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O fim da desigualdade na educação ou a meritocracia e maior privatização?

Proposta de Rigoni defende instituições privadas e a de Ranfolfe assegura equidade e qualidade na educação pública

Cleia Viana/Agência Câmara

O principal avanço conquistado para a educação pública com a aprovação da Emenda Constitucional (EC) 108/2020 pode ser perdido caso o relatório do deputado Felipe Rigoni (PSB) seja aprovado no lugar da proposta encabeçada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede/AP). Ambas são voltadas a regulamentar a emenda que tornou permanente o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), o que precisa ser feito até 31 de dezembro. 

O relatório do capixaba se refere ao Projeto de Lei (PL) nº 4.372/2020, que tramita na Câmara e difere frontalmente com o PL nº 4.519/2020, do amapaense, que ainda não tem relatório pronto para votação. A previsão de votação do relatório de Felipe é ainda esta semana, o que tem colocado educadores de todo o país em estado de alerta e mobilização. 
Enquanto Felipe Rigoni tem notória formação política financiada pelo grupo RenovaBR e defende as pautas de organizações como a Fundação Lemann e Todos Pela Educação, Randolfe Rodrigues traz uma proposta que dialoga e afirma estudos e documentos coletivos feitos no país com viés da defesa da educação pública. 
“O grande ganho dessa Emenda foi a constitucionalização do Custo Aluno Qualidade, o CAQ”, ressalta a doutora em Educação, professora da Universidade Federal do Espírito Santo e coordenadora do Laboratório de Gestão da Educação Básica (Lagebes/Ufes), Gilda Cardoso. Cabe então, ao texto regulamentador, definir o funcionamento do CAQ, incluindo os fatores de ponderação para Educação de Jovens e Adultos (EJA), educação do campo, de indígenas, quilombolas e de crianças com deficiência. 
O CAQ, no entanto, foi excluído do relatório de Rigoni. “O que a gente espera é que haja uma resistência por parte da sociedade a esse relatório do deputado Felipe Rigoni e que seja aprovado no Congresso um texto com os termos do projeto do senador Randolfe Rodrigues, que contempla o CAQ”, defende. A proposta de Rigoni, salienta Gilda, “ataca o direito à educação da população brasileira”. 
“Isso está tudo muito de acordo com a formação privatista do deputado Felipe Rigoni, que todos sabem tem uma vinculação orgânica com organizações de interesses empresariais. Ele é do grupo RenovaBR, assim como a deputada Tábata Amaral [PDT-SP] e outros, que são financiados pela Fundação Leman, Todos Pela Educação…e que não estão preocupados de fato com a qualidade e a equidade da oferta da educação pública em todo o território nacional”. 
A proposta de regulamentação apresentada pelo relator Felipe Rigoni, compara a educadora, está direcionada a beneficiar as instituições privadas conveniadas, especialmente de educação infantil e educação especial. E no lugar do CAQ, está um substituído ainda sem forma definida chamado de “custo médio”. 
“A gente não sabe o que é o custo médio, o relatório não define”, critica o também professor da Ufes Douglas Ferrari, especialista em Educação Especial. O CAQ, enfatiza, inverte a lógica atual da complementação de recursos que é feita pela União aos estados e municípios, garantindo aporte maior de recursos para as redes e escolas mais precárias e que mais precisam de investimento para atingir um padrão mínimo de qualidade estabelecido nacionalmente: saneamento básico, laboratório de ciências, biblioteca, quadra de esportes, internet, bons salários e plano de carreira para os professores, entre outros insumos essenciais. 
Além de excluir o CAQ, complementa Douglas, o relatório de Rigoni também prevê um “bônus” de 2,5% para as escolas que se sobressaírem nas avaliações nacionais de desempenho – recurso que, na visão da coordenadora do Lagebes, assenta-se no conceito da meritocracia. “A proposta do deputado Felipe Rigoni prevê critérios meritocráticos para o repasse de recursos, quando a gente sabe que muitas redes não têm capacidade institucional para avançar na melhoria dos seus resultados”, expõe Gilda. 
Para a educadora, “a grande preocupação do relator foi ampliar a possibilidade da utilização de recursos públicos em instituições particulares”. A previsão é de que mais de 200 instituições particulares sejam beneficiadas, informa. 
Para Marcia Saraiva, do Comitê Capixaba da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, “a inclusão de instituições privadas no Fundeb caracteriza o aprofundamento da privatização da educação”. A troca do CAQ pelo Custo Médio, afirma, “é incongruente e inaceitável”. 
“Na prática, com o CAQ incluído, prefeitos e governadores terão como assegurar, dentre outros, que as escolas tenham: energia elétrica, água potável, número adequado de alunos por sala, alimentação, biblioteca, laboratório, quadras cobertas e salário adequado dos profissionais da educação, insumos indispensáveis para a qualidade na educação”, descreve.

A proposta de Rigoni, ao contrário, traz um grande retrocesso. “A minuta de relatório não avança em fatores de ponderação para o repasse do dinheiro do Fundeb, que é distribuído com base no número de alunos e por etapa de ensino. Ao contrário, os exclui”. Por isso, “a Campanha afirma que deve ser feita uma correção a fim de ajustar a distância entre o custo real e o repassado pelo Fundeb em algumas modalidades e etapas como a creche, a educação escolar indígena, quilombola e do campo e a Educação de Jovens e Adultos (EJA), entre outras”.

No posicionamento público da Campanha, são abordados ainda outros pontos das propostas que tramitam no Congresso Nacional, como o piso salarial do professor e a gestão democrática das escolas.

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