Brigadas Populares criticam falta de políticas de moradia na gestão Pazolini e pedem apoio às famílias
Um dia depois de a Assembleia Legislativa aprovar uma lei que proíbe os despejos até o fim do ano e um dia antes de uma manifestação de movimentos sociais contra os despejos, famílias sem-teto que habitam um imóvel abandonado há mais de 10 anos no Centro Histórico de Vitória vivem dias de angústia e incerteza.
A Ocupação Moa do Katendê, na região do Parque Moscoso, é onde vivem cinco famílias, incluindo crianças, idosos e uma pessoa acamada em tratamento médico. A maioria habita o imóvel de quatro andares há dois anos, exceto uma família que vive na garagem do prédio há cinco anos. O local também abrigou uma estamparia e recebeu outras atividades políticas, culturais e produtivas.
O imóvel privado foi colocado em leilão no final do ano passado e, agora, o comprador quer tomar posse do local. A reintegração de posse, que estava prevista para ocorrer até o dia 21, teve prazo ampliado para o dia 31 de março.
Em nota pública, as Brigadas Populares, organização que coordena a ocupação, se manifestaram reclamando da falta de apoio às famílias sem-teto e ausência de política habitacional no município de Vitória.
Estefani Dalmacio, da Frente de Reforma Urbana das Brigadas Populares, aponta que as famílias não têm condições financeiras de arcar com aluguéis, pois estão desempregadas ou sem renda fixa, sobrevivendo de bicos ocasionais e auxílios como Bolsa Família e serviços públicos de assistência social como Cras e Creas.
“Estamos tentando buscar soluções para essas famílias, o Estado precisa agir para que não fiquem na rua”, diz Estefani. Ela aponta que a situação está caótica desde que se iniciou a gestão do prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos), com a ausência de políticas para moradia ao mesmo tempo em que a maioria das ocupações que hoje abrigam famílias sem-teto estão ameaçadas de despejo, mas sem alternativa de moradia nem de emprego e renda. “Não se faz nada efetivamente que tire as famílias dessas condições. Não tem investimentos”, reclama a integrante das Brigadas Populares.
Centro de Vitória reflete contradições da política urbana
“É mais um caso onde a especulação imobiliária vence frente aos direitos básicos. A ineficácia do poder público em garantir a função social das propriedades, notificar e dar finalidades a imóveis em estado de abandono – que inclusive colocam em risco a vida das pessoas que residem no entorno destes imóveis – fazem com que mais uma vez o povo tenha seus direitos básicos negados”, afirma a nota da organização popular.
A pesquisa “Imóveis em Abandono: Mapa da Ociosidade no Centro de Vitoria, ES”, realizada pelo centro universitário Faesa em parceria com a Prefeitura de Vitória, identificou 217 imóveis vazios ou subutilizados no Centro Histórico, um crescimento de 70% em relação a um mapeamento similar feito em 2019, antes do início da pandemia, que segundo a arquiteta Viviane Pimentel, uma das professoras responsáveis pela pesquisa, contribuiu para agravar significativamente os índices de pobreza e déficit habitacional.
Desde 2017, o Centro Histórico tem sido palco mais destacado das lutas pelo acesso e direito à moradia no Estado, com uma série de ocupações, iniciadas com o edifício do IAPI, na Praça Costa Pereira, que chegou a ser destinado para o programa Minha Casa, Minha Vida, mas o projeto acabou abandonado devido a cortes do governo federal nos recursos destinados às faixas com renda mais baixa.
O edifício Santa Cecília, no Parque Moscoso, foi outra ocupação que depois da denúncia do movimento social foi destinado à reforma para moradia em 2019, esta sim, quase pronta para a entrega. Porém, as famílias ocupantes não serão contempladas e, depois do fim do aluguel social provisório que receberam e sem melhorias em sua renda, voltaram a ocupar uma escola localizada no bairro Romão, batizando-a de Ocupação Chico Prego, mesmo nome dado quando estavam no IAPI.
Nova lei e mobilizações pelo Despejo Zero
Nessa terça-feira (22), de forma unânime, os deputados estaduais capixabas aprovaram na Assembleia Legislativa o Projeto de Lei 125/2021, de autoria da deputada Iriny Lopes (PT), que suspende todas ordens de despejo no Estado até o fim deste ano.
A iniciativa “pode ser a oportunidade para que famílias inteiras se reestruturem e consigam experimentar essa parte tão importante de sua cidadania”, disse em nota em suas redes sociais, referindo-se ao direito à moradia, defendido diante do momento de extrema fragilidade econômica e social em decorrência da pandemia e da falta de políticas públicas vindas da esfera federal. Porém, a nova lei ainda depende de sanção do governador Renato Casagrande (PSB), o que pode não ocorrer até o prazo final de reintegração de posse da Ocupação Moa do Katendê.
Nesta quinta-feira (24), organizações sociais do campo e da cidade, como o Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLN), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e movimento quilombola, prometem lotar a Assembleia Legislativa a partir das 9h para a sessão especial convocada por Iriny como parte do ato nacional Moradia pela Vida, organizado pela Campanha Despejo Zero, que busca evitar o despejo de 130 mil famílias pelo Brasil, e enviou uma pedido para que o Supremo Tribunal Federal (STF) estenda o prazo da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPC) nº 828, que proíbe despejos por conta da pandemia de Covid-19.