Movimento das Pessoas Atingidas quer dialogar com a nova ministra, Macaé Evaristo
Passados 10 meses da sanção da Lei 14.736/23, que garante pensão vitalícia para os filhos separados dos pais com hanseníase em todo o país, os beneficiados ainda não puderam usufruir desse direito, pois a lei não foi regulamentada. Por isso, o Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan) solicitou uma reunião com a nova ministra dos Direitos Humanos e Cidadania, Macaé Evaristo, para tratar do assunto e, também, ter a possibilidade de ver a minuta, já que informações extraoficiais apontam que está diferente da proposta pelo movimento.
A lei, sancionada em novembro último, sem vetos, concede pensão vitalícia de uma salário mínimo (R$ 1.420,00) aos filhos de pessoas com hanseníase que foram separados dos pais devido à política de isolamento compulsório dos doentes adotada para controlar a doença em boa parte do século passado.
Depois da sanção, o Morhan elaborou uma proposta de minuta, encaminhada para o Ministério de Direitos Humanos e Cidadania. A previsão era de que a regulamentação ocorresse em julho último, durante a 5ª Conferência Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência. Contudo, isso não aconteceu.
O integrante da coordenação nacional do Morhan, José Adimilson da Rocha Picanço, destaca que “a lei dá com uma mão e a minuta tira com a outra”. As diferenças principais são duas. Ele informa que a lei garante a pensão para quem foi separado dos genitores, independentemente de ter sido separado do pai, da mãe ou dos dois. Já a minuta, segundo as informações extraoficiais, tem como foco somente quem foi separado do pai e da mãe. Outra divergência está no fato de garantir o direito somente para os filhos que foram internados nos educandários.
Após a exoneração do ex-ministro Sílvio Almeida, afirma Adimilson, a Comissão de Avaliação da Lei nº 11.520, que prevê pensão vitalícia no valor de R$ 1,6 mil àqueles que foram internados compulsoriamente e que vai acompanhar a pensão dos filhos, já se reuniu, mas o Morhan não foi convidado. Quando demonstrou interesse em participar, ouviu como resposta que não era possível por haver “conflito de interesses”.
No Espírito Santo, os filhos separados dos pais com hanseníase eram encaminhados para o Educandário Alzira Bley, no bairro Padre Matias, em Cariacica. Seus pais para eram levados compulsoriamente para o hospital Pedro Fontes, que fica ao lado. A prática do Estado de separar os filhos dos pais com hanseníase teve início na década de 20, no primeiro governo do presidente Getúlio Vargas. Com a descoberta da cura da enfermidade, o fim da internação compulsória aconteceu em 1962, mas há registros de que continuaram a acontecer, em todo o país, até a década de 80.
Tramita na Assembleia Legislativa um Projeto de Lei semelhante ao aprovado em nível nacional e que precisa ser regulamentado. Trata-se do PL 611/2023, de autoria do deputado estadual João Coser (PT). Na justificativa da proposta, consta que, no Estado, há 150 filhos separados dos pais, mas isso é contestado pelo coordenador da mobilização dos filhos separados no Espírito Santo, Heraldo José Pereira, que afirma que o total é de cerca de 600.
Heraldo explica que 150 são os filhos que foram separados dos pais, mas não internados no Educandário Alzira Bley, em Cariacica. Os internados somam cerca de 450. O objetivo é que todos sejam contemplados, totalizando, portanto, 600.
A proposta busca “criar reparação às vítimas da segregação parental decorrente da política sanitária de contenção da hanseníase” e havia sido arquivada com o término do mandato do autor, o ex-deputado estadual Hércules Silveira.
O PL prevê uma pensão vitalícia para os filhos separados dos pais acometidos pela hanseníase, assim como aprovado em âmbito nacional. O valor estipulado no Estado para o benefício é de 600 VRTE’s – Valor de Referência do Tesouro Nacional – o que corresponde a dois salários mínimos – R$ 2,6 mil.
De acordo com a proposta, a pensão é “personalíssima”, ou seja, não transmissível a dependentes e herdeiros. Além disso, “o recebimento de outras indenizações de qualquer espécie pagas pela União decorrentes de responsabilização civil sobre os mesmos fatos não exclui o direito previsto na presente lei”, logo, o recebimento do benefício aprovado em âmbito nacional não impede o estadual.
Conforme consta na justificativa do PL 611/2023, a proposta “trata-se não apenas de uma reparação financeira, mas também um reconhecimento do crime que foi cometido contra eles, pois é impossível reparar os danos causados a esses filhos segregados em sua totalidade. A discriminação, o preconceito e a segregação marcaram, de uma maneira imensurável, os filhos separados”.