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Ufes aceita recurso e estudante é aprovado em projeto de Iniciação Científica

Recurso foi feito pelo orientador, Douglas Ferrari. Reprovação foi considerada capacitismo

O comitê de avaliação aceitou o recurso feito pelo professor do Centro de Educação (CE) da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Douglas Ferrari, que questionou a reprovação do estudante André Luís Fazzolo no edital de Iniciação Científica como voluntário. O universitário, que é autista, havia sido reprovado mesmo com nota 5,25, superior à mínima para passar, que é de 5. O aceite do recurso foi explicado, inclusive, com base na pontuação obtida pelo aluno.

André Luís, no projeto apresentado para apreciação do comitê, será orientando de Douglas, que tem deficiência visual. Ele é estudante de História e sua proposta de pesquisa é sobre a educação voltada para os cegos nos séculos XVIII, XIX e XX e a trajetória do Instituto Benjamim Constant (IBC). Ligado ao Ministério da Educação (MEC) e criado por Dom Pedro II, o IBC é uma instituição de ensino voltada para pessoas com deficiência visual.

A reprovação de André Luis foi considerada um ato de capacitismo, o que motivou duas manifestações nessa quarta-feira (31), sendo uma às 13h, no prédio da Reitoria, e outra às 18h, no Restaurante Universitário (RU). Douglas aponta que o aceite do recurso faz com que a universidade atenda ao edital e “faça justiça ao aluno”. Ele informa, ainda, que solicitou à Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (PRPPG) que as avaliações parcial e final da pesquisa a ser desenvolvida pelo estudante não sejam feitas pelas mesmas pessoas que avaliaram seu projeto. “Se forem as mesmas, vai permanecer o problema”, destaca.
O comitê avaliador, informa André Luis, afirmou que a escrita do projeto apresentava problemas quanto à norma culta, não contemplava as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) no objetivo geral, e está na primeira pessoa do singular, “levando a crer que o estudante não tem orientador”.

A estudante Kael Miguel Lopes, integrante do Coletivo Neurodivergentes, que atua em defesa dos direitos de neuroatípicos e Pessoas com Deficiência (PCDs) na Ufes e organizou as manifestações, avalia que o fato de André Luís ser autista foi determinante para sua reprovação. De acordo com ela, muitas pessoas neuroatípicas têm dificuldade na escrita, portanto, a universidade deveria disponibilizar tanto para o estudante quanto para seu orientador, que tem deficiência visual, uma monitoria para auxiliar na elaboração do texto.

A notícia do aceite do recurso foi dada por Douglas durante o ato realizado no prédio da Reitoria. O docente externa sua felicidade ao perceber que hoje existe um grupo dentro da universidade que luta pelos direitos das PCDs. Para ele, é uma garantia de que sua luta terá continuidade, pois está há 26 anos defendendo essa pauta na instituição de ensino.


Douglas afirma que
 saiu da Ufes nessa quarta “muito feliz, esperançoso, contrastando com o que estava sentindo todos esses dias”, referindo-se aos problemas que enfrentou recentemente, como a reprovação de André Luís; o fato de ter que deixar de dar uma aula por não ter intérprete de libras; e a prisão do estudante Romes Marques Moreira, que é autista e quebrou as vidraças da Pró-Reitoria de Políticas Afirmativas e Assistência Estudantil (Propaes), após solicitar explicações a respeito do não pagamento do auxílio alimentação emergencial para os estudantes, já que o RU estava fechado.
Reivindicações
Entre as reivindicações feitas nas manifestações, está ainda a disponibilização de monitores, tanto na graduação quanto na pós-graduação, de uma monitoria para atuar junto dos alunos e professores com deficiência, inclusive, na escrita dos projetos. As demais dizem respeito ao RU e à Perícia para avaliar se de fato os estudantes podem ingressar na universidade por meio de cotas para PCDs.
No que diz respeito ao RU, os universitários reivindicaram a reabertura do “RUzinho”, um espaço que se encontra fechado e que, conforme apontam, se reaberto diminui o barulho no ambiente, o que é importante para pessoas neuroatípicas. Outras reivindicações foram identificar PCDs e pessoas neuroatípicas com uma coloração diferente no cartão do RU para ter prioridade na entrada no restaurante; disponibilização de pessoas nas portas laterais para possibilitar a entrada dos cadeirantes, já que elas ficam fechadas e é preciso aguardar muito tempo até que alguém apareça para abrir; e distribuição de protetor auricular.
Também constava entre as demandas, no caso de fornecimento de marmitas, possibilitar que os alunos se sirvam, porque algumas pessoas neuroatípicas não comem se um determinado alimento encostar no outro. Ao poder fazer a própria marmita, o estudante, portanto, tem a possibilidade de escolher os alimentos.
Em relação à Perícia, a reivindicação foi que seja feita por especialistas em neurodivergência e que a Secretaria de Inclusão Acadêmica e Acessibilidade (Siac) acompanhe o processo. Essas iniciativas, acreditam os universitários, evitariam problemas como o ocorrido no início do primeiro semestre letivo de 2024, quando a Perícia da Ufes não reconheceu que as estudantes Alice Martins Guedes e Letícia Assunção Ramos são autistas. Após protestos, elas passaram por uma nova Perícia, que reconheceu, mas elas acabaram não podendo efetivar matrícula no curso de Medicina por meio de cotas para PCDs. A alegação da universidade foi de que a quantidade de vagas já estava completa.

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