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Sedu arquiva denúncia de homofobia contra diretor de escola estadual

Joatan Nunes aponta equívocos na investigação e argumentos frágeis no parecer da Corregedoria

Arquivo Pessoal

A Secretaria de Estado da Educação (Sedu) determinou o arquivamento da denúncia de homofobia e perseguição feita pelo professor Joatan Nunes Machado Junior contra Paulo Eduardo Frinhani, diretor da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio (EEEFM) Oscar de Almeida Gama, localizada em Araraí, zona rural de Alegre, região do Caparaó, onde ele trabalhava no ano letivo de 2021.

A decisão, tomada pelo secretário Vitor de Angelo, atende à recomendação do parecer da Corregedoria da Sedu, emitido dia 8 de fevereiro. No documento, a corregedora, Edna Cristina Pancieri Guilherme, afirma “inexistir evidências da materialidade no cometimento de infração disciplinar”.

A decisão foi recebida sem surpresa pelo professor, que aponta equívocos sobre os fatos investigados pela Corregedoria e argumentos frágeis em favor do denunciado. Primeiramente, ele chama atenção para o que o parecer da corregedora chama de “Fato 01” em seu parecer. Literalmente, o documento o descreve assim: “O denunciante alegou que trabalhou na EEEFM Oscar de Almeida Gama no biênio de 2020/2021, e ao ter seu contrato de trabalho encerrado, o diretor não o renovou, sob a alegação de que queria renovar a equipe, sem nenhum critério objetivo e sem observar as disposições da Portaria nº 059-R, de 02/04/2018”.

“Eu nunca questionei isso”, afirma Joatan, explicando que sua reclamação não era contra a não renovação do contrato, mas contra uma suposta manobra que o diretor teria engendrado para impedir que ele pudesse concorrer a um novo contrato de Designação Temporária (DT), já que o contrato em curso realmente impedia renovação. Essa, inclusive foi a reivindicação noticiada em Século Diário à época.

Outra falha importante do parecer, apontada pelo professor, está na forma como a Corregedoria da Sedu aceitou a negativa do diretor em responder à pergunta sobre quem teria proferido ameaças contra Joatan, por estar incomodado com o fato dele, eventualmente, usar saias longas para trabalhar na escola. O tema é tratado no chamado “Fato 04” do parecer.

O documento relata que a ameaça também havia sido registrada na delegacia pelo professor em março de 2021 – Boletim Unificado nº 44475916  -, instantes após o ocorrido.

Segundo consta no BU, informa o parecer, Paulo Frinhani interpelou Joatan na sala dos professores, na ocasião, para dizer que um pai estava incomodado com suas vestimentas e iria fazer um motim para retirá-lo da escola. Questionado por Joatan sobre quem havia feito a ameaça, Frinhani disse que não iria falar, pois era um assunto “de homem para homem”, e contou ainda sobre uma ocasião anterior, em que um pai havia chegado armado na escola, por estar insatisfeito com atitudes de um outro professor. Em depoimento na delegacia, prossegue o parecer, ainda citando o BU, o diretor deu outra versão: “ouvido pela autoridade policial, [Frinhani] disse ter sido questionado pela mãe de um aluno se era permitido que um professor usasse saia no ambiente escolar”.

À Corregedoria, o diretor reafirmou ter se tratado de uma fala “informal” de uma mãe, na rua. O parecer registra ainda a posição do professor ameaçado: “na ausência de indicação de um agressor, a culpa recairia sobre o [diretor] denunciado”. No entanto, para a corregedora, “dos elementos de informação juntados ao processo, não restou evidenciada essa tese”.

Os elementos, segundo se extrai da leitura do documento, incluem a afirmação, por parte de outros servidores da escola – foram realizadas oitivas com outras cinco pessoas, além do diretor – de não terem presenciado qualquer atitude de preconceito ou discriminação por parte do diretor contra o professor.

A Corregedoria ignora, no entanto, que alguns servidores concordaram com a tese de Joatan, de que a ausência de indicação dos autores da ameaça fazia-se supor que o incômodo com as roupas do professor era do próprio diretor. Uma das pessoas a apontar nessa direção foi a ex-coordenadora Ligia Machado, que também concedeu entrevista a Século Diário na época.

“Em depoimento, a coordenadora Ligia Machado apontou que o professor Joatan usava saias de forma costumeira, tanto na escola quanto na comunidade, mas, como coordenadora escolar, nunca recebeu questionamentos a respeito da vestimenta do professor e, em relação aos fatos noticiados, acredita que a preocupação externalizada pelo diretor escolar, tratava-se, na verdade, de um incômodo pessoal”, afirma o parecer.

Na reportagem, Ligia conta também como entendeu a não prorrogação do seu contrato – o contrato dela permitia renovação, ao contrário do de Joatan – no final de 2022, como uma forma de retaliação à sua amizade a Joatan.

“Nós saímos da escola sem resposta plausível por parte do diretor. Não havia motivo para não prorrogar os contratos. Toda a equipe teve nota 100 na avaliação, a melhor 9…) “Todo mundo que era próximo ao Joatan foi prejudicado. Ele deu a entender que simplesmente não queria mais ter na escola, este ano, todas as pessoas que eram próximas dele, que eram amigas dele, que o apoiavam. E sem motivo. Joatan tinha excelente relação com a comunidade e, na escola, o trabalho dele não tinha qualquer reclamação ou ressalva, foi também muito bem avaliado, nota 100”, descreveu, na época.

Na delegacia, Joatan conta que o processo ainda não teve desfecho. Seu desejo é de que o caso seja judicializado. “Todo cidadão que tiver seus direitos violados deve levar para a Justiça e ir até o final. Porque os órgãos públicos, pelo que estamos vendo, não estão conseguindo garantir as devidas responsabilizações. Eu gostaria muito que a Justiça julgasse o caso. As pessoas precisam ser responsabilizadas por seus atos, principalmente um diretor de escola que lida com vidas diversas e precisa ter essa habilidade de mediar conflitos e não causar mais conflitos e a responsabilidade moral e civil de atender a todos os grupos, sem discriminação”.

Sobre a falta de surpresa com o resultado do parecer, Joatan cita uma fala que diz ser recorrente por parte do seu ex-diretor. “Nas reuniões com os professores, ele sempre frisou, para impor suas regras de maneira autoritária, que era amigo particular do governador”, diz.

Apesar do descrédito atual com a chamada esfera administrativa, neste caso representada pela Sedu e sua Corregedoria, o professor também anseia por mudanças. “Temos nossa luta por representatividade nesses cargos, para que as pessoas entendam o que é homofobia”.

Outra pauta é a eleição direta para diretores. “O que me incomodava muito é que, enquanto gestor, eu via muitas falhas na forma dele lidar com a diversidade, ouvia palavras machistas e me perguntava: como esse homem foi escolhido para estar nesse lugar? Que processo seletivo é esse que escolhe uma pessoa tão despreparada? Quem está no ‘chão de escola’ somos nós, professores, portanto sabemos quem está apto a assumir os cargos de gestão. O secretário está em Vitória, não conhece a realidade. Ele só sabe dos números”, argumenta.

Na atual escola onde trabalha, Joatan afirma que o contexto é, felizmente, bem diferente. “Temos uma diretora que entende sobre diversidade, sobre uma escola plural. É outra realidade. Existem gestores democráticos e conscientes de sua responsabilidade social. Eu continuo usando as mesmas saias e até evoluí, coloco vestidos de vez em quando. E não tem nenhum problema, porque os pais conseguem perceber o profissionalismo”, declara.

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