As estudantes Alice Martins Guedes e Letícia Assunção Ramos passaram por uma nova perícia para comprovar que têm autismo e disputar uma vaga no curso de Medicina da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Ambas tiveram seus diagnósticos rejeitados pela junta médica, o que motivou uma manifestação do Coletivo Mães Eficientes Somos Nós, no último dia 11, na Avenida Fernando Ferrari e no campus da instituição de ensino. As manifestantes foram recebidas pelo então reitor Paulo Vargas, que se comprometeu a dar um retorno até a última sexta-feira (22) em relação à demanda.
O reitor tinha dito que abriria um processo interno para averiguar a situação das estudantes. Uma das integrantes do Coletivo, Lúcia Mara Martins, relata que não houve um retorno por parte do gabinete de Paulo Vargas sobre o tema, mas foi enviado para o e-mail das estudantes o informe com a data e horário de uma nova perícia, que aconteceu nessa segunda-feira (25), na Pró-Reitoria de Graduação (Prograd).
“É uma esperança para que seja feita reparação diante do que aconteceu com elas. Estamos confiantes. Se o resultado não for positivo, o novo reitor [Eustáquio de Castro] vai entrar com um pepino na mão. Não vamos nos calar”, diz Lúcia.
A mãe de Letícia, Kênia Campos Assunção Ramos, afirma que, diferentemente da primeira perícia, a equipe teve uma abordagem diferente. “Ela pôde mostrar com tranquilidade todos laudos, testes, relatórios, toda documentação que comprova a veracidade do diagnóstico do transtorno de espectro autista”, relata.
A professora Sinara Nunes Guedes, mãe de Alice, recorda que a filha fez o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) como candidata PCD, utilizando os mesmos documentos apresentados à Ufes para comprovar sua condição. O argumento da universidade para dizer que a jovem não tem autismo e, portanto, não tem direito à vaga por meio das cotas, foi que a família não tem laudos que comprovem o autismo já na infância.
Contudo, informa Sinara, o autismo de Alice foi diagnosticado de forma tardia, por volta dos 14 anos, quando estava indo para o Ensino Médio. “O que está claro é que eles só aceitam autistas como pessoas com direito à vaga para PCDs se o laudo for desde a infância, mas isso não consta no edital”, contesta. A professora também se queixa do comportamento da perícia, que “já foi preparada para questionar os laudos apresentados”. Ela acrescenta: “era como se estivessem buscando uma brecha para colocar em xeque a veracidade”, critica.
Isso se expressou, afirma, em perguntas como se a estudante tem relação social, como são e se tinha amigos na infância. “É como se o autista não pudesse ter relações sociais”, queixa-se. Outra reclamação da professora é quanto ao fato de a banca não permitir aprofundar as respostas, sendo possível dizer apenas sim ou não. “Em uns 10 minutos de conversa, chegaram à conclusão que ela não é autista, e, consequentemente, acusaram de mentirosos os profissionais que a acompanham. O capacitismo ficou claro na perícia”, lamenta.
Sinara questiona a falta de padronização para análise dos candidatos PCDs. Em outros cursos, como o de Pedagogia, aponta, não houve entrevista com junta médica, somente apresentação de laudo. “Por que em Medicina precisa de tudo isso?”, questiona. A professora destaca que, caso a universidade continue não reconhecendo o diagnóstico de autismo de Alice, ela terá que fazer o Enem novamente, mas ao tentar ingressar na Ufes, não poderá disputar pelas cotas para PCDs, já que foi descartada essa possibilidade.