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Escolas apontadas como ociosas pelo TCE são celeiros de vida e resistência no campo

EEPEF em Montanha é uma das dezenas ameaçadas de fechar, caso sejam municipalizadas, como propõe o Tribunal de Contas

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“Existe uma falta de sensibilidade muito grande ainda por parte do TCE [Tribunal de Contas Estadual]”. O lamento, manifestado pelo educador do campo Dione Albani da Silva, é uma forma eufemística de alertar sobre o processo equivocado com que o órgão de fiscalização lidera a mais recente artilheira aberta contra a Educação do Campo no Espírito Santo, por meio do Termo de Ajustamento de Gestão (TAG) que, espera a Corte, seja assinado por todos os 78 municípios capixabas e o governo do Estado em meados deste mês de maio. A proposta é alvo de uma Nota de Repúdio assinada pelo Comitê de Educação do Campo do Espírito Santo (Comeces)

Diretor do Consórcio de Escolas do Campo de Montanha e Ponto Belo, no extremo norte do Estado, que congrega cinco unidades de ensino, Dione é um dos tantos educadores que pedem para serem ouvidos, ao lado das famílias camponesas, assentadas e agricultoras familiares. Uma comunidade que defende suas escolas e pode ensinar aos conselheiros a realidade que há por trás dos números lançados em relatórios impregnados de uma visão urbana e economicista das contas públicas, que não contempla as especificidades pedagógicas que fazem da Educação do Campo um espaço próprio de construção de saberes e de dinâmicas de produção e vida. 

O relatório em questão foi apresentado no final de 2019, contendo várias análises numéricas de cada uma das escolas públicas do Espírito Santo, municipais ou estaduais. Uma delas é a que indica ociosidade ou não das escolas, ao comparar a teórica capacidade de vagas e o número de matrículas efetivadas. 

No Consórcio dirigido por Dione, ele cita o caso da Escola Estadual Pluridocente de Ensino Fundamental (EEPEF) Francisco Domingos Ramos, localizada em um assentamento de reforma agrária em Montanha. Abriga educação infantil, ensino fundamental e Educação de Jovens e Adultos (EJA).

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Despesa sem receita 

No relatório do conselheiro Rodrigo Coelho, ela consta com uma taxa de ocupação de apenas 7,4%, pintada de cor laranja, a segunda mais grave na classificação, apta portanto a receber o receituário de municipalização/nucleação do TCE, o que, na maioria dos casos, deságua em fechamento, decorrente da falta de estrutura dos cofres municipais para arcar com todo o investimento necessário para o devido funcionamento. 

“O TAG fala que deve municipalizar, mas não tem nada certo sobre recurso. Então orienta o reordenamento, mas não trata das condições para que os municípios façam isso. Isso é determinação de fechamento, porque aumenta a despesa sem ter uma previsão de recursos. Em Pinheiros a prefeitura já disse que só consegue manter metade dos profissionais”, expõe.

Além de criar despesa para o município sem garantir o dinheiro necessário, a avaliação das escolas é feita sem base na realidade. “Esses cálculos secos não expressam nada. É preciso considerar a importância social dessas escolas. Atendemos educação infantil e também o EJA. As maiores taxas de analfabetismo estão no campo. Afastar essas escolas das comunidades rurais inviabiliza o acesso dos jovens e adultos e também das crianças. Na nossa escola, nem precisamos de transporte, porque os pais trazem os filhos ou os próprios alunos vêm caminhando, de bicicleta”, descreve Dione.

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As duas salas da Francisco Domingos Ramos, a propósito, são muito bem utilizadas, salienta. Uma com ensino fundamental e outra com infantil. Próximo a ela, cerca de cinco quilômetros, está uma outra escola pluridocente, na comunidade de São Lourenço. Pela régua do TCE, uma das duas vai ter que fechar, no mínimo. Se isso acontecer, o cotidiano das famílias dos estudantes não vai melhorar, ao contrário. 

“É uma medida totalmente contrária às pessoas que vivem no campo hoje. Usar um cálculo com base urbana pra determinar se uma escola do campo é viável ou não, é desconsiderar toda a realidade de quem está vivendo dentro dela e precisa dela”, ensina. 

Pedagogia da Alternância

As cinco escolas do Consórcio Montanha e Ponto Belo aplicam a Pedagogia da Alternância no ensino fundamental e realizam experiências nesse sentido na Educação Infantil. O método é considerado o mais apropriado para as famílias do campo. Introduzido no Brasil na década de 1960, a partir de frades franceses, teve seu berço no Espírito Santo, por meio do Movimento de Educação Promocional do Espírito Santo (Mepes), de onde se multiplicou em outros estados, com grande sucesso.

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“Das nossas cinco escolas, apenas uma não tem educação infantil e estão todas sendo utilizadas no período matutino. Nós precisamos de mais uma sala, porque temos duas escolas que estão com a educação infantil precarizada porque não tem sala, estão estudando no refeitório”. 

Dione ressalta que, diante de carências, como a de local adequado para a educação infantil, é preciso que o Estado e a Corte cheguem com propostas de mais investimentos e melhorias, ouvindo a comunidade escolar e atendendo suas reais necessidades. E não fazendo conjecturas de gabinete feita por quem desconhece a diversidade intrínseca do universo da educação pública, especialmente a educação do campo. 

“A sazonalidade é muito grande”, exemplifica. Uma sala pode estar em um momento com 20 alunos, e dentro de alguns meses, com menos da metade que isso, explica, devido à dinâmica de mudança de endereço de famílias agricultoras que trabalham como meeiras, explica. 

Diálogo 

O diretor do Consórcio reforça o pedido de diálogo. “Sempre dialogamos muito com governo do Estado e prefeituras, mas tivemos pouco diálogos com a Corte”, pondera, ressaltando um dos bons frutos da aproximação feita com o atual governo de Renato Casagrande (PSB), que foi a criação dos Consórcios de Escolas do Campo. 

Uma medida, aponta, que reduziu um pouco a degradação provocada por Paulo Hartung, que, numa única canetada, determinou o fechamento ilegal de dezenas de conselhos escolares no campo, fazendo com que os recursos financeiros das pequenas escolas fossem direcionados para escolas-núcleo, minando a autonomia das pequenas. 

A criação dos Consórcios, em maio de 2021, vai permitir, a partir deste ano, que os recursos novamente sejam entregues diretamente às escolas, por meio da conta do Consórcio, sem passar por uma escola-núcleo. 

O ataque vindo da Corte do TCE “é novo” para os educadores do campo. “Precisamos sentar com os conselheiros também e conversar”, reitera.

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