Professor Guilherme Henrique Pereira não vê perspectiva de crescimento nem de investimentos neste ano
A crise econômica, acima de todos os outros temas, será o mote principal da campanha eleitoral deste ano, trazendo em suas entranhas a fome e a miséria que atinge milhões de brasileiros. Nesse cenário, o professor Guilherme Henrique Pereira, doutor em economia, aponta uma cena que vai se tornando comum no país, com “pessoas desempregadas e pobres defendendo o atual modelo de política econômica”.
Em entrevista a Século Diário, o professor afirma que, do seu ponto de vista, não há perspectiva de crescimento, nem de novos investimentos. Com esse posicionamento, contradiz a euforia de setores no Espírito Santo, que comemoram o crescimento da economia local em 2021. O professor ressalta que o Espírito Santo é um Estado “muito particular, muito específico”.
Dados do Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN), divulgados em dezembro de 2021, apontam para um cenário positivo naquele ano, a partir de um crescimento superior ao desempenho em nível nacional em todas as bases de comparação. O crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre de 2021, puxado pelo comércio varejista, registrou expansão de +7,9%, resultado superior ao desempenho nacional, que chegou a +5,7%.
Como exemplo da particularidade do Estado, Guilherme Pereira cita o conjunto formado pela ArcelorMittal, a Suzano (ex-Fibria e ex-Aracruz Celulose), a Vale e, mais recentemente, os dados sobre o petróleo, “mais marcante ainda”, que, embora tenha um peso muito grande no Produto Interno Bruto (PIB) capixaba, desenvolve atividades que pouco tem a ver com a dinâmica da economia local.
Em nível nacional, especialistas passaram a projetar crescimento econômico de menos de 1% em 2022, ao mesmo tempo em que deram sequência ao aumento nas expectativas para a inflação, de acordo com a pesquisa Focus divulgada pelo Banco Central. O levantamento mostrou que a expectativa para a expansão do PIB no Brasil, neste ano, caiu e chegou a 0,93%.
Para Guilherme Pereira, alguns setores, como as usinas de pelotização da Vale, a Samarco e a Arcelor têm uma “influência na economia capixaba por via da folha de salários, mas no restante a interação é muito baixa, porque a matéria-prima vem de fora, o produto final vai por exterior e as exportações deixam de pagar imposto”. Apesar desse quadro, esses setores “têm um peso relativo muito grande no PIB capixaba”.
Veja outros trechos da entrevista a Século Diário:
Qual a perspectiva da economia para este ano, a partir da retração do PIB projetada por especialistas?
Lamentavelmente não vejo possibilidade de estabilização, menos ainda de retomada do crescimento. O Estado tem funcionalidade determinante na coordenação e no estímulo aos investimentos, sem os quais não há crescimento. Em 2022 completaremos mais de quatro anos sem governo organizado e ativo na política econômica.
Do seu ponto de vista, quais pontos deveriam ser priorizados pelo poder publico, a fim de equilibrar a situação, considerando uma inflação de 10% em 2021 com projeção de mais 5% neste ano?
A disparada de preços preocupa e a atuação do governo é desastrosa neste campo. Veja que a única medida tomada, aumento da taxa básica de juros, é absolutamente equivocada. Já vivemos a experiência de manter juros em patamares elevados e os resultados ruins também são conhecidos. Como os juros estão entre os preços importantes da economia, se se mantiver em patamares elevados, no longo prazo é óbvio que ele sinalizará para os demais setores que deverão corrigir seus preços, sob pena de perderem participação na distribuição das rendas geradas, ou simplesmente na fatia que detêm no PIB. A resultante é aumento da taxa de inflação.
Há também outras consequências: estimula o ingresso de dinheiro especulativo – maior demanda por real – valorizando a moeda nacional; taxa de câmbio valorizada estimula importações, portanto, rebate incertezas para o investimento no mercado interno; Pode também ocorrer um descrédito tão grande do governo que nem dinheiro especulativo vem, ao contrário, os que estão aqui entram em rota de fuga (a queda nos preços das ações Bovespa, parece sinalizar isso) e, neste caso, desvaloriza o real, impacta para cima os preços das importações que, por sua vez, elevam diretamente a taxa interna de inflação (vide o inaceitável preço dos combustíveis).
Sem ou com fluxo baixo de investimentos, não haverá retomada do crescimento, portanto, também inviabiliza o aumento das receitas dos impostos que fariam face à expansão das despesas financeiras do governo que se elevaram com as taxas de juros mais altas. Um transparente ciclo vicioso de movimentos negativos que atuarão na manutenção do desemprego. Mas, isso não importa para o atual governo, afinal a política econômica está inteiramente de quatro para os rentistas que se nutrem da dívida pública, dão vida ao exuberante sistema financeiro e de quebra turbina os lucros dos bancos brasileiros.
Você acha que a situação irá influenciar diretamente na campanha eleitoral, sendo um dos principais argumentos para tentar convencer o eleitor?
O eleitor, no momento de registrar seu voto, já terá apanhado por mais de quatro anos. Seria até desnecessária uma campanha por parte dos candidatos que desejam combater de forma radical o sofrimento do povo, aqui me refiro especialmente às camadas menos ricas e pobres. Mas na política nem sempre o movimento segue os ditames da lógica.
Na verdade, é comum ver pessoas desempregadas e pobres defendendo o atual modelo de política econômica que de fato petrifica o seu sofrimento. Falta de conhecimento, crenças em fantasmas, falso pensamento cristão, confusão com debates de comportamento, etc. parecem explicar o voto chamado de “tiro no próprio pé”.