Economistas sugerem mais diversidade e complexidade. Indústria extrativa corresponde à metade do valor exportado
Uma economia pouco diversificada e pouco complexa, baseada nas exportações da indústria extrativa e que, por isso, mantém a sociedade à margem da prosperidade gerada pelas poucas empresas envolvidas, além de estar muito vulnerável às oscilações e crises externas, sem conseguir garantir um crescimento sustentado a longo prazo.
A descrição acima da economia capixaba consta na série de artigos “A Armadilha da Zona de Conforto”, publicada pelo Observatório do Desenvolvimento Capixaba (ODC), formado por um grupo de economistas, professores e pesquisadores da Universidade e do Instituto Federal do Espírito Santo (Ufes e Ifes).
Assinados por Ednilson Felipe e Érika Leal, os dois primeiros textos trataram do comportamento do Produto Interno Bruto (PIB) na última década, em relação ao PIB nacional, e do perfil das exportações, comparado com outros estados com trajetórias semelhantes.
O cardápio de exportações do Estado tem o minério de ferro (31,3%), o petróleo cru (9,8%) e as pedras de cantaria ou construção (7,3%) somando quase metade do valor total. Cerca de um terço vem da soma de produtos semielaborados do ferro e celulose; e a agricultura soma quase 10%, com soja e café. Os três grupos totalizam 91% do valor exportado pelo Estado atualmente.
Ednilson explica que, comparando esses produtos simples com um celular ou um avião, por exemplo, fica clara a diferença de dinamismo da economia. “A concentração das exportações em produtos como petróleo, minério de ferro ou soja leva a uma dinâmica de baixa complexidade, menor encadeamento produtivo e risco de perda de complexidade econômica futura”, alertam os autores.
A rede necessária para produzir cada um deles tem um desenho bem diferente, como pode ser visto nas figuras abaixo, com base em um modelo teórico que mostra os “espaços de produtos e complexidade das economias”, com dados de 2017 da Secretaria de Comércio Exterior (Secex).
Se há alguns anos, o Espírito Santo se assemelhava a Santa Catarina, no Sul do País, em relação às exportações, com o tempo os dois estados se distanciaram e hoje o Pará, no Norte, está mais semelhante.
O estado do Sul desenvolveu uma pauta de exportações que dialoga com muito mais setores da sociedade catarinense, estabelecendo relações comerciais com fornecedores de matéria-prima e produtores de tecnologia e conhecimento mais robustas, no cerne da sociedade.
No Espírito Santo e Pará, ao contrário, as poucas relações estabelecidas para a produção e exportação dos produtos de extração e a baixa transformação industrial ficam na periferia da sociedade, limitando o acesso da população à prosperidade gerado nessas negociações.
“A relação da sociedade com essas estruturas produtivas é muito baixa. Essas empresas não precisam comprar tecnologia aqui, não precisam de serviços complexos aqui. Quanto mais eu caminho para o centro dessa rede, mais relações eu vou precisar criar, produtivas, intelectuais e tecnológicas”, ressalta.
Interiorizar as relações comerciais é fundamental para alcançar o verdadeiro desenvolvimento, e isso se dá por meio de políticas públicas voltadas à diversificação e complexificação da economia. “A prosperidade é o elemento fundamental, a prosperidade para toda a sociedade. O desenvolvimento acontece quando a prosperidade chega às camadas mais excluídas”, afirma Ednilson.
Essa mudança também torna a economia mais estável e resistente às flutuações externas. “Complexidade é um dos elementos mais pujantes da capacidade de crescer. Quanto mais centrado em produtos menos complexos, menos eu tenho controle da própria dinâmica econômica. Quanto a economia brasileira vai mal, por exemplo, a nossa capacidade de descolar dela e fazer o nosso processo de desenvolvimento acima disso, com outra trajetória de ganho, tem menos possibilidade. Como descolar da economia ruim brasileira? Aumentando a complexidade dos produtos”, argumenta o pesquisador.
Uma análise dos números dos estados exportadores no período entre 2001 e 2021, em valores exportações em dólares, mostra, de fato, a oscilação do Espírito Santo, que acabou perdendo, na última década, quatro posições no ranking nacional. Em 2001, o Estado estava na sétima posição, atrás de São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e Rio de Janeiro. Manteve-se nela até 2005, quando começou a oscilar para baixo.
Em 2017 e 2019, chegou à 11ª posição, a mais baixa da série histórica. E, em 2021, subiu um degrau, ficando em 10º lugar, três posições abaixo de 2001.
O caminho que o Espírito Santo deve trilhar com mais ênfase, ressaltam os autores, é o do investimento em arranjos produtivos que envolvam mais inteligência e inovação, para o desenvolvimento de produtos mais complexos e que formem um cardápio mais variado.
Bons exemplos nesse sentido são programas como o Sinapses, Centelha e Seeds, que têm apoiado arranjos produtivos mais complexos, que estabelecem pontos de conexão com setores diversos da sociedade capixaba, ao invés de ficarem limitados às grandes indústrias e a empresas envolvidas na extração, baixa transformação e exportação de poucos produtos.
“O Governo do Estado colocou recursos em empresas que trouxeram processos de inovação importante. Agora precisa manter esses investimentos e ampliá-los, para que as novas redes criem raízes na estrutura produtiva capixaba. Precisa de tempo e continuidade dos investimentos para isso”, recomenda Ednilson.