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Unidade Negra Capixaba organiza protesto contra agressão a homem no Carone

Vídeo que circula nas redes sociais mostra a vítima sendo agredida por seguranças no Carone de Laranjeiras

Charge: Mindu

A Unidade Negra Capixaba irá organizar um ato para denunciar a violência dos seguranças do Carone de Laranjeiras, na Serra, contra um homem negro dentro do estabelecimento. Um vídeo que circula nas redes sociais mostra a agressão física, primeiro em uma sala, depois na frente dos clientes. A vítima é acusada de roubo pelos agressores e a todo momento nega que tenha cometido o crime.

A agressão foi filmada por um cliente, que, ao ouvir os gritos da vítima quando ela estava dentro da sala, falou “tão batendo no cara aqui dentro, ó! Tão batendo no cara aqui dentro, ó! Carone fazendo isso aí, ó! Chama a polícia, aê! Tá errado!”. Em seguida, o segurança que estava do lado de fora falou que o rapaz estava roubando, tendo recebido a seguinte resposta do cliente que filmava: “Não tem problema não, não é papel seu fazer isso, é papel da polícia”.

Posteriormente, a vítima conseguiu sair da sala dando um chute na porta, enquanto um segurança puxa seus cabelos, e denuncia que levou socos e estava ensanguentado. A confusão prossegue com a discussão entre os seguranças e o rapaz, que, inclusive, é chamado de “filho da puta”. Durante todo o vídeo, a pessoa que filma aponta que aquilo está errado e pede para os seguranças soltarem a vítima.

A realização do protesto será discutida por meio de plenária virtual nessa segunda-feira (20), às 19h, na qual também serão debatidas as medidas judiciais cabíveis diante do ocorrido, entre elas, as possibilidades de registro de Boletim de Ocorrência e de acionar o Ministério Público Estadual (MPES).

O representante da Unidade Negra Capixaba, Gilberto Campos, o Gilbertinho, destaca que a agressão que aconteceu no Carone “faz parte de uma escalada de violência racial nesse tipo de estabelecimento”.

Ele recorda do assassinato de João Alberto Silveira Freitas, morto a pancadas por seguranças do Carrefour em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, em novembro de 2020, o que motivou manifestações do Movimento Negro em todo o país, inclusive no Espírito Santo, onde foi feito um protesto no Carrefour do Shopping Vila Velha.

Foto: Marco Antônio

O Carrefour também protagonizou outros casos de violência racial, como o de Osasco, em São Paulo, quando seguranças agrediram o vigia e técnico em eletrônica Januário Alves de Santana, no estacionamento da unidade. A vítima foi confundida com um ladrão e acusada de roubar o próprio carro. Em 2004, três atores que participaram do filme “Cidade de Deus”, em São Paulo, prestaram queixa contra o estabelecimento e um policial militar por constrangimento ilegal, denunciação caluniosa e injúria racial. Na ocasião, eles disseram que se dirigiram ao caixa eletrônico para sacar dinheiro, sendo abordados por dois seguranças do supermercado.

Gilbertinho salienta que, normalmente, o estabelecimento não assume a responsabilidade pelo ato racista, mas que a Unidade Negra Capixaba vai lutar para que seja reconhecida a responsabilidade da rede de supermercados. Ele explica que é comum ela ser atribuída aos funcionários que cometeram a agressão, como se eles não fizessem parte de um ambiente organizacional. De acordo com Gilbertinho, quando os agressores são terceirizados, por exemplo, o estabelecimento alega que eles trazem essa prática violenta dos cursos de formação.

Durante a plenária, também será discutida a necessidade de criação de um observatório para fiscalização e acompanhamento dos casos de violência racial, que, conforme aponta Gilbertinho, não se resumem a situações como a ocorrida no Carone, contemplando também questões como a violência policial nas comunidades periféricas. Ele salienta que “a população negra é consumidora, e não ladra”, e que quando há roubo, a pessoa, seja ela negra ou branca, não pode ser agredida, sendo o procedimento correto chamar a polícia.
“Os seguranças não são policiais nem juízes, mas ali eles julgaram, condenaram e aplicaram o castigo”, denuncia, salientando que os agressores “estão crentes que a impunidade vai prevalecer”, pois no início do vídeo, quando o cliente que filma se dirige a um dos seguranças dizendo “vai dar ruim para você”, ele responde “pra mim não vai dar em nada”.
Repúdio
Entidades e mandatos se pronunciaram sobre o ocorrido no Carone. O Conselho Municipal de Direitos Humanos da Serra (CDDH) e o Conselho Municipal do Negro (Conegro) classificaram a situação como “violação de direitos humanos, abordagem violenta, preconceituosa e desrespeito à dignidade do cidadão, que foi exposto a situação agressiva, vexatória e humilhante”.
As entidades defendem que “um estabelecimento aberto ao público não pode discriminar as pessoas que nele circulam, devendo tratar a todos com dignidade e respeito”, e solicitam que “a empresa assuma sua responsabilidade e execute ações de prevenção, enfrentamento, reparação dos direitos violados e adotem medidas que impeçam a recorrência de situações como esta”.
Além disso, recomendam “o investimento em qualificação e formação continuada para seus funcionários e colaboradores, a fim de que os mesmos atuem respeitando os direitos humanos de todas as pessoas”. No que diz respeito aos órgãos estatais, exigem que “atuem com rigor e legalidade para apurar, trazer a verdade e responsabilizar os culpados”.
O Conegro e o CDDH reforçam que “é necessário que os governantes municipais e Estadual orientem as forças de segurança, principalmente a Guarda Civil Municipal e a Polícia Militar do Estado do Espírito Santo, para que atuem de forma exemplar, inspirando as forças de segurança privada a atuarem para a garantia de direitos e o respeito aos indivíduos”.
Defendem ainda que “é necessário que a mídia não reforce ou valorize afirmativamente comportamentos agressivos e violentos e que toda a sociedade atue para a promoção e a efetivação de uma cultura de paz e de respeito”. As entidades também se comprometem a “colaborar com toda a sociedade serrana nesse sentido”, além de se colocar à disposição “para apoio, orientação e proteção do cidadão que foi vitimado nessa situação e de sua família”.
A deputada estadual Iriny Lopes (PT) afirmou em suas redes sociais estar “estarrecida” com a violência praticada dentro do Carone e destacou que “a abordagem correta mediante furto seria chamar a polícia. Não há nada que justifique essa atrocidade”, além de ter informado que seu mandato já cobrou apuração do Estado sobre o caso por meio da Secretaria Estadual de Direitos Humanos (SEDH).
A vereadora de Vitória Camila Valadão (Psol) também se pronunciou em suas redes, dizendo que “nossos corpos continuam na mira da política de criminalização e extermínio. Esperamos respostas dos órgãos competentes. Nada justifica tamanha violência e atrocidade!”. A também vereadora de Vitória, Karla Coser (PT), defende que o vídeo “mostra como a estrutura da violência racista precisa urgentemente ser combatida. Nada justifica a agressão, ainda que o homem tivesse furtado”, destacando ainda que não parece que o furto tenha ocorrido, já que a vítima foi liberada pelos seguranças.
A vereadora defende ainda que “não se faz justiça com as próprias mãos” e que “muito menos devemos aceitar injustiças”. Também se mostra “chocada” com “a sensação de ‘impunidade’ dos homens que estavam sendo filmados”. Ela termina com o seguinte questionamento: “normalizamos a violência cotidiana?”.

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