Mesmo após anunciar um profundo plano de contenção de despesas já em vigor, que inclui manter desligados os aparelhos de ar-condicionado das salas de aulas, corte em ajuda de custos para viagens e até redução na rotina de limpeza, a Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) projeta um déficit mensal de R$ 2,8 milhões após os cortes que estão sendo realizados pelo Governo Federal nos recursos enviados para as universidades federais.
O reitor da Ufes, Reinaldo Centoducatte, fez o anúncio na manhã desta terça-feira (20), em encontro que reuniu a comunidade acadêmica para discutir o projeto do Ministério da Educação (MEC) Future-se, considerado o início da privatização das universidades federais. Para Centoducatte, a prioridade, no momento, deve ser a discussão dos orçamentos de 2019 e de 2020, questões que já têm causado reflexos no funcionamento das universidades devido aos cortes realizados pelo governo Jair Bolsonaro.
Centoducatte apresentou dados sobre o orçamento da Ufes, mostrando que a previsão orçamentária para a Universidade, em 2019, é de R$ 71 milhões para o custeio, verba direcionada a gastos com manutenção e funcionamento da instituição, como contas de água e energia, e contratos, como os de limpeza e vigilância. O reitor da Ufes explicou que, nos seis primeiros meses de 2019, o Governo Federal manteve a liberação de cerca de 8% do orçamento de custeio, mas, a partir de julho, houve uma redução, e a liberação passou para aproximadamente 5%. Dessa forma, Centoducatte informou que a Ufes tem um déficit mensal projetado de cerca de R$ 2,8 milhões.
O reitor também falou sobre as medidas adotadas para a redução de gastos a partir dos cortes anunciados. “A reversão desse quadro depende um pouco de nós, mas muito do que conseguirmos construir em outros setores da sociedade, com mobilizações. Universidades e institutos federais são um patrimônio da sociedade brasileira”, ressaltou.
O encontro, realizado na Teatro Universitário, foi coordenada pelo Comitê em Defesa da Universidade Federal do Espírito Santo, contando ainda com exposições do presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), João Carlos Salles, e do servidor técnico-administrativo em Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Gibran Ramos Jordão. O debate foi conduzido pelos membros do Comitê em Defesa da Ufes Gustavo Forde e José Antônio da Rocha, que também é presidente da Associação dos Docentes da Ufes (Adufes).
Segundo José Antônio da Rocha, houve expansão recente da Ufes e consequente destaque dos docentes e estudantes no cenário científico nacional e internacional. “Esse crescimento, no entanto, não foi acompanhado pelo devido aporte financeiro. Principalmente a partir de 2014, começaram os cortes e, agora, a crise orçamentária se agrava”, ressaltou. Ele também falou sobre os debates e as ações realizadas pela Adufes: “Não vamos ficar de braços cruzados. Estaremos sempre dispostos a lutar pela Universidade e pela educação pública em todos os níveis”.
Já o coordenador de Imprensa, Esporte e Cultura do Sindicato dos Trabalhadores da Ufes (Sintufes), Lucas Martins, apresentou duas propostas do sindicato para as questões abordadas no debate: “Estamos construindo a campanha SOS Ufes, com a participação de docentes, técnicos-administrativos e estudantes, para a defesa permanente da Universidade, e também propomos a realização de uma sessão pública do Conselho Universitário da Ufes para discussão sobre o Future-se, nos moldes do que foi realizado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)”, disse o servidor.
Corte no orçamento e de bolsas
Além dos cortes de 30% no orçamento previsto para este ano, que têm exigido da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e do Instituto Federal capixaba (Ifes) contenções drásticas de despesas para manutenção do básico, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) já confirmou que irá cortar as bolsas em todo o País por falta de verbas. Com a medida, 80 mil pesquisadores em todo o Brasil vão ficar sem bolsa (e sem sustento, em muitos casos) a partir do mês de setembro, caso o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) não consiga sanar, de imediato, um déficit de R$ 330 milhões no seu orçamento. O rombo é conhecido desde o início do ano, mas até agora não foi resolvido, e o dinheiro acaba — literalmente — nas próximas semanas.
“Vamos pagar as bolsas de agosto normalmente; mas de setembro em diante não tem como pagar mais nada. A folha de agosto, essencialmente, zera o nosso orçamento”, disse ao jornal da Universidade de São Paulo ( USP) o presidente do CNPq, João Luiz Filgueiras de Azevedo.
Nos últimos meses, já haviam sido suspensas as indicações de bolsas especiais e a implementação de novas bolsas ligadas à Chamada Universal de 2018.
O CNPq é a principal agência de fomento à ciência do governo federal, ligada ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). Além de financiar projetos de pesquisa, apoia cerca de 84 mil bolsistas em universidades e institutos de pesquisa de todo o País. A lista inclui desde alunos de Iniciação Científica na graduação, com bolsas de R$ 400, até professores seniores, com bolsas de Produtividade em Pesquisa, de até R$ 1,5 mil por mês.
Para muitos desses bolsistas — em especial, os da pós-graduação e do pós-doutorado — representa muito mais do que um simples apoio à pesquisa. É, na verdade, sua principal fonte de sustento, já que o recebimento da bolsa implica em dedicação exclusiva às atividades de ensino e pesquisa.
A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) lançou nessa terça-feira (13), um abaixo-assinado em defesa do CNPq. O manifesto é apoiado por 65 entidades científicas e acadêmicas, e nas primeiras 24 horas, recebeu mais de 40 mil assinaturas.