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‘O que mais acontece entre os não ciganos é homem que mata mulher’

Nilcélia de Jesus relata aumento da discriminação contra a comunidade cigana após assassinato de Hyara Flor 

A morte da jovem cigana Hyara Flor Santos Alves tem tido desdobramentos no Espírito Santo não somente pelo fato de seu esposo, suspeito do assassinato, ter sido encontrado em Vila Velha, mas também por causa do aumento da discriminação contra a comunidade cigana do Estado. Com a repercussão do caso, relata a tesoureira da Associação Municipal de Etnias Ciganas de São Mateus (AMEC), Nilcélia de Jesus Santos, o “julgamento silencioso”, tão comum no cotidiano desse povo, tornou-se ainda mais acentuado.

O que Nilcélia chama de “julgamento silencioso” nada mais é do que os olhares que demonstram condenação e medo direcionados aos ciganos. As atitudes, afirma, têm abarcado ainda práticas como o mau atendimento nas repartições públicas. “Casos de a gente chegar no local e sermos os últimos a serem atendidos, e quando somos, não nos tratarem da mesma forma como tratam os não ciganos. Isso tem aumentado”, destaca.
Hyara tinha 14 anos e foi assassinada em Guaratinga, na Bahia, no dia 6 de julho. Estava casada com o acusado, também de 14 anos, há 45 dias. Ele foi apreendido em Vila Velha e foi transferido para a Bahia na última quarta-feira (26). Nilcélia questiona a forma como as críticas ao caso vem sendo feitas, pois é como se isso fosse frequente na comunidade cigana, e somente nela.

“A comunidade está sofrendo com esse crime e pede justiça, quem cometeu não pode ficar impune. Sofremos mais ainda pelo fato de tratarem como se fosse algo recorrente entre nós e como se não acontecesse em nenhum outro espaço. O que mais tem entre os não ciganos é homem que mata mulher, mas é muito mais fácil falar daquilo que não se conhece, dar opinião sobre uma cultura que não é a sua, em vez de encarar sua própria realidade”, diz Nilcélia, que recorda que o Espírito Santo tem altos índices de feminicídio.

As críticas à cultura cigana, aponta, têm sido feitas também devido ao casamento de dois adolescentes de 14 anos. “Na nossa tradição procura-se um casamento em que a família do marido vai cuidar da menina. Os pais do marido têm que cuidar como se fosse filha, dar o mesmo tratamento que dá aos filhos”, conta.

Nilcélia afirma que muitos têm encarado os jovens já serem casados como “um absurdo, uma violência”. “Mas esquecem que é muito comum na sociedade meninas serem violentadas pelos pais, padrastos e outros familiares”.

Hyara Flor foi baleada no queixo dentro de casa, levada ao hospital, mas não resistiu. Após o crime, o marido e sua famílias fugiram, sendo encontrados em Vila Velha, na Grande Vitória. O pai da jovem, Hyago Alves da Silva, acredita que a morte foi planejada, já que a sogra da filha estava tendo um caso extraconjugal com um tio da menina, tratando-se, portanto, de uma vingança. Já o pai do suspeito, Júnior Silva Alves, o “Amorim”, diz que o tiro foi acidental, disparado pelo filho de 9 anos ao brincar com a arma.

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