de Alegre, não se manifestou sobre o caso.

Pessoas próximas à jovem também relatam o impacto da violência. “Sempre estávamos juntos e nos encontrávamos. Estive com ela durante o processo de transição”, relata Arthur Monteiro, amigo de infância de Thiara, que cresceu com ela no bairro Vila do Sul. Indignado com o crime, ele provocou o ato na cidade para cobrar por respostas e denunciar a violência contra pessoas trans no Brasil, um dos países com os maiores índices de homicídios dessa população. “Queremos acreditar que a justiça vai acontecer. Nossa voz precisa ser ouvida. Thiara era nossa amiga, uma mulher trans que não fazia mal a ninguém. Isso não pode ficar impune e não iremos esperar calados”, destacou.

Ex-professor de Thiara, Joatan Nunes observou que, apesar de a polícia de Guaçuí se mostrar empenhada na investigação, a falta de apoio das demais esferas do poder público evidencia o descaso com a morte de pessoas trans e travestis. Ele ressalta a luta dos amigos e familiares que buscam preservar a memória da jovem. “Queremos que ela seja lembrada como era: uma pessoa linda, feliz e brincalhona. A vida das pessoas trans não pode ser apagada por atos monstruosos. Infelizmente, nem todos acreditam que a vida de uma pessoa travesti tenha valor. A mensagem que queremos transmitir é de que todas as vidas têm valor e merecem a nossa indignação. Não podemos deixar que sua história seja apagada”, afirmou.

Arthur também mencionou a mobilização da comunidade acadêmica LGBTQIA+ de Alegre e dos movimentos sociais que tem se unido à luta. Ele destacou a importância de ampliar a adesão à causa e pediu reflexão: “Se não fosse uma pessoa trans, será que as pessoas estariam mais indignadas? Nós, da comunidade LGBTQIA+, nos sentimos revoltados. Perdemos alguém que amávamos, e queremos justiça”.

Além do ato marcado para Alegre, movimentos LGBTQIA+ organizam uma mobilização em Cachoeiro de Itapemirim, cidade próxima, para fortalecer a luta por justiça no caso de Thiara.

Beidy desapareceu em 2 de setembro, após sair de casa no bairro Vila do Sul, em Alegre, sem levar pertences. No dia seguinte, seu corpo foi encontrado carbonizado em uma área de mata na zona rural de Guaçuí. A Polícia Científica confirmou a identidade por meio de exame de DNA, e o caso é tratado como homicídio.

Acervo da família

Violência sistêmica

O caso de Thiara não é isolado. Dados de organizações de direitos humanos apontam que o Brasil lidera globalmente o ranking de homicídios de pessoas trans. Em 2024, a Unidade de Monitoramento de Assassinatos de Transgêneros (TMM) da Transgender Europe (TGEU) registrou o maior número de homicídios de pessoas trans e de gênero diverso desde o início de seu levantamento, com o Brasil liderando como o país com mais casos reportados.

A maioria das vítimas eram pessoas pretas ou pardas, o que evidencia como o racismo estrutural se entrelaça com a transfobia e amplia as vulnerabilidades dessa população. O aumento alarmante ocorre em um cenário global marcado por movimentos antigênero e antidireitos, que promovem agendas políticas transfóbicas e antidemocráticas.

De acordo com a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), a expectativa de vida de pessoas trans no Brasil é de apenas 35 anos. O último dossiê publicado pela organização, em 2023, evidenciou um aumento de 10% nos casos de assassinatos de pessoas trans no Brasil em comparação ao ano anterior. Os dados refletem a exclusão social e a violência que essa população enfrenta, agravada pela falta de acesso a direitos básicos como saúde, educação e emprego.

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