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Representante da ONU virá ao Estado discutir ações para refugiados

Brunela Vincenzi, da Ufes, aponta para a falta de uma política concreta de atendimento a esses grupos no Estado

O representante do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) no Brasil, José Egas, chegará ao Espírito Santo na próxima segunda-feira (4). Com agenda marcada na Assembleia Legislativa, na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e com o governador Renato Casagrande (PSB), a expectativa é de que a visita provoque algum avanço nas políticas públicas para refugiados no Estado, que ainda não possuem uma estratégia concreta e eficaz para acolhimento dos grupos que chegam às terras capixabas.

José Egas é o mais alto representante da ONU no Brasil. A primeira agenda é uma participação na Comissão de Defesa da Cidadania e dos Direitos Humanos da Assembleia. O encontro discutirá o Projeto de Lei 361/2021, que institui a Política Estadual para a População Migrante no Espírito Santo. A matéria já foi aprovada no legislativo e aguarda sanção do governo do Estado.

A professora do Departamento de Direito da Ufes e titular da Cátedra Sérgio Vieira de Mello (CSVM) na Universidade, Brunela Vincenzi, acompanhará as agendas, e espera que a visita fomente não só a aprovação do projeto de lei, como a construção de ações públicas concretas para os grupos que chegam ao Estado. A Cátedra oferece suporte a refugiados na Ufes.

“A gente tem recebido bastante refugiados venezuelanos e eles chegam em uma situação de muita dificuldade financeira, de abrigamento, e não há nenhum plano de ação, nenhuma secretaria específica para lidar com eles. Nós percebemos que toda vez que chega um grupo novo, tanto os municípios quanto o governo do Estado ficam ‘batendo cabeça’ sem saber o que fazer”, declara.

Ela conta que o último grupo que passou pelo Espírito Santo foi de refugiados indígenas da Venezuela, que foram embora na última sexta-feira (24). Pertencentes ao povo Warao, o grupo é formado por 59 pessoas, sendo quase 30 crianças. Os refugiados entraram no Espírito Santo por São Mateus, região norte, tendo passado também por Guarapari, Serra e Vila Velha, última parada antes de irem para Juiz de Fora (MG). O grupo estava abrigado no salão de uma igreja no bairro Jaburuna.

Brunela afirma que, durante os aproximados cinco meses que os refugiados se deslocaram pelo Espírito Santo, órgãos voltados para a proteção dos direitos humanos chegaram a cobrar assistência do Governo do Estado, por meio da Secretaria de Assistência Social, mas foram informados que nada poderia ser feito, por ausência de uma legislação específica para tratar do tema. “Por último também tentamos contato com a Prefeitura de Vila Velha, mas disseram que não podiam fazer nada, apenas autorizar que eles utilizassem o SUS [Sistema Único de Saúde]”, relata.

Brunela ressalta que o deslocamento das famílias para Juiz de Fora foi feito com passagens pagas pela Prefeitura de Vila Velha. As 59 pessoas, pertencentes ao mesmo núcleo familiar, entraram no Brasil pelo estado de Roraima, foram para a Paraíba e seguiram para o sul da Bahia, onde tentaram se estabelecer em um abrigo. “São tios, esposas, irmãos. E na cultura deles, tem que morar todo mundo junto. Então teria que ter um abrigo só para esse grupo. O que ocorre é que às vezes querem colocar eles separados, o que acaba complicando o processo”, enfatiza a professora, ressaltando que, após a viagem, o grupo já manifestou interesse em voltar ao Estado.

Brunela explica que o Espírito Santo também conta com refugiados da Angola, Guiné-Bissau, Nigéria e Líbia, mas a maior quantidade é de Venezuelanos. Entre 2014 e 2015, cerca de 200 famílias da Síria passaram pelo Estado, mas a última que ainda permanecia em território capixaba foi embora no ano passado. “É um fluxo enorme. Temos registrado, só entre as que passam pelo projeto, cerca de 300 pessoas. A gente estima que, em todo o Espírito Santo, já chegue a quase mil pessoas”, informa.

Apesar do grande contingente, ao chegar ao Estado, os grupos se deparam como uma estrutura que não está pronta para os receber, aponta a professora. “As autoridades acabam se valendo disso porque não tem uma lei específica (…) Os estados que estão mais avançados nessa questão contam com uma subsecretaria específica para migrantes, então poderia ser criada uma subsecretaria do Estado”, sugere.

Durante a visita ao Espírito Santo, José Egas também se reunirá com o reitor da Ufes, Paulo Vargas, no campus de Goiabeiras. O encontro abordará os trabalhos desenvolvidos pela Cátedra Sérgio Vieira de Mello, projeto da Universidade que, por meio de uma parceria com a Acnur, dá suporte aos refugiados no campo da educação.

Vila Velha

A prefeitura informou a Século Diário que, após o contato do pastor da igreja em que os refugiados indígenas estavam abrigados, enviou itens de higiene pessoal, Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), limpeza, colchões, mantas, alimentos e botijas de gás. Uma técnica de referência da Gerência de Proteção Social Especial (PSE) também foi enviada ao local, de acordo com o município.

“Em 16/9/2021, seis famílias manifestaram o desejo de mudança para a cidade de Juiz de Fora – MG, aonde já estão alojadas famílias do mesmo núcleo familiar, respeitando e indo de encontro aos hábitos de agrupamento familiar, tendo seu pedido atendido em 17/9/2021”, informou o município por nota sobre as passagens.

Projeto de lei

De autoria do deputado estadual Emílio Mameri (PSDB), o projeto de lei aprovado na Assembleia tem como objetivo garantir ao migrante o acesso a direitos fundamentais, sociais e aos serviços públicos; promover o respeito à diversidade e à interculturalidade; impedir violações de direitos; e fomentar a participação social, desenvolvendo ações coordenadas com a sociedade civil.

A matéria também fomenta a formação de agentes públicos que possam acolher os grupos que chegam ao Espírito Santo, a facilitação para emissão de novos documentos, bem como a capacitação das redes estadual e municipais de ensino para receber crianças e adolescentes migrantes.

“Considera-se população migrante todas as pessoas que se transferem do seu lugar de residência habitual em outro país para o Brasil, compreendendo migrantes laborais, estudantes, pessoas em situação de refúgio, apátridas, bem como suas famílias, independentemente de sua situação imigratória e documental”, diz o texto.

Outro destaque é a garantia de acesso a programas habitacionais, serviços de Saúde e a prevenção de violações como o tráfico de pessoas, o contrabando de migrante, o trabalho escravo, a xenofobia e a exploração sexual.

“O Poder Público Estadual deverá oferecer acesso a canal de denúncias para atendimento dos migrantes em casos de discriminação e outras violações de direitos fundamentais ocorridas em serviços e equipamentos públicos”, estabelece o projeto.

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