Foram negadas redução de carga horária e de tempo de contagem para aposentadoria
O professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Antônio Carlos Queiroz do Ó Filho, teve seus pedidos de redução de carga horária e do tempo de contagem para aposentadoria negados pela Perícia da instituição de ensino, embora seja autista nível 1 de suporte. O docente informa que vai pedir reconsideração, conforme estabelecem os trâmites administrativos da própria Ufes. “Não vou aceitar quieto. Não gosto de conflito, mas não vou deixar isso de lado, pois é uma injustiça”, destaca.
Antônio Carlos afirma que já sofria com ansiedade e síndrome do pânico, mas descobriu o autismo de forma tardia, quando sua esposa, especialista em ciência ABA 9 (Análise Aplicada do Comportamento), o recomendou que fizesse o teste. Além do autismo, foi constatado Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH).
Assim, foi procurar saber quais eram seus direitos, e viu que entre eles estão redução de carga horária e do tempo de contagem para aposentadoria. Antônio Carlos informa que, em relação à redução de carga horária, a Perícia respondeu que “não foi verificada no momento a necessidade de o servidor exercer suas atividades em horário especial”. Quanto à redução do tempo de contagem para aposentadoria, a resposta foi “concluímos que não é considerado no momento portador de deficiência”.
No que diz respeito ao primeiro pedido, Antônio Carlos afirma não ter sentido tanto, pois pensou que a decisão poderia ser pelo fato de ele ter autismo nível 1 de suporte. Contudo, quando viu a resposta do segundo, achou “absurdo por negar o autismo”. O professor se queixa também da forma como foi conduzida a Perícia. De acordo com ele, perguntas como sua vivência na infância e adolescência na escola eram feitas “em tom policialesco, como se estivessem desconfiados”.
Uma das integrantes da Perícia, recorda Antônio Carlos, chegou a dizer “ah, mas você está forte!”. “Eu respondi que estava acima do peso, pois tive hérnia de disco, já tinha feito cirurgia e estava fazendo uso de corticóide”, conta. O professor afirma que, caso não obtenha sucesso no pedido de reconsideração, vai pedir recurso. Neste caso, conforme estabelece a universidade, terá que ser avaliado por outra equipe, não mais a mesma.
Outros casos
Em março último, uma situação semelhante aconteceu na Ufes envolvendo duas estudantes autistas que tiveram seus diagnósticos rejeitados pela junta médica para ingressar no curso de Medicina por meio das cotas para Pessoas Com Deficiência (PCDs): Alice Martins Guedes e Letícia Assunção Ramos. O ocorrido provocou uma manifestação do Coletivo Mães Eficientes Somos Nós, que parou momentaneamente a Avenida Fernando Ferrari.
Na ocasião, uma das integrantes do coletivo, Lúcia Mara Martins, criticou o fato de a junta médica ter sido formada por um ortopedista, um clínico geral e um médico do trabalho, especialidades que não estão relacionadas com a questão do autismo. Após nova Perícia, foi reconhecido que as estudantes são autistas, mas elas não puderam efetivar matrícula no curso de Medicina por meio de cotas para PCDs. A alegação da universidade foi de que a quantidade de vagas já está completa.
A professora Sinara Nunes Guedes, mãe de Alice, recordou que a filha fez o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) como candidata PCD, utilizando os mesmos documentos apresentados à Ufes para comprovar sua condição. O argumento da universidade para dizer que a jovem não tinha autismo e, portanto, não tinha direito à vaga por meio das cotas, foi de que a família não tinha laudos que comprovassem o autismo já na infância.
Contudo, informou Sinara, o autismo de Alice foi diagnosticado de forma tardia, por volta dos 14 anos, quando estava indo para o Ensino Médio. “O que está claro é que eles só aceitam autistas como pessoas com direito à vaga para PCDs se o laudo for desde a infância, mas isso não consta no edital”, disse. A professora também se queixou do comportamento da Perícia, que “já foi preparada para questionar os laudos apresentados”. Ela acrescentou: “era como se estivessem buscando uma brecha para colocar em xeque a veracidade”.
Isso se expressou, afirmou, em perguntas como se a estudante tem renda social, como são as relações sociais dela, e se tinha amigos na infância. “É como se o autista não pudesse ter relações sociais”, queixou-se. Outra reclamação da professora é quanto ao fato de a banca não permitir aprofundar as respostas, sendo possível dizer apenas sim ou não. “Em uns 10 minutos de conversa, chegaram à conclusão que ela não é autista, e, consequentemente, acusaram de mentirosos os profissionais que a acompanham. O capacitismo ficou claro na perícia”, lamentou.
Sinara questionou a falta de padronização para análise dos candidatos PCDs. Em outros cursos, como o de Pedagogia, apontou, não houve entrevista com junta médica, somente apresentação de laudo. “Por que em Medicina precisa de tudo isso?”, questionou.