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Após 20 anos, Lei 10.639/03 ainda tem dificuldades para efetivação nas escolas

Lei inclui história e cultura afro-brasileira no currículo e o Dia Nacional da Consciência Negra no calendário

A Lei 10.639/03 completou 20 anos no dia nove de janeiro, mas passadas duas décadas, sua implementação ainda encontra dificuldades no Espírito Santo e no restante do país. Essa iniciativa alterou a Lei no 9.394/96, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade de conteúdos de história e cultura afro-brasileira. Também inclui no calendário escolar o 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra.

A professora da rede estadual de ensino, Darlete Gomes Nascimento, que busca trabalhar as questões étnico raciais nos conteúdos ministrados por ela, afirma que a lei é um marco legal para refletir sobre o fato de muitos profissionais acharem que trabalhar essas temáticas deve ser algo do campo do querer. “A obrigatoriedade traz marca pungente para que escolas públicas e privadas tenham que trabalhar o tema”, diz.

Darlete destaca que, historicamente, “há apagamento da história, da cultura e da importância do negro na construção da história do Brasil em todos sentidos”. Para a professora, a Lei “não é aplicada plenamente, estamos distantes de uma implementação a contento”. Um dos empecilhos, afirma, é o preconceito contra as religiões de matriz africana, pois há profissionais que não querem trabalhar essa temática, como se fosse possível “tirar a religiosidade do tema da cultura”.
Esse problema também é apontado pela professora e pesquisadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Universidade Federal do Espírito Santo (Neab), Noelia Miranda, que salienta que o Espírito Santo é um estado marcado por muito racismo. “Falar de negro não é falar de feijoada, de capoeira. Queremos falar sobre nossa religiosidade, que é desrespeitada, nossa ancestralidade”, diz.
Segundo Noelia, a resistência à aplicação da lei é por parte de todos segmentos da comunidade escolar. A professora relata alguns casos ocorridos no Espírito Santo. Um deles é do final de 2022, quando uma família procurou a escola e se queixou do fato de a filha ter participado de uma atividade de um autor de um livro infantil pelo fato de ele ser filho de uma mãe de santo. Em outra situação, uma família se queixou porque um livro tinha palavras em yorubá.
A escola precisa estar preparada para esses casos, ressalta, fazendo um trabalho de convencimento com a família, e esse preparo, afirma, vem com a formação dos profissionais, o que precisa ser fortalecido por meio de capacitações realizadas pelas gestões públicas e pela inclusão das temáticas relacionadas à Lei 10.639/03 nos cursos de licenciatura entre as disciplinas obrigatórias, não se restringindo às optativas.
Em âmbito nacional, o Movimento Negro reivindica a judicialização de gestores que se recusam a aplicar a Lei 10.639/03, como governadores, prefeitos e secretários e reivindica a criação de comissões de fiscalização. A professora também destaca a necessidade de acabar com algumas crenças, como a de que a miscigenação brasileira se deu sem violência. “Parece que o branco deu certo com o negro e virou uma mistura maravilhosa. Muitos pensam assim e dizem, com base nisso, que não existe racismo, aí acham que a lei é desnecessária”, diz.
Noelia aponta que, em todo o Espírito Santo, existem cerca de 20 Comissões de Estudos Afro-Brasileiros (Ceafro), responsáveis pela formação dos profissionais, e que é preciso fazer com que atuem conectadas com outras instâncias da educação, como as gerências, para que o trabalho não seja feito de forma “isolada, pontual”.

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