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Movimentos sociais do Estado foram fundamentais para políticas de direitos humanos

Conclusão é de pesquisa realizada por professora da Ufes, Euzeneia Carlos, que analisou a importância da atuação de entidades da área

Artigo publicado por uma pesquisadora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) investigou duas décadas de atuação do Movimento de Direitos Humanos no Estado. Publicada em junho, a pesquisa verificou que os movimentos sociais capixabas foram fundamentais para o desenvolvimento de políticas públicas a nível estadual e nacional.

A pesquisa analisou o Movimento de Direitos Humanos do Espírito Santo (MDH-ES) nas décadas de 1990 e 2000. O objetivo era identificar as consequências das mobilizações sociais na construção de políticas públicas que defendem direitos fundamentais. “A pergunta principal era essa: Os movimentos sociais importam para as políticas públicas?”, conta a autora Euzeneia Carlos, professora e pesquisadora do Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais da Ufes. 

Arquivo Pessoal

Para analisar o trabalho desenvolvido durante esse período, a pesquisadora focou em duas mobilizações do MDH-ES: a Campanha Contra a Impunidade e Corrupção, realizada de 1993 a 2002, e a Campanha Contra as Violações no Sistema Prisional, promovida entre 2003 e 2012. A conclusão foi positiva.

“Os movimentos sociais progressistas têm a capacidade de estar à frente da sociedade porque buscam a mudança social, a ampliação e o aprofundamento da democracia, além da inclusão de direitos de grupos que, tradicionalmente, são excluídos”, destaca Euzeneia.

A pesquisadora identificou que a Campanha Contra a Impunidade e Corrupção resultou na institucionalização de iniciativas que saíram do Espírito Santo e chegaram a nível federal, como o Programa de Proteção de Vítimas e Testemunhas Ameaçadas (Provita) e, anos depois, o Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAAM); e o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH).

A campanha, liderada pelas bases estaduais do Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH), surgiu em um período em que o Estado lidava com denúncias de crime organizado em instituições públicas e com a atuação constante de grupos de extermínio.

“O Espírito Santo passava por uma situação de ameaça a vítimas e testemunhas, lideranças políticas, prefeitos, sindicalistas, lideranças de movimentos sociais, além de assassinatos e repressão contra testemunhas de crimes”, aponta.

A organização coletiva em torno da campanha influenciou medidas institucionais, como a instalação da Comissão de Processos Administrativos Especiais (CPAE) pelo então governador Albuíno Azeredo (PDT), abertura de inquérito policial para investigar a presença do crime organizado em instituições do Estado e a criação do Conselho Estadual da Criança e do Adolescente (Criad).

“A principal tática do movimento foi a elaboração de documentos que comprovam por meio de evidências a violação de Direitos Humanos, através de relatórios, dossiês e banco de dados que fundamentam suas denúncias às autoridades”, diz um trecho do artigo.

Outra contribuição dos movimentos sociais foi a criação de instrumentos de inovação social, como a base de dados que mais tarde se transformaria no Centro Integrado Operacional de Defesa Social (Ciodes).

“Antes não existiam informações sobre os homicídios. Os ativistas de direitos humanos recebiam as denúncias, só que os órgãos públicos não forneciam informações com uma integração das estatísticas criminais. Essa inovação surge com os movimentos sociais”, explica Euzeneia.

Anos depois, a Campanha Contra as Violações no Sistema Prisional iria promover mais avanços, como a estruturação de setores voltados para a defesa dos direitos humanos nos órgãos públicos estaduais e a articulação com órgãos de regulação internacionais, como a ONU e OEA.

“A área de direitos humanos foi difícil de se constituir no Espírito Santo […]. A luta desses movimentos se concretiza na criação de programas que vão viabilizar ações de proteção às pessoas, mas isso também se dá no sentido de criar uma burocracia pública, que são órgãos de expertises dentro do Estado, com recursos financeiros, recursos humanos, todo um setor voltado para essa área”.

Para desenvolver a pesquisa, Euzeneia analisou documentos da época, além de realizar entrevistas em profundidade com os próprios ativistas que atuam na área dos Direitos Humanos. Para ela, embora haja um longo caminho pela frente, as organizações capixabas foram responsáveis por uma série de avanços obtidos na área.

De acordo com a pesquisadora, além de estarem à frente do seu tempo, hoje esses movimentos funcionam como “sentinelas da sociedade”, exercendo um papel essencial. “Eles fazem a leitura do contexto político, percebem as mazelas, transformam em demandas e vão buscar pressionar o poder público e a própria sociedade para a criação de ações concretas do Estado”, ressalta.

O artigo foi publicado na Revista Dados, uma das principais no campo das Ciências Sociais. A pesquisa foi realizada com o auxílio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes).

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