As Defensorias Públicas dos Estados do Rio de Janeiro, Bahia, Distrito Federal, Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Sul, São Paulo e Tocantis, que integram o Grupo de Atuação Estratégica das Defensorias e Distrital dos Tribunais Superiores (GAETS), foram admitidas como amici curiae (amigos da corte) no habeas corpus coletivo concedido ao sistema socioeducativo capixaba.
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) determinou ao governo do Estado reduzir a superlotação da Unidade de Internação do Norte, Unis Norte, localizada em Linhares. Chegando a ter taxa de ocupação de até 300% nos últimos anos, a Suprema Corte brasileira determinou que o índice fosse reduzido para até 119%. Não sendo possível a transferência para outras unidades, que também não devem ultrapassar o limite, o STF determinou que os adolescentes cumpram medidas socioeducativas em meio aberto, o que está sendo concretizado. Mais de 200 jovens deixaram a Unis Norte.
“Com isso dá a impressão de que essa decisão poderá ter extensão ou de alguma forma afetar todos os estados da federação”, explica o defensor público Renzo Gama Soares, do Núcleo de Infância e Juventude da Defensoria Pública do Estado (DPES).
Segundo ele, todos os adolescentes que precisavam deixar a Unis em cumprimento do habeas corpus já saíram da unidade. Os próximos passos são acompanhar o cumprimento das medidas socioeducativas de meio aberto. “Já acompanhamos os processos de execução em meio aberto (nas cidades em que há defensor público). A ideia é intensificar esse acompanhamento, com uma maior proximidade dos equipamentos de assistência social que executam essas medidas.Para isso, faremos uma reunião na sexta-feira (5) com os defensores públicos do norte do Estado, para acertarmos essa atuação”, explicou.
Dados referentes ao ano de 2016, divulgados recentemente pelo Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), órgão ligado ao Ministério dos Direitos Humanos, revelaram que a cada 10 adolescentes que cumprem medida socioeducativa no Brasil, nove tiveram aplicada a medida mais severa, a internação. A privação de liberdade que, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente deve ser a exceção da exceção, tornou-se regra, levando à superlotação das unidades, que, em alguns casos, se assemelham a presídios juvenis, com rebeliões e mortes. Segundo o mesmo levantamento, em 2016, foram registradas 39 mortes de adolescentes que cumpriam medida socioeducativa de internação.
Defensores públicos e integrantes da sociedade civil não defendem a construção de novas unidades de internação no Espírito Santo, mas que o sistema realmente seja ressocializador e que o Estatuto da Criança e Adolescente seja cumprido, privando de liberdade apenas os casos mais graves, em que haja risco para o convívio em sociedade.
Para o defensor, a superlotação das unidades poderia ser evitada, analisando-se melhor a medida socioeducativa a ser adotada. “No caso de um latrocínio, que é o roubo seguido de morte, achamos plausível a internação. Mas há casos de furtos primários, sem violência, em que o adolescente está estudando e trabalhando e que a internação também é aplicada sem necessidade plausível”, explicou.
Os dados do Sinase de 2016 apontam que do total de adolescentes cumprindo medida socioeducativa, 70% estão em internação, 20% em internação provisória, 8% em semiliberdade e 2% em “outros”. Já os delitos cometidos são roubo e furto (50%), tráfico de drogas (22%) e homicídios (13%).
A Defensoria Pública do Estado está realizando um levantamento para saber se os municípios do norte e noroeste do Estado, cidades de origem dos adolescentes, têm estrutura para que os jovens liberados da Unis Norte, de fato, continuem com o cumprimento de suas medidas socioeducativas. De acordo com o defensor Renzo Soares, essas cidades precisam ter uma rede de atendimento social capaz de oferecer as atividades necessárias, geralmente realizadas nos Centros de Referências de Assistência Social, os CRAS. Nesta semana, uma suplementação orçamentária foi aprovada para a Secretaria de Estado da Assistência Social como forma de cumprir a determinação do STF.
Em oito anos, o número de adolescentes cumprindo medidas socioeducativas mais que dobrou no Estado. Os dados, do Observatório da Criança e do Adolescente da Fundação Abrinq, indicam que, em números absolutos, em 2008, eram 547 jovens. Já em 2016, a soma chegou a 1,1 mil. O estudo revelou, ainda, outro agravante, a maior parte desses jovens recebeu a mais severa das punições, a internação, enquanto poderiam ser adotadas outras medidas.
Segundo apontam dados da pesquisa da Fundação Abrinq, em 2016, dos 1,1 mil jovens capixabas que cumpriam medida socioeducativa, 754 estavam internados. No mesmo ano, foram registrados 149 adolescentes em internação provisória e apenas 37 em semiliberdade.