Em carta aberta aos alunos, instituição apontou consequências dos cortes do governo federal
Alunos de baixa renda que irão ingressar na Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) no próximo semestre letivo não contarão com os auxílios financeiros da Assistência Estudantil. Na manhã desta quinta-feira (10), a instituição capixaba enviou uma carta aberta aos estudantes, informando que o corte de 18,3% do governo federal já produz impacto nos auxílios, principal ferramenta de garantia da permanência de estudantes em vulnerabilidade socioeconômica no ensino superior.
O documento foi assinado pelo pró-reitor de Assuntos Estudantis e Cidadania da Ufes, professor Gustavo Forde. Ele explica a incompatibilidade entre os valores repassados pelo governo federal e a quantidade de pessoas que precisam do auxílio, o público da assistência estudantil.
Segundo a Pró-Reitoria, essa capacidade de alcance caiu significativamente ao longo dos últimos anos. Em 2018, o orçamento enviado pelo governo federal conseguia atender 94% dos estudantes em vulnerabilidade socioeconômica da Ufes. Em 2019, o número caiu para 88%; em 2020 foi para 81%; e em 2021, a projeção é de 67%.
“O atual corte orçamentário de 18,3% na assistência estudantil da Ufes poderá ocasionar, agora em 2021, o não atendimento a cerca de 33% de estudantes pobres e/ou de baixa renda, ou seja, 1/3 dos estudantes em condições de vulnerabilidade socioeconômica”, enfatiza a carta.
A universidade também informou não ter capacidade de conceder novos auxílios pecuniários para além do “Auxílio Permanência Emergencial”, adotado em razão da pandemia e do ensino remoto. Essa resolução converteu os auxílios moradia, transporte e material de consumo e alimentação em uma única bolsa,condicionada ao limite orçamentário do Programa Nacional de Assistência Estudantil.
“Em curto prazo esses cortes e vetos orçamentários, que afetam os recursos da assistência estudantil em 2021, poderão ocasionar um aumento no índice de reprovação e de evasão de grande parte desses estudantes, uma vez que a assistência estudantil impacta positivamente seu rendimento acadêmico”, apontaram.
A carta convoca a comunidade acadêmica a se mobilizar para garantir que o governo federal e o Congresso Nacional estabeleçam a recomposição do orçamento da Assistência Estudantil. Segundo o documento, isso significa “garantir um dos pilares do processo de democratização do ensino superior: a permanência qualificada dos estudantes economicamente pobres nas universidades brasileiras”.
O Diretório Central dos Estudantes (DCE) da Ufes convocou o Conselho de Entidades de Base, que reúne os Centros e Diretórios Acadêmicos da universidade, para uma reunião extraordinária na próxima terça-feira (15), com a finalidade de organizar ações para sensibilizar deputados federais e senadores do Estado sobre a situação.
“Com o Governo de Bolsonaro e Mourão, não há permanência estudantil. Excluem pobres, destroem sonhos. Precisamos reagir fortemente”, declara o coordenador-geral da gestão provisória do DCE, Hilquias Crispim.
O diretório de estudantes também participará das ações contra a vinda do presidente Jair Bolsonaro ao Espírito Santo, nessa sexta-feira (11), e ainda dos protestos contra os cortes na educação, marcados para o próximo dia 19 de junho.
Auxílio e democratização
Os auxílios oferecidos para estudantes de baixa renda na Ufes seguem as diretrizes do Programa Nacional de Assistência Estudantil (PNAES), do Ministério da Educação. A seleção e cadastro dos estudantes a serem atendidos são realizados por meio de editais publicados pela universidade.
Na carta, a Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis enfatiza que, juntamente com a política de cotas, os auxílios foram responsáveis pela democratização do acesso ao ensino superior, possibilitando um novo perfil de alunos na universidade.
É o que também mostra a “V Pesquisa do Perfil Socioeconômico dos Estudantes de Graduação das Universidades Federais”, que identificou que 53,5% dos estudantes dessas instituições possuíam renda de até um salário mínimo, e um total de 70,1% de até um salário mínimo e meio. O estudo foi realizado pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) e pelo Fórum Nacional de Pró-Reitores de Assuntos Comunitários e Estudantis (Fonaprace).
“Aqueles e aquelas que frequentaram alguma universidade pública até o fim dos anos 1990 poderão, empiricamente, confirmar que esse atual perfil de estudantes universitários é uma realidade recente no ensino superior brasileiro”, destaca a carta da Pró-Reitoria.
O acesso e permanência em uma universidade federal se tornaram possíveis para pessoas em vulnerabilidade socioeconômica a partir dessas estratégias de compensação. “Reserva de vagas (cotas) e assistência estudantil são duas políticas de natureza compensatória e de reparação sócio-histórica que visam reduzir as profundas e históricas desigualdades sociais brasileiras de viés étnico-racial, de regionalidade, de gênero, de sexualidade, de classe social e de capacitismo que estruturam a sociedade brasileira”, declara o documento.