quarta-feira, novembro 27, 2024
25.5 C
Vitória
quarta-feira, novembro 27, 2024
quarta-feira, novembro 27, 2024

Leia Também:

‘Sangrias, um livro sobre aborto’ tem campanha de financiamento colaborativo

Um dos temas mais polêmicos no mundo ocidental de hoje. Dezenas de autores, de diferentes identidades de gênero. Uma editoria capixaba feita de mulheres e com foco na diversidade nas suas mais variadas formas. Duas acadêmicas latino-americanas pesquisadoras dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres.

Junte tudo isso e você terá o projeto “Sangrias, um livro sobre aborto”, com previsão de multi-lançamentos no Sudeste do Brasil e outras cidades da América do Sul, nos primeiros meses de 2019.

Para viabilizar a realização da obra, uma campanha de financiamento colaborativo está recolhendo doações para a meta um do projeto até o próximo dia cinco de fevereiro.

Mas o livro, ressalta Beatriz Barros de Souza, uma das organizadoras, “não termina com a escrita e a publicação. Ele começa com a publicação e continua na forma de encontros feitos com as redes de cada uma das autoras”, diz, usando o feminino para designar homens, mulheres e outras identidades de gênero, invertendo o patriarcado que predomina na língua portuguesa.

“A ideia é que as autoras sejam multiplicadoras de debates no Espírito Santo, no Brasil e no exterior. Que levem o livro como um disparador de debate”, explica.

Mesmo tendo surgido de dentro da academia – o Grupo de Estudos sobre Aborto da Universidade Federal do Espírito Santo (GEA/Ufes) e a dissertação de Mestrado de Antonella Barone – o livro irá reunir “novas formas de pensar e sentir a prática abortiva, não só a partir de trabalhos acadêmicos, mas incluindo também poesias, contos, pinturas e desenhos“, conta Beatriz.

Polfônico

A diversidade vai além da linguagem e envolve o rol de autoras. Produzido não só por mulheres cis com útero, mas também por homens cis e trans, mulheres trans, de diferenças raças, a ideia é “passar a visão de que essa questão atinge a sociedade como um todo e não só as mulheres”.

Na página de divulgação do projeto, um vídeo da vereadora Marielle Franco (PSOL/RJ), assassinada em 14 de março deste ano, traz alguns dados oficiais estarrecedores sobre o aborto no Brasil. “Se a cada um minuto uma mulher faz aborto clandestino no Brasil, segundo a Organização Mundial de Saúde, são aproximadamente 500 mil abortos por ano”, informa.

Publicado há um mês de sua morte, o vídeo cita ainda números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dando conta de que “uma a cada cinco mulheres com mais de 40 anos já fez pelo menos um aborto na vida”, o que totaliza cerca de  7,5 milhões de brasileiras que já fizeram pelo menos um aborto. “Geralmente são casadas, não são jovens, possuem diversas religiões. Não estão em busca da morte, estão em busca de alternativas para uma gravidez indesejada, estão em busca de alternativas para ter acesso a direitos”, assevera Marielle.

Chega de tabu

Doutorando em Psicologia na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Beatriz é capixaba de Iúna, na região do Caparaó, e fez Mestrado em Direitos Humanos na Universidade de São Paulo (USO), sob orientação da ex-senadora Eva Blay, autora de um projeto de lei pela legalização do aborto na década de 1990. Apoiado pela então governadora do Rio de Janeiro, Benedita da Silva (PT), o PL foi muito polêmico, por ter suscitado os ataques de colegas do próprio partido da senadora, o PSDB.

Passados quase trinta anos, o aborto continua um dos temas mais espinhosos no país e no continente latino-americano como um todo. A ocupação das forças políticas de extrema direita no Palácio do Planalto e em muitos estados da federação em 2019 não compõe um cenário favorável ao avanço do debate e da consolidação de direitos sobre a questão, mas o trabalho de esclarecimento vai continuar.

Apesar da vitória na Argentina em meados de junho, Beatriz entende que ainda não é possível vislumbrar a legalização do aborto no Brasil a curto prazo. Nesse primeiro momento, afirma, o que se quer ”é que deixe de ser um tabu”. “Queremos que o debate se amplie, que saia da academia, e chegue às artes, aos mais variados setores da sociedade”, diz.

Mais Lidas