Escolas sem ventilação adequada, saneamento básico, laboratórios de informática, quadras e pátios cobertos…itens previstos desde 2015 nas metas dos planos nacional, estadual e municipais de Educação, tais estruturas se tornaram ainda mais urgentes durante a pandemia de Covid-19, mas, pasme, continuam sem implementação.
Torná-las realidade na vida cotidiana dos estudantes e trabalhadores da Educação é uma das prioridades da 2ª Conferência Nacional Popular de Educação no Espírito Santo (Conape-ES), programada para acontecer em 2022, ao lado, obviamente, de temas como o novo Custo Aluno Qualidade do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (CAQ-Fundeb) e das escolas cívico-militares.
O lançamento público oficial da Conape será feito pelo Fórum Nacional Popular de Educação no Espírito Santo (FNPE/ES) em uma audiência pública virtual que acontece nesta terça-feira (1).
Convocada pela Comissão de Educação da Assembleia Legislativa a pedido da deputada Iriny Lopes (PT), a audiência tem início às 19h e terá como expositores integrantes do Fórum Nacional Popular da Educação (FNPE): o professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) Luiz Fernando Dourado; o coordenador da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo; o coordenador do FNPE/ES e professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Eduardo Moscon; a integrante do comitê capixaba da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Sumika Freitas; e o diretor do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Espírito Santo (Sindiupes), Gean Carlos Nunes.
“A Conape está sendo lançada em vários estados da federação. Nesse importante debate no Espírito Santo, pretendemos trazer para a sociedade capixaba a importância de valorizar e exigir uma educação pública, laica, democrática, crítica e de qualidade para todos que dela necessite”, salienta Gean Carlos.
Integrante do comitê executivo do FNPE/ES, o professor Eduardo Moscon explica que “o Fórum Popular tem como luta o cumprimento do Plano Nacional de Educação, acompanhando e avaliando o seu cumprimento”. O Plano foi criado por lei federal em 2015, bem como os planos estaduais e municipais subsequentes. Contêm as metas de investimento na Educação e os Fóruns possuem o papel de acompanhar e avaliar o cumprimento das metas, realizando as conferências de Educação como parte da estratégia de monitoramento e discussão sobre os planos.
O lugar da sociedade civil
Ocorre que, ao assumir o Palácio da Alvorada após o impeachment da ex-presidente Dilma Roussef (PT), Michel Temer (MDB) provocou uma grave descaracterização do Fórum Nacional e da Conferência Nacional de Educação, ao retirar grande parte das entidades da sociedade civil, de modo a concentrar o poder de decisão nas mãos dos governos. Para preservar o lugar da sociedade civil, essas organizações excluídas se organizaram no Fórum Nacional Popular e, em efeito cascata, nos fóruns estaduais populares, que organizam, respectivamente, as conferências populares (Conape) nacional e estaduais.
No Espírito Santo, pontua Eduardo Moscon, “o Fórum Popular nasceu em função do não funcionamento do Fórum Estadual durante o governo de Paulo Hartung” e “continuou ativo, porque alcançou uma potência popular muito grande”, ressalta, mencionando a existência de mais de 50 organizações da sociedade civil no Fórum Popular.
O Espírito Santo é o único estado do Sudeste e um dos poucos do país onde coexistem as duas estruturas: o Fórum Estadual de Educação (FEE/ES), criado por lei estadual, seguindo o ordenamento nacional, sendo presidido pelo titular da Secretaria de Estado da Educação (Sedu); e o Fórum Popular de Educação (FNPE/ES), criado a partir da união dessas dezenas de organizações.
A ‘boiada’ não pode continuar passando
Já no âmbito das cidades, o que existe são os oficiais fóruns municipais de educação, previstos em lei e responsáveis pelo monitoramento e avaliação dos planos municipais de Educação. É com esses fóruns municipais que o Fórum Popular Estadual se propõe a retomar os diálogos e mobilizações.
“A boiada está passando, mas não podemos deixar, tem que haver discussão com a sociedade”, conclama Eduardo Moscon, utilizando a famosa expressão pronunciada pelo ministro de Meio Ambiente, Ricardo Salles, em 2020, quando comemorou a atenção da imprensa voltada para a pandemia, o que facilitaria “passar a boiada sobre a Amazônia”.
Com o governo de Jair Bolsonaro (sem partido), o “apagamento da participação popular na gestão das escolas se intensificou”, constata o professor, seguido do “desmonte da ciência e tecnologia e inoperância do Ministério da Educação, que não se esforça para fazer cumprir o plano nacional”. Essa ausência, sublinha, “é proposital, tem objetivo de desestruturar a Educação e favorecer a privatização”.
O momento, ratifica, é de “focar no município, que é onde a educação acontece. O Plano é do município e não do prefeito. A Constituição Federal estabeleceu que temos que ter planos decenais, para a sociedade, não para os prefeitos ou vereadores. É isso que o Fórum Popular resgata”, reafirma.
“Anísio Teixeira [educador que dá nome ao Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais– Inep] falava que o grande problema do Brasil é a falta de continuidade na Educação. Esses dois governos decidiram desestruturar tudo o que já estava colocado pela sociedade, as propostas, as metas e as estratégias. E cada nova gestão municipal ou estadual por vezes muda tudo, querendo reinventar a roda, o que provoca grande desperdício de dinheiro público”, expõe.
Exemplo desse desperdício de dinheiro público por falta de continuidade de políticas públicas já estabelecidas e não cumpridas
é a criação das escolas cívico-militares. “Isso é um projeto do Bolsonaro, que não está escrito em nenhum momento no plano nacional nem nos planos estaduais ou municipais de Educação, e vai drenar dinheiro público que deveria ser investido nas metas já traçadas”, explica, ressaltando que, diferentemente do que tem sido anunciado, a maior parte dos recursos para manutenção das escolas cívico-militares virá dos cofres municipais e não do governo federal.
O desfinanciamento também atinge as instituições federais de ensino superior, amplia o coordenador do FPE/ES. “Estamos vivendo um momento muito complexo e difícil nacionalmente, que afeta sobrepeso a ciência e a educação do Brasil, em especial as universidade e institutos federais que são públicos. Estamos tendo uma diminuição dos recursos que afeta barbaramente as universidades e institutos”.
Já do ponto de vista municipal, Eduardo Moscon chama atenção para a implementação do novo CAQ-Fundeb, que vai provocar um aumento do financiamento em alguns municípios. “O monitoramento pelo fórum popular pode verificar onde esse recurso extra vai ser investido”, destaca.