Apartados dos espaços de decisão, professores e sociedade fazem manifestação pedindo aulas apenas após a vacina
“Temos tentado sensibilizar para a importância de trazer os professores para o início [do Plano Nacional de Imunização – PNI]. No Conselho nacional de secretários de educação, cuja presidência eu assumo no dia nove [de fevereiro] também tenho buscado interlocução, mas não temos tido sucesso nesse diálogo”.
A declaração foi feita pelo secretário de Estado de Educação, Vitor de Angelo, em coletiva de imprensa realizada nesta quinta-feira (28) juntamente com o presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação no Espírito Santo (Undime-ES), Vilmar Lugão, e os secretários municipais de Serra, Alexandre Bermudes, de Vila Velha, Fabiana Kauark, de Vitória, Juliana Roshner, de Cariacica, José Roberto Martins Aguiar, e de Viana, Luzian Belisário dos Santos.
Na coletiva, os gestores anunciaram que, em consenso, decidiram que todas as redes públicas capixabas retornarão às aulas em sistema presencial ou hibrido até o dia 1º de março .
O presidente da Undime-ES fez coro ao secretário, dizendo que também tem feito interlocução em nível nacional tentando a priorização dos profissionais de Educação, mas igualmente sem sucesso. “Alguns estados, como Santa Catarina, têm estabelecido, por decreto-lei, que a Educação seja um serviço essencial”, complementou.
Atualmente, o PNI coloca os profissionais da Educação em último lugar entre os grupos prioritários para imunização contra Covid-19. “A tendência é que demore alguns meses ainda [para a imunização dos professores], talvez somente no segundo semestre”, disse Vitor de Angelo.
Referindo-se ao pedido feito pelos coletivos de professores e da sociedade civil e por epidemiologistas que recomendam o retorno das aulas presenciais somente após vacinação dos trabalhadores do setor, o secretário disse que essa argumentação perde força quando se observa que “todas as demais atividades já retornaram”, mesmo sem a vacinação dos trabalhadores.
Reforçando o pedido citado pelo secretário, o Movimento Sobreviva Brasil realizou mais uma passeata e manifestação pública nesta quarta-feira (27), com entrega, ao final, do abaixo-assinado ao governador Renato Casagrande (PSB), apoiado por diversas entidades e coletivos, entre eles: Associação dos Docente da Ufes (Adufes), Centro de Estudos Bíblicos do Espírito Santo (Cebi/ES), Resistência & Luta Educação, Coletivo Educação pela Base, Coletivo Lute-ES, Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB-ES), Mães Professoras Unidas pela Vida, Brigadas Populares, Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH-ES), Círculo Palmarino, Sindicato dos Trabalhadores da Universidade Federal do Espírito Santo (Sintufes), Sindicato dos Trabalhadores e Servidores Públicos do Estado do Espírito Santo (Sindipúblicos) e Sindicato dos Trabalhadores da Saúde no Espírito Santo (SindSaúde-ES).
A carreata saiu do Tancredão, na Ilha do Príncipe, às 14h, em direção ao Palácio Anchieta, da Cidade Alta, no centro de Vitória, onde foram instalados um caixão e várias cruzes, em referência aos mortos pela pandemia no Estado, que já alcança, segundo o Painel Covid-19 desta quarta-feira (27), 5.777 pessoas.
No documento protocolado no Palácio da Fonte Grande, os manifestantes e quase mil assinantes pedem que o governador “proteja nossas crianças, seus pais e avós, os trabalhadores da Educação, assim como toda sociedade, não permitindo a volta às aulas enquanto não for feita a vacinação contra COVID-19 (…)”.
Foi a segunda vez que o Movimento protocola a petição, sendo a primeira no dia 24 de setembro de 2020. “Os trabalhadores da educação não estão no grupo de prioridade para tomar a primeira dose da vacina. Logo, entendemos que a educação não é, de fato, um serviço considerado essencial pelo governo capixaba”, critica um dos articulares do Movimento, Alessandro Chakal.
Reconhecendo os pleitos feito há meses pelos sindicatos de trabalhadores sobre vacinação e outras demandas da categoria, Vitor de Angelo se limitou a dizer que “o sindicato está no seu papel de defender determinadas posições, mas todas as decisões que tomamos, seja em consenso ou especificas de cada rede, têm fundamento na ciência e em evidências que nos permitem dar esses passos, mesmo quando há discordância do sindicato. Estamos em perspectivas diferentes e é natural adotar posições distintas sobre alguns assuntos”, declarou.
Estado não atende aos indicadores de segurança
As evidências científicas, no entanto, também não balizam o retorno presencial em um cenário de pandemia sem controle, com uma segunda onda ainda mais violenta que a primeira.
Em documento publicado no último dia 18 de janeiro, a epidemiologista Ethel Maciel e o matemático Etereldes Gonçalves Junior, ambos professores da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), também voltaram a recomendar o retorno presencial apenas após vacinação, ao menos, dos trabalhadores da Educação.
A medida, explicam, pode colaborar fortemente para mudar o atual contexto pandêmico do Espírito Santo, que atende a apenas dois dos sete critérios estabelecidos pela Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz) como fundamentais para garantir uma segurança mínima para o retorno de trabalhadores e estudantes ás salas de aula, o que representa, no caso capixaba, de mais de um milhão de pessoas, grande parte delas transitando em transporte coletivo ou transporte escolar.
“Seria importante que o Estado, juntamente com o governo federal, pudesse priorizar o sistema educacional e, portanto, incluir a vacinação de profissionais da educação na segunda fase de campanha. Assim, tendo os profissionais da educação vacinados e também os adultos com comorbidades que os estudantes venham a ter contato no ambiente familiar, estaríamos diminuindo a chance de transmissão na escola e promovendo um retorno mais seguro das atividades”, argumentou Ethel Maciel, ao comentar as orientações do documento.
“Israel demonstrou que, três semanas após a vacinação atingir um percentual de 25% dos grupos prioritários, já foi possível observar uma redução na transmissão”, compara. “Um retorno seguro incluirá a garantia da vacinação e a observação do seu impacto nos indicadores apresentados”, complementou.
No documento, os dois pesquisadores mencionam o número baixo de alunos que retornou às salas de aula a partir de setembro passado, quando o governo do Estado autorizou a reabertura das escolas. “Os dados que foram divulgados até o momento não mencionam um efetivo quantitativo de estudantes que estiveram presentes na escola, pois o retorno foi muito tímido e a maioria dos alunos e seus familiares, diante da pandemia, optaram pela manutenção do ensino remoto”.
No contexto mundial, informam, “os dados coletados no exterior sobre contaminação nas escolas ainda não são consistentes, porque boa parte dos países seguiu a determinação de fechamento desses espaços físicos. Quando ocorreu a reabertura, ela foi primeiramente direcionada aos estudantes filhos de trabalhadores essenciais e depois escalonada”.
Apenas um estudo realizado no Reino Unido traz um pouco mais de base para a análise do impacto da reabertura das escolas nesse momento, destacam. Nele, as escolas apresentam três vezes mais rico de contaminação de Covid-19 do que os hospitais, “o que ocasionou o fechamento, no lockdown (confinamento) de início de 2021”.