A Organização das Nações Unidas (ONU) destacou a atuação do militante capixaba de direitos humanos, Rafael Nascimento Almeida, conhecido como Feijão, no site institucional da entidade. Ele é personagem principal em uma reportagem em alusão ao Dia Internacional da Juventude, celebrado em 12 de agosto.
A reportagem faz um paralelo entre a vida do militante e da vizinha dele, Luiza Cerqueira, de 59 anos, no bairro de Jacaraípe, na Serra. Os 12 filhos de Luiza cresceram na mesma rua que Feijão e seus irmãos, na região conhecida como Costa Dourada, mas os destinos de todos eles foram diferentes.
Enquanto Luiza perdeu cinco de seus 12 filhos, sendo dois ainda crianças, um de overdose aos 31 anos e dois assassinados, aos 22 e 17 anos, além de ter tido dois netos também assassinados antes dos 20 anos, Rafael e os irmãos se engajaram em diversas frentes políticas e comunitárias. O militante credita a este engajamento os destinos diferentes dos amigos de rua.
Feijão disse à reportagem da ONU que ele e os irmãos sempre estiveram próximos à comunidade e moram na periferia. Por isso, sempre tentam mostrar o caminho aos colegas, no entanto, sem criminalizar o que eles vivem. “Mas é totalmente diferente o nosso processo de vida. A militância e um monte de outras coisas favoreceram para não nos envolvermos com as drogas”, disse ele.
Luiza salientou à reportagem que uma das prioridades dos governos deveria ser projetos sociais voltados para jovens. “Acho que ao invés de fazer muitas pracinhas, eles deviam investir em projetos para as crianças, jovens e adolescentes. Para que eles possam fazer um tipo de trabalho e quem sabe até conseguir ganhar dinheiro por meio do projeto”, afirmou ela.
Prêmio
Rafael Nascimento foi contemplado com o Prêmio Estadual de Direitos Humanos em dezembro de 2013, além do destinado pelo Centro de Defesa de Direitos Humanos (CDDH) da Serra.
Feijão, que foi preso nos protestos de julho de 2013, se recusou a receber o prêmio das mãos do governador Renato Casagrande, presente à cerimônia. Ele pediu que o prêmio fosse entregue pelo presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos (CEDH), Gilmar Ferreira. A justificativa para explicar aos presentes o motivo da condição foi feita na forma de jogral, junto com outros militantes de direitos humanos, como os manifestantes costumavam fazer nas ruas.
No discurso, os ativistas ressaltaram que a vida humana vale mais que todos os patrimônios privados, “que esse governo insiste em proteger”, em alusão aos conflitos registrados na Terceira Ponte contra a Rodosol.
Na ocasião, eles acrescentaram que a homenagem simbolizava não apenas as manifestações daquele ano, mas todas as lutas, reivindicações e crenças que os movimentos guardam para a sociedade. “É inadmissível recebermos essa homenagem das mãos sujas deste governo que nos reprimiu com balas de borracha, que nos prendeu, governo que mata nossos jovens, principalmente negros nas periferias”, disseram os militantes.
Protestos
Feijão foi preso nos protestos do dia 19 de julho de 2013, em Vitória. Em 23 de agosto, durante na III Conferência Estadual de Promoção de Igualdade Racial, no Sesc Aracruz, norte do Estado, foi homenageado pelo coordenador do Fórum Estadual da Juventide Negra (Fejunes), Luiz Inácio Silva da Rocha, o Lula, e contou a experiência às pessoas que participavam da reunião.
Na ocasião, ele compartilhou com os participantes a experiência de ser preso em meios aos protestos de rua. “Percebi que mais de 90% das pessoas que estavam presas eram gente do meu povo [se referindo aos negros do sistema prisional]. Essas pessoas, que também são criminalizadas, estão ali, na sua maioria, por que o Estado não promove políticas públicas para esse segmento da população: os pobres e negros”, protestou.
Feijão ainda disse ao governador Renato Casagrande, que compunha a mesa do evento, que o governo não conseguiu entender os protestos. “A manifestação era um pedido para construir um Estado mais democrático e justo. O senhor não conseguiu perceber isso. O senhor simplesmente mandou a BME [Batalão de Missões Especiais] pra cima da gente”, disse a Casagrande, exibindo o alvará de prisão que era obrigado a carregar no bolso.
Antes de encerrar sua manifestação, o militante fez um pedido ao governador: “Gostaria que quando o senhor colocasse a cabeça no travesseiro, pense no que quer para o nosso Estado”.
As críticas do militante do Centro de Defesa de Direitos Humanos da Serra duraram mais dez minutos. Feijão foi ovacionado pelos presentes.