Em ofícios, ONGs exigem ação de Nara Borgo sobre denúncias recorrentes de violência da Suzano e da PM
A prisão de uma liderança quilombola dentro do Território do Sapê do Norte foi o ápice de um período de meses de violências cometidas pela segurança patrimonial da Suzano Papel e Celulose, com a cumplicidade e até colaboração da Polícia Militar, contra a comunidade de Nova Vista. A denúncia é feita nesta quarta-feira (29) por um conjunto de organizações da sociedade civil que atuam na defesa dos direitos das comunidades quilombolas do Sapê do Norte, território tradicional localizado em São Mateus e Conceição da Barra, no norte do Estado, formado por mais de 30 comunidades certificadas pela Fundação Palmares.
Uma das entidades é o Movimento Nacional de Direitos Humanos no Espírito Santo (MNDH/ES), que oficiou a Secretaria de Estado de Direitos Humanos (SEDH), cobrando posicionamento firme diante do quadro prolongado de violências contra Nova Vista e outras comunidades do território. No ofício, a coordenadora, Galdene dos Santos, que também preside o Conselho Estadual de Direitos Humanos (CEDH), informa que ambas instituições acompanharam diretamente a prisão de Antonio Sapezeiro, por meio de uma advogada popular que se deslocou até a Delegacia de São Mateus, onde permaneceu das 23h dessa terça-feira (28) até às 4h desta quarta.
Por volta da meia-noite, relata o ofício, a advogada informou ao MNDH/ES que, ao chegar na delegacia, já havia muitos seguranças e um advogado da Suzano e que “sua chegada irrita os policiais e que todo o atendimento na delegacia encerrou-se às quatro da manhã”. A delegacia também fez menção ao depoimento prestado pelos policiais militares e seguranças da Suzano, informando que “eles acusam Sapezeiro de colocar fogo, mas conforme informações das lideranças e as gravações feitas por eles, essa informação não é verdadeira “.
O documento é encaminhado à secretária, Nara Borgo, e ao coordenador da Comissão Permanente de Conciliação e Acompanhamento de Conflitos Fundiários, Renato Pazito Silva. A cobrança feita à pasta é para que seja convocada uma reunião da Mesa de Resolução de Conflitos, que é coordenada por sua pasta, em caráter de urgência, e que seja feita a apuração das denúncias com a “Suzano, a Polícia Militar de São Mateus e, acima de tudo, com as lideranças e o próprio Sr. Sapezeiro, bem como seja feito exame de corpo de delito no Sapezeiro, pois chegaram denúncias de que ele apanhou, visto que fez uma cirurgia recente”.
Em nota, a SEDH afirmou que “acompanha o caso por meio da Comissão Permanente de Conciliação e Acompanhamento dos Conflitos Fundiários e a Gerência de Igualdade Racial. Informamos ainda que, diante das denúncias recebidas hoje [quarta] em reunião com o Conselho Estadual de Direitos Humanos e representantes da comunidade de Nova Vista (São Mateus), já foram feitos direcionamentos para que as violações de direitos humanos sejam apuradas”.
A coordenadora do MNDH e presidenta do CEDH afirma que a libertação de Sapezeiro é urgente e que os advogados quilombolas continuam atuando nesse sentido, juntamente com a Defensoria Pública da União (DPU). Em paralelo, é organizada uma incidência no território ainda nesta semana, juntamente com a ONG Federação dos Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase) e da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, presidida pela deputada Camila Valadão (Psol). “É um pedido antigo da comunidade Nova Vista, que seja feita essa visita ao território, para verificação das violações que eles vêm sofrendo”.
Galdene Santos conta que, por meio dos relatos das lideranças e dos vídeos enviados, “o que vemos é os seguranças agindo com aval do Estado, por meio da Polícia Militar. Chegam sempre juntos na criminalização e repressão das lideranças quilombolas”. Uma questão que vai ser exigida, afirma, é para que a Secretaria de Estado de Segurança Pública e a Suzano informem se têm autorização para fazerem o que fazem. “Destruir a estrutura feita pelos quilombolas, cortando cercas e destruindo os plantios…eles têm mandado judicial para isso?”, questiona.
Nos vídeos, prossegue Galdene, há vários fatos questionáveis. “Uma coisa gravíssima: Sapezeiro é preso e a moto dele é colocada no carro da Suzano, ao invés do carro da Polícia. A gente percebe que há uma perseguição a Sapezeiro, para criminalizá-lo, a ponto de chama-lo de invasor, sendo que ele é quilombola nativo daquele território e as retomadas são instrumentos de luta legítimos”.
A Adai, entidade que faz a assessoria técnica dos atingidos pelo crime da Samarco/Vale-BHP no Espírito Santo, incluindo o território quilombola, também se manifestou. “Antonio Sapezeiro foi agredido covardemente e levado para a prisão pela Polícia Militar, que vem atuando no local com truculência, conjuntamente com a empresa Suzano. (…) O povo quilombola do Sapê do Norte é vítima de uma sucessão de violações de direitos e luta contra o projeto colonialista que invade seus territórios há décadas para produção de eucalipto, álcool, petróleo, sal-gema, entre outros projetos (…) Trata-se de caso que exemplifica o racismo institucional e ambiental do Estado do Espírito Santo e em nosso país, que deve ser combatido por todas e todos nós”.