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Fórum discute educação superior para indígenas e quilombolas

Tupinikim Jheniffer Pêgo, de Aracruz, defende a criação de políticas públicas concretas para garantia da permanência dos estudantes

Regis Guajajara/ Mídia Índia

Acontece em Brasília o I Fórum Nacional de Educação Superior Indígena e Quilombola (FNESIQ). O encontro vai até esta sexta-feira (8) e tem como uma das principais pautas o Programa Bolsa Permanência, do governo federal, que entre 2018 e 2021, deixou de atender 12 mil alunos em todo o Brasil, de acordo com dados do Ministério da Educação (MEC).

A Tupinikim Jheniffer Pêgo, 28 anos, do município de Aracruz, norte do Estado, cursa Saúde Coletiva na Universidade de Brasília (UnB), e explica que os problemas no programa de assistência financeira foram um dos principais motivos para realização do fórum, que também discute estratégias para garantir que esses estudantes consigam concluir os cursos iniciados. “A gente sabe que o acesso e a permanência dos estudantes indígenas ao ensino superior estão ameaçados, uma vez que o governo não tem mais interesse em garantir sua permanência nas universidades públicas”, aponta.

Com mobilização da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq), o fórum reúne cerca de 700 estudantes. Desde essa segunda-feira (4), os estudantes estão acampados no espaço da Fundação Nacional de Artes (Funarte), em Brasília. Por falta de recursos para a viagem, apenas quatro indígenas de Aracruz participam do encontro.

Moradora da aldeia Caieiras Velha, Jheniffer Pêgo destaca que uma das principais urgências no debate sobre o ensino superior é o entendimento das diversidades existentes entre os povos indígenas. “Para cada povo, para cada região, esse acesso tem que ser construído primeiro no diálogo e, segundo, reconhecendo essas especificidades, de cada local e povo”, explica.

No Espírito Santo, ela destaca que um dos problemas é o próprio transporte dos estudantes, que muitas vezes é pago pelas associações dentro dos territórios indígenas. “Quando a gente vai fazer um vestibular, por exemplo, da UNB, geralmente um dos polos mais próximos é de Brasília. Então esse custo do trajeto tem que ser pago por alguém né? E geralmente é pago por nós, estudantes, com parceiros”, destaca.

Além das dificuldades causadas por problemas financeiros, os estudantes ainda precisam lidar com os problemas de adaptação a uma realidade completamente diferente da que cresceram. “A gente chega na universidade e tem um choque cultural muito grande, porque sai de um contexto de aldeia, de vivência e de comunidade, e vai pra uma cidade grande, onde tem outros contextos de vivência e até de estruturas físicas. É muito diferente”, relata.

Jheniffer iniciou o curso de forma presencial, mas está em ensino remoto em razão da pandemia. Ela enfatiza que esse processo de adaptação se torna ainda mais desafiador para estudantes indígenas. “Isso leva tempo. Então alguns levam um período de um semestre, outros mais de um semestre. Isso varia de estudante pra estudante, mas, no geral, esse impacto acontece”, pontua.

Durante a abertura do fórum, a coordenadora de juventude da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos, Débora Stefany, ressaltou que esse processo de negação de acesso aos povos originários é uma luta de anos.

“Tudo pra gente é mais complicado, mais difícil. A gente tem sempre que lutar, dia e noite, para poder vencer e caminhar. E a gente só quer caminhar, mas eles dificultam tanto a nossa caminhada, que no meio do caminho a gente fica perdido e com vontade de desistir”, declarou.

Bolsa Permanência

Nessa terça-feira (5), representantes de entidades que participam do fórum foram à Câmara dos Deputados reivindicar a abertura de vagas no Programa Bolsa Permanência. Um debate foi realizado pelas comissões de Educação e de Legislação Participativa, para discutir o acesso dos jovens indígenas e quilombolas ao ensino superior.

O programa do governo federal oferece auxílio financeiro aos estudantes quilombolas, indígenas e em situação de vulnerabilidade socioeconômica matriculados em instituições federais de ensino superior. O valor da bolsa é de R$ 900,00 para estudantes indígenas e quilombolas e R$ 400,00 para os demais.

A ideia é garantir a permanência dos estudantes nas universidades, mas o número de pessoas atendidas diminuiu nos últimos anos. Presente na Câmara dos Deputados, o representante do Ministério da Educação (MEC), Edimilson Costa Silva, informou que, entre 2018 e 2021, o número de atendidos passou de 22 mil para 10 mil alunos em todo o País.

“A garantia do acesso é um direito do indígena, assim como um direito à educação (…) isso fragiliza o próprio movimento que a gente faz, de construção, de autonomia e, principalmente, é a negação de um direito do estudante indígena de estar na universidade pública”, aponta Jheniffer.

O porta-voz do MEC alegou que o problema se deve à falta de recursos no orçamento para o programa e que a pasta estaria trabalhando para recompor esses recursos para 2022.

A deputada e professora Rosa Neide (PT-MT) contestou, enfatizando que a falta de assistência a indígenas e quilombolas no ensino superior, na verdade, se deve à falta de prioridade do governo federal. O mesmo foi reiterado pelo coordenador do encontro nacional dos estudantes indígenas, Kâhu Pataxó, que destacou dificuldades de acesso desde 2017.

Para Jheniffer Pêgo, é preciso construir políticas públicas que vão além do processo de entrada desses estudantes no ensino superior. “Não somente abrir vaga para os estudantes indígenas, mas abraçar o estudante na sua integralidade. É uma questão de garantir o direito integral dos estudantes”, destaca.

A Tupinikim prossegue: “Enquanto estudante indígena, nós precisamos nos empoderar disso, identificar que esse é um direito e, toda vez que isso for negado ou negligenciado, a gente precisa se pautar (…) Enquanto tiver um estudante indígena no ensino superior, vão ter vários povos no ensino superior também”, finaliza.

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