Manifestantes contra o Projeto de Lei (PL) 1904/2024, que equipara aborto realizado após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio simples, inclusive nos casos de gravidez resultante de estupro, voltam às ruas de Vitória na próxima terça-feira (2). O Movimento de Mulheres Negras, junto com a Frente pela Legalização do Aborto no Espírito Santo (Flaes), irá fazer uma manifestação em frente à Assembleia Legislativa, a partir das 13h.
A militante do Movimento de Mulheres Negras, Marilene Aparecida Pereira, destaca que a maioria das meninas vítimas de violência sexual são negras, portanto, as que mais precisam recorrer à interrupção da gestação. “Não queremos que crianças negras, mulheres negras, já violentadas, sejam criminalizadas”, enfatiza.
O projeto foi assinado por mais de 30 parlamentares, entre eles Gilvan da Federal (PL) e Evair de Melo (PP), ambos da bancada capixaba. A proposta ficou conhecida como PL do Aborto e PL da Gravidez Infantil, já que as meninas são consideradas as mais prejudicadas caso seja aprovado, pois, entre as pessoas que procuram abortamento legal acima de 22 semanas em caso de estupro, há um número considerável de crianças vítimas de abuso sexual. Isso porque, nessas situações, há mais demora em descobrir a gestação.
A manifestação da próxima terça não será a primeira realizada em Vitória. No último dia 16, ocorreu uma também em frente à Assembleia, organizada pela Flaes e pelo Fórum de Mulheres do Espírito Santo (Fomes). Ainda na Grande Vitória, aconteceu, em Guarapari, também no dia 16, a roda de conversa “Políticas Públicas para Mulheres e Controle Social: Nenhum Direito a Menos!”. No dia 17 foi realizada, na Praça Costa Pereira, Centro de Vitória, uma banca de diálogo, na qual as pessoas puderam conversar e tirar suas dúvidas sobre o projeto de lei.
Um dia depois, no Metrópoles, na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), foi realizado o Cine Debate, com exibição do filme
Levante. Nessa terça-feira (25), o tema foi debatido no Espaço Cultural Thelema, no Centro de Vitória.
No interior, nessa quinta (20), as mulheres realizaram uma manifestação no Centro de São Mateus, no norte do Estado, e, na sexta (21), em Cachoeiro do Itapemirim, na região sul.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) também se pronunciou. O Conselho Pleno do Conselho Federal (CFOAB) aprovou um parecer contrário ao PL 1904/2024, elaborado por uma comissão formada por mulheres da OAB, que apontaram inconstitucionalidade. O documento foi apresentado e votado pelos 81 conselheiros federais. “O texto grosseiro e desconexo da realidade expresso no Projeto de Lei 1904/2024, que tem por escopo a equiparação do aborto de gestação acima de 22 anos ao homicídio, denota o mais completo distanciamento de seus propositores às fissuras sociais do Brasil”.
No Espírito Santo, o projeto ganhou apoio de mais da metade dos deputados estaduais. Dos 30 parlamentares, 17 assinaram uma moção de apoio à proposta. A iniciativa partiu do deputado Callegari (PL) e é assinada pelos demais parlamentares da bancada do PL, Capitão Assumção, Lucas Polese e Danilo Bahiense; do Republicanos, Sergio Meneguelli, Bispo Alves, Hudson Leal e Alcântaro Filho; e por Coronel Weliton (PRD), Allan Ferreira (Podemos), Lucas Scaramussa (Podemos), Mazinho dos Anjos (PSDB), Zé Preto (PP), Denninho Silva (União), Adilson Espíndula (PSD), Bruno Resende (União) e Theodorico Ferraço (PP).
Lançamento da marcha
O protesto também marca o lançamento da Marcha das Mulheres Negras por Reparação e Bem Viver, que será realizada em novembro de 2025, em Brasília. Portanto, não será somente contra o PL, mas também por reparação ao povo negro, já que, conforme recorda Marilene, após a abolição da escravatura, não foram implementadas “políticas públicas feitas para a população negra viver com dignidade”. “Viver por nossa conta não dá, nós construímos esse país também”, destaca.
Além do direito ao aborto legal, as mulheres irão denunciar os altos índices de feminicídio contra mulheres negras no Espírito Santo, onde, de acordo com Marilene, cerca de 60% das vítimas são negras. Por isso, levarão cruzes para a frente da Assembleia Legislativa.
Também comparecerão mulheres de religiões de matriz africana, com vestes alusivas às suas religiões, para denunciar a intolerância, já que o Estado tem registrado aumento de casos de incêndios criminosos em terreiros. No protesto será denunciado, ainda, o extermínio da juventude negra. “Qual a perspectiva para um jovem negro a não ser acabar morto pela polícia?”, questiona Marilene.