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Programa Mais Professores é insuficiente, apontam entidades

Anfope e Sindiupes afirmam que iniciativa deve vir acompanhada de outras políticas

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Foi lançado pelo Governo Federal, nessa terça-feira (14), o programa Mais Professores, que busca fortalecer a docência no Brasil, inclusive, aumentar a procura por cursos de licenciatura, que tem diminuído. Contudo, o Sindicato dos Trabalhadores da Educação Pública no Espírito Santo (Sindiupes) e a Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope), embora classifiquem as ações previstas nessa iniciativa como importantes, acreditam que não são suficientes.

O programa trabalha com cinco eixos estruturantes: seleção para o ingresso na docência, com a realização da Prova Nacional Docente para subsidiar os estados, o Distrito Federal e os municípios nos processos de seleção e de ingresso no magistério, com adesão facultativa; atratividade para as licenciaturas, com concessão da Bolsa Pé-de-Meia Licenciaturas para fomentar o ingresso, a permanência e a conclusão nos cursos de licenciatura; alocação de professores, com a Bolsa Mais Professores, para incentivar a atuação em regiões e áreas de conhecimento com carência de docentes; formação docente, com um portal que visa fortalecer o desenvolvimento profissional de acordo com o perfil e a necessidade do docente; e valorização dos professores, que prevê ações de reconhecimento da importância social dos docentes, estabelecidas por meio de parcerias com outros ministérios e órgãos públicos.

Fábio Amorim, representante do Espírito Santo na Anfope, afirma que “não dá para dizer que está uma porcaria”, mas que “trata-se de um paliativo, algo insuficiente”. “É algo que, da forma como está sendo feito, não reflete na realidade dos atuais e futuros profissionais”, diz, comparando o Mais Professores a iniciativas como abono de fim de ano, que não caracterizam, de fato, uma valorização salarial. “O abono é dinheiro que não foi investido na educação, no profissional, inclusive, em sua valorização salarial”, afirma.

Em relação ao Mais Professores, Fábio questiona: “muda a escola? O que vai oferecer em relação às condições de trabalho? Com o Mais Professores, há uma disposição em fazer algo, mas é preciso realmente valorizar a carreira profissional para que as pessoas possam querer ingressar nessa carreira”. Ele defende que é preciso políticas educacionais de Estado com foco na formação, salário, carreira e condições de trabalho.

No que diz respeito à criação da Prova Nacional Docente, Fábio afirma que falta clareza sobre como ela será realizada. Em relação ao Pé-de-Meia Licenciaturas, que dará bolsas mensais de R$ 1 mil para estudantes de licenciatura, Fábio aponta que a iniciativa busca estimular estudantes a fazer essas graduações, mas não garante condição de trabalho para os futuros profissionais. “O que tem reduzido o número de pessoas em busca de cursos de licenciatura é a narrativa de que não vale a pena ser professor, pois é um profissional que recebe mal, a educação está precarizada, que não compensa estar na educação”, diz.

Essa desvalorização dos profissionais, afirma, está, por exemplo, na grande contratação de professores em Designação Temporária (DTs), como vem ocorrendo no Espírito Santo. Mesmo com o anúncio de 1,2 mil vagas em concurso público para os cargos de Agente de Suporte Educacional, Professor MaPP (Pedagogo) e Professor MaPB, em dezembro último, a quantidade de vagas, destaca, é insuficiente, havendo necessidade de manutenção de um grande número de DTs, que, segundo Fabio, são “contratos a título precário”. “O profissional não sabe o que vai ser da vida dele no ano seguinte”, diz, referindo-se ao fato de que não há garantias de manutenção do contrato de um ano letivo para o outro.

O Bolsa Mais Professores, que concederá uma bolsa no valor de R$ 2,1 mil para profissionais que aceitarem atuar em regiões e áreas de conhecimento com carência de docentes, defende Fábio, deveria vir acompanhado de políticas intersetoriais, como no caso das comunidades periféricas, muitas vezes consideradas violentas, o que faz com que os trabalhadores não queiram lecionar nessas regiões. É necessário, aponta, a ação do Estado com políticas públicas em diversas áreas para garantir o acesso aos direitos para os moradores dessas comunidades.

O portal para atividades de formação docente, destaca, não deve se restringir ao ambiente tecnológico. “A gente sabe que estamos em processo de desenvolvimento tecnológico intenso. Mas quando a coisa se restringe ao tecnológico, fica sem a complexidade da vida. Simulações em plataforma não abarcam a abrangência que há na vida da escola. Como será esse processo formativo?”, questiona.

Por fim, as ações de reconhecimento da importância social dos docentes, por meio de parcerias com outros ministérios e órgãos públicos, previstas no programa Mais Professores, de acordo com Fabio, são importantes no sentido de não ir ao encontro do pensamento de que “a escola é detentora da sociedade, que tudo vai dar certo a partir dela”. “As pessoas falam muito, por exemplo, em violência na escola, mas a questão é que nossa sociedade é violenta e isso reverbera na escola. Tivemos seis anos de negacionismo da ciência, e qual é o lugar da ciência? A escola, que é refém de uma sociedade de ódio, de violência”, diz. A participação de outros ministérios e órgãos públicos, contudo, não podem tirar o protagonismo da escola no processo educacional, defende Fábio.

Políticas estruturantes

Em nota, o Sindiupes se posicionou sobre o Mais Professores, afirmando que é uma iniciativa que “ainda se mostra insuficiente para mudar a realidade do magistério e da escola básica pública no Brasil”. O sindicato destaca a pesquisa anual Education at a Glance, da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), que aponta que o investimento per capita na educação básica brasileira é o terceiro pior entre os países em desenvolvimento e que possuem melhores resultados no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa).

Ainda segundo o Sindiupes, em 2023, o conjunto das redes públicas no Brasil investiu cerca de R$ 17,7 mil anuais por aluno, contra R$ 158,2 mil em Luxemburgo, R$ 103,9 na Suíça e R$ 99 mil na Bélgica. “Como consequência direta do baixo investimento per capita na educação básica, o Brasil também se posiciona há décadas nas últimas colocações da pesquisa da OCDE em relação aos salários de professores que atuam no nível básico. Sendo que, em nível nacional, os profissionais do magistério das redes básicas (primária, fundamental e secundária) recebem quase 15% a menos que os demais profissionais de outras categoriais (não professores)”, diz o sindicato.

A entidade sindical prossegue dizendo que “à luz desse cenário, as implicações sobre os investimentos na educação básica e a forma de gestão das escolas se colocam como questões a serem enfrentadas também para superar o processo de desvalorização dos profissionais da educação”.

O sindicato defende que a recente alocação de até 10% da complementação da União ao Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) para expandir a oferta de matrículas em tempo integral, “embora seja política meritória, exigiria investimentos extras ao invés de retirar recursos destinados a pagamentos de salários e outras ações com manutenção e desenvolvimento do ensino das redes escolares”. Outra questão, aponta o Sindiupes, refere-se à estrutura do novo arcabouço fiscal, “no qual as receitas educacionais da União estão submetidas e comprimindo os investimentos em todas as áreas sociais”. Segundo o sindicato, “a prevalecer este modelo, a meta 19 do PL 2.614/2023 (próximo Plano Nacional de Educação), que prevê a reedição da atual meta 20 do PNE para alcançar o investimento equivalente a 10% do PIB na educação pública na próxima década, restará totalmente inviabilizada”.

O sindicato aponta como uma das saídas taxar os super ricos e baixar a taxa de juros Selic. “Outro ponto grave é a expansão da privatização da escola pública no Brasil, que além de desviar recursos públicos para o empresariado educacional e de desvirtuar a gestão pública e democrática da educação, mina a capacidade de valorização dos profissionais da educação, induzindo políticas estéreis de bonificações e contratos de trabalho sem concurso público e com baixos salários”.

O Sindiupes destaca que não se pode perder de vista que “a atração da juventude para a profissão docente perpassa necessariamente em garantir bons salários e carreiras dignas aos profissionais, além de outras políticas estruturantes, a exemplo de financiamento compatível, garantia e valorização do piso salarial nacional para todos os profissionais da educação, ingresso profissional nas carreiras públicas da educação mediante concurso público, descompressão dos planos de carreira e cumprimento das jornadas extraclasse para professores, além de segurança e condições pedagógicas para o trabalho escolar”.

De acordo com o Sindiupes, 54% dos docentes das redes estaduais estão em contratos precários, sem estabilidade ou a garantia do piso do magistério. O piso, hoje, é de R$ 4.867,77. No Espírito Santo, segundo o diretor de Comunicação do sindicato, Paulo Loureiro, levando-se em consideração que a legislação estabelece o pagamento do piso a partir dos profissionais que cursaram o magistério, nenhum município capixaba paga o piso, pois as gestões municipais levam em consideração que deve ser pago somente para quem tem, no mínimo, graduação.

No que diz respeito a algumas ações práticas do Mais Professores para os atuais membros do magistério, segundo o Sindiupes, a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE) “vislumbra desafios imediatos que consistem na liberação dos docentes para acessarem os cursos de formação continuada e de pós-graduação, dado que esta tem sido uma luta antiga e permanente em quase todas as redes de ensino”.

Outro desafio, aponta, será “garantir a adesão dos entes públicos à prova nacional do Ministério da educação [MEC] para contratação efetiva de professores. Neste sentido, e para que essas ações sejam efetivadas, a CNTE propõe ajustes no programa de maneira a condicionar repasses do Vaar-Fundeb e de outros convênios voluntários do MEC à adesão dos entes estaduais, distrital e municipais a essas e outras políticas de valorização dos profissionais da educação”, defende o sindicato.

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