A decisão da ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou a suspensão dos efeitos da decisão liminar da juíza da 6ª Vara Cível de Vitória, Ana Cláudia Rodrigues de Faria Soares, que obrigou o jornal Século Diário a excluir cinco conteúdos (dois editoriais e três reportagens) relacionados ao promotor de Justiça capixaba, Marcelo Barbosa de Castro Zenkner, continua repercutindo.
Nessa sexta-feira (8), a versão digital do jornal O Globo, um dos mais importantes do País, publicou ampla reportagem sobre o caso de censura a Século Diário e a decisão da ministra do Supremo que reverteu a liminar da juíza capixaba contra o jornal.
O advogado André Moreira, que durante 13 anos militou na Ordem dos Advogados do Brasil no Espírito Santo, também se posicionou sobre o caso. Ele lamentou a omissão da entidade na defesa da liberdade de expressão.
Moreira, que concorre ao Senado nestas eleições pelo Psol, foi o único candidato a manifestar repúdio ao caso de censura a Século Diário. Abaixo, publicamos a nota do advogado sobre o episódio e aproveitamos para agredecer todos aqueles que se solidarizaram com o jornal.
Mesmo tendo me afastado da disputa corporativa na OAB-ES, não posso deixar de considerar a submissão da entidade ao Poder Judiciário capixaba ou a alguns grupos que se articulam dentro dele. Isso é fato indiscutível que causa extrema preocupação.
A OAB foi, no Brasil e no Espírito Santo, a entidade que melhor representou os ideais republicano e democrático, sendo reconhecida nacionalmente como o último recurso da sociedade contra o abuso, a corrupção e o desvio no exercício do poder público.
A Ordem, no Espírito Santo, cumpriu de forma excepcional essa função até que um grupo, com interesses diversos daqueles que inspiraram sua história até aquele momento, a transformaram num apêndice do Poder Judiciário, num órgão do 3o ou 4o escalão. A OAB, sob a atual gestão, converteu-se de protagonista das lutas sociais em coadjuvante dos interesses dos grupos que ocupam os cargos de poder no estado, sobretudo os grupos ligados ao Poder Judiciário.
Não é à toa que a OAB-ES, desde 2010, não escreve uma só linha sobre a Operação Naufrágio, como não foi à toa que a entidade, reconhecida nacionalmente por ter levado os caras-pintadas às ruas no impeachment de Collor de Mello, em 1992, adotou postura tão ambígua em relação às manifestações ocorridas de junho a agosto de 2013, na nossa Capital, e que essa mesma entidade tenha se posicionado contra a suspensão do pedágio da 3a ponte, convertendo-se quase em advogada da RODOSOL.
Também foi assim que, em meados de 2013, passou despercebido da OAB-ES o projeto de lei que reformava o regimento de custas da Justiça Estadual, cujo resultado inviabilizou, na prática, o acesso à Justiça e, junto dele, a atuação profissional dos advogados civilistas capixabas. A OAB disse não saber de nada. Mas é difícil acreditar que seja possível que uma lei dessa magnitude e com tamanhas implicações sobre nossa atuação profissional pudesse tramitar na ALES sem a ciência da entidade.
Outro exemplo do atual padrão de intervenção da OAB-ES perante a sociedade capixaba é justamente o caso do assédio judicial perpetrado contra o jornal Século Diário, no qual houve evidentemente grave violação dos direitos à informação e à liberdade de imprensa.
Certamente, a OAB que eu conheci não ficaria silente diante de decisões que proíbem divulgação de notícias sobre agentes públicos e que baixam “manual de redação” para jornalistas, em mais que evidente abuso da função jurisdicional. Importante lembrar que o STJ já decidiu, várias vezes, que não é função do Judiciário julgar questões relativas ao “estilo” dos textos jornalísticos e que, especialmente naqueles casos em que está em jogo o direito de criticar a atuação de agentes públicos, os recursos retóricos da sátira e do sarcasmo são plenamente garantidos.
Também, nos treze anos em que militei na OAB-ES, nunca tive o desprazer de presenciar um só caso em que o presidente da entidade declinasse, em favor do Conselho Federal, da competência para apurar e adotar providências contra violação de prerrogativas de um profissional inscrito na seccional, praticada por uma autoridade também local, muito menos por medo de que viesse a sofrer os revezes que são próprios das atribuições da presidência de uma entidade com a estatura da OAB.
O que ocorre hoje no Espírito Santo é angustiante para quem quer que sonhe com um Estado democrático e republicano. Mas é justamente diante dessa angústia que eu gostaria de parabenizar o Século Diário por ter se mantido firme nessa luta pela defesa da Liberdade; porque a liberdade do Século Diário é também a minha e de todos os capixabas. Parabenizo também os colegas advogados que sofrem diariamente no exercício da profissão, nas pessoas de Marcos Dessaune e Karla Pinto [advogados que sofrem perseguição de juízes capixabas], e encareço para que não desanimem da luta pela dignidade do exercício da advocacia.
Por fim, peço perdão – e sei que faço em nome de muitos dos meus colegas – pela omissão “um tanto forçada” da advocacia capixaba.