sexta-feira, novembro 29, 2024
29.9 C
Vitória
sexta-feira, novembro 29, 2024
sexta-feira, novembro 29, 2024

Leia Também:

Cláudio Guerra e Camilo Cola estão no relatório da Comissão Nacional da Verdade

A Comissão Nacional da Verdade (CNV) apresentou à sociedade na manhã desta quarta-feira (10) o Relatório Final do colegiado. A data de apresentação foi escolhida por ser hoje o Dia Internacional dos Direitos Humanos. 
 
A comissão foi instalada em maio de 2012 para apurar e esclarecer, indicando as circunstâncias e a autoria, as graves violações de direitos humanos praticadas entre 1946 e 1988 (o período entre as duas últimas constituições democráticas brasileiras) com o objetivo de efetivar o direito à memória e a verdade histórica e promover a reconciliação nacional.
 
Para a elaboração do relatório a CNV adotou preceitos internacionais e delimitou que as graves violações de direitos humanos são as cometidas por agentes do Estado, a seu serviço ou com a conivência/aquiescência estatal, contra cidadãos brasileiros ou estrangeiros.
 
No documento há a lista com 377 pessoas responsáveis por crimes na ditadura e um dos nomes incluídos é o do ex-delegado de Polícia Civil, Cláudio Guerra. No levantamento é apontado que o então delegado serviu no Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e teve participação em casos de execução, desaparecimento forçado e ocultação de cadáver. 
 
O próprio Guerra já havia admitido a atuação criminosa em depoimentos à CNV, à Comissão da Verdade do Sindicato dos Jornalistas do Estado (Sindijornalistas-ES) e à Comissão Estadual da Verdade. Em agosto de 2014 Cláudio Guerra participou da diligência da CNV à Usina Cambahyba, em Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro, identificada por ele como local onde incinerou corpos de presos políticos levados da Casa da Morte, em Petrópolis, no mesmo Estado entre 1973 e 1974. 
 
O ex-delegado Cláudio Guerra, que falou com exclusividade a Século Diário, não se surpreendeu em ver o nome dele na lista. Afinal de contas, ele relatou os crimes cometidos à CNV. Ele acrescentou que no processo de ajudar a produzir provas contra outras pessoas acabou se expondo, o que seria natural neste caso. 
 
Ele disse, ainda, que expor o próprio nome era o caminho, e que não há como reparar tudo o que fez. “Muito gente me pergunta por que resolvi abrir tudo isso na velhice. Explico que é uma forma de tentar repara o que fiz. “Reconheço que as Forças Armadas erraram, que eu errei, mas o tempo que passei preso me fez refletir”.
 
Guerra disse que na prisão teve um encontro com Jesus e, a partir deste encontro se transformou. “Hoje eu quero o bem, hoje eu amo as pessoas. Sei que o homem não vai me perdoar, mas Deus vai”. Guerra atualmente é pastor, formado em Teologia pela Universidade Federal do Estado (Ufes), e acabou de concluir o mestrado, também em Teologia. 
 
Camilo Cola
 
O empresário e deputado federal, Camilo Cola (PMDB), é citado no relatório da CNV como um dos civis que colaboraram com a ditadura. O documento diz que o “dono da Viação Itapemirim e deputado capixaba pela Arena, foi também um grande contribuinte, cumprindo a tarefa de arrecadar recursos em outras empresas, como a Gasbrás e a White Martins. Favores estatais para a viabilização de negócios foram concedidos aos mais ativos financiadores da estrutura da repressão”. 
 
O envolvimento de Camilo Cola com o financiamento de inúmeras ações clandestinas contra inimigos do regime militar e também contra desafetos pessoais foi denunciado por Cláudio Guerra em depoimento à Comissão da Verdade do Sindijornalistas. A Comissão apurou casos de violações de direitos humanos e crimes cometidos por agentes da ditadura militar contra profissionais de comunicação.
 
No depoimento, Guerra contou como se deu a execução e desaparecimento do corpo do dono do jornal Povão, com sede em Vitória, José Roberto Jeveaux. Ele disse que o crime fora encomendado por Camilo Cola, que estaria sendo extorquido pelo dono do jornal. 
 
Cláudio Guerra contou que tinha reuniões periódicas com os chefes do Serviço Nacional de Informações (SNI) e outros órgãos de repressão que combatiam os adversários do regime militar e recebia encomendas de mortes e desaparecimentos de pessoas, tanto no Estado quanto no resto do País. Essas reuniões ocorriam no edifício IAPI, em Vitória, onde funcionava o gabinete do procurador geral da República no Estado, Geraldo Abreu. 
 
Em uma dessas reuniões, na qual também estava presente o coronel do Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), Freddie Perdigão, e o comandante Vieira, Cláudio Guerra foi comunicado de que eles queriam atender ao pedido de Camilo Cola, que pretendia se livrar das extorsões de Jeveaux. 
 
O ex-delegado, na ocasião dos fatos, teria ponderado que era amigo do dono do jornal e conseguiu ficar fora do desaparecimento de Jeveaux. Cláudio Guerra acrescentou à comissão que o desaparecimento do dono do “Povão” aconteceu 10 dias depois de ele ter recusado a oferta. O crime teria sido feito por uma equipe de fora, com homens de Minas Gerais e Rio de Janeiro, com a cobertura dos policiais locais Moacir e Levi Sarmento. 
 
No depoimento, Guerra disse ainda lamentar ter se omitido, já que poderia ter alertado o dono do jornal, que era seu amigo. 
 
 Ele acrescentou, ainda, que não há dúvida que a morte de Jeveaux foi um crime de mando do SNI para atender ao pedido de um dos principais financiadores da repressão militar contra a esquerda brasileira durante a ditadura militar.
 
Além do desaparecimento do jornalista, uma bomba foi colocada na sede do jornal “Povão”, em Vitória. O vigilante do jornal teria reconhecido as pessoas que colocaram a bomba e também foi eliminado por causa disso.
 
Muitas das revelações que Guerra fez à Comissão Nacional da Verdade (CNV) foram relatadas em primeira mão no livro Memórias de uma guerra suja, dos jornalistas Rogério Medeiros e Marcelo Netto

Mais Lidas