Laboratório da Ufes aponta equívocos no PL, votado em urgência e com voto contrário apenas de Camila Valadão
O projeto dispõe sobre a “gestão democrática da educação básica pública estadual”. Na mensagem encaminhada, o governador em exercício, Ricardo Ferraço (MDB), aponta que o objetivo é dar autonomia pedagógica às escolas, facultando a elaboração de seu próprio Projeto Político Pedagógico (PPP); autonomia administrativa, por meio do Conselho de Escola com alunos, pais, gestores e professores; e autonomia financeira, mediante a transferência de recursos.
“É no mínimo uma excentricidade que as funções do diretor escolar estejam enumeradas no inciso III, em 10 alíneas, no inciso IV, em 13 alíneas e no inciso v, em 12 alíneas, perfazendo um total de 35 alíneas! Resta perguntar se o referido PL é sobre Gestão Democrática ou sobre o passo a passo de como a Sedu quer que os diretores exerçam função de controle sobre o trabalho docente, tornando-se, assim, uma mera extensão desse órgão central”, destaca a nota técnica.
No que diz respeito à escolha dos diretores escolares, o projeto de lei exclui a possibilidade de eleição, e o processo passa a ser feito exclusivamente por meio de “critérios técnicos de mérito e desempenho”. Além disso, a destituição dos gestores poderá ocorrer “por decisão da administração, por motivos de baixo desempenho, renúncia, destituição, aposentadoria, morte ou a pedido”, uma proposta considerada arbitrária.
A nota aponta que o modelo atual, de seleção via editais, já apresenta problemas, por configurar os diretores como meros representantes da Sedu nas escolas. “Sendo assim, sugerimos aos/às parlamentares da Ales que a escolha de diretores na Rede Estadual do Estado do Espírito Santo combine processo seletivo qualificado e eleição com participação da comunidade escolar. O processo seletivo qualificado pode se dar com apresentação de um plano de gestão associado a cursos de formação ofertados pela própria”, propõe.
Nesse quesito, a deputada Iriny Lopes (PT) chegou a apresentar uma emenda para estabelecer a eleição dos diretores pela comunidade escolar, mas foi rejeitada pelo deputado Mazinho dos Anjos (PSDB), que relatou o projeto sem qualquer debate. A justificativa do deputado é de que a medida foi declarada inconstitucional por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), mas não ficou claro a partir de sua fala qual seria o item específico que fere a Constituição.
O Lagebes critica ainda a forma de constituição estabelecida para os Conselhos de Escola, que terão personalidade jurídica própria. Escolas de menos de cem estudantes deverão organizar-se em consórcio com outras cinco unidades, e as que não o fizerem deverão ser vinculadas à “Escola de Referência”.
“Nesse sentido, vale ressaltar que as escolas do campo, indígenas e quilombolas serão vinculadas às ‘Escolas de Referência’, vínculo esse que será regulamentado posteriormente por meio de portaria, o que não é recomendável”, alerta.
Também é criticada a falta de articulação entre os vários tipos de planejamento, citando-os “de forma isolada, como se a unidade de ensino tivesse que realizar cinco tipos de planejamento diferentes”.
A nota técnica ressalta, ainda, a “importância do Regime de Colaboração com o Governo Federal, particularmente com a única Universidade Federal do Estado do Espírito Santo, a Ufes, tanto na consulta prévia a projetos de lei dessa envergadura, como em cursos de qualificação de diretores e de integrantes da comunidade escolar que promovam os princípios da gestão democrática”.
Ar-condicionado
A discussão na Assembleia Legislativa acabou ficando restrita à possibilidade de o projeto, em tese, facilitar a compra de aparelhos de ar-condicionado pelas escolas estaduais.
“Esse projeto, apenas para os deputados entenderem, transfere recursos para as diretoras das unidades de ensino, que têm sua autonomia, para adquirirem ar-condicionado para climatizar as salas, enfrentando esse momento de calor terrível. É importante aprovar agora, porque ele tem efeito ano que vem, então, naturalmente, garantindo o recurso necessário”, discursou o presidente da Assembleia, Marcelo Santos (Pode), antes de encaminhar para a discussão do tema.
Entretanto, em sua fala, a deputada Camila Valadão ressaltou que não se tratava de “um projeto simples”, a ser discutido em regime de urgência. “Na nossa análise, um projeto de tamanha monta não deveria ser aprovado em regime de urgência. Nós lamentamos a escolha de trazer para discussão desse forma. Na nossa análise, um projeto como esse deveria ser precedido de audiência pública, de debate com a sociedade, de debate com setores que estudam também a política de educação”, defendeu a deputada, que citou os itens apontados na nota técnica do Lagebes.