Liminar ordenou retorno ao cargo do servidor, que aponta “perseguição” de Enivaldo
Uma disputa judicial estabelecida entre o procurador Raony Fonseca Scheffer Pereira e o prefeito de Barra de São Francisco (noroeste do Estado), Enivaldo dos Anjos (PSB), após ação popular que questionou acordo milionário firmado pela gestão municipal, ganhou um novo desdobramento com a concessão de uma liminar pelo Juizado Especial Cível, Criminal e Fazenda Pública, que ordenou o retorno do procurador às suas funções, afastado por dois meses. O ato foi apontado na decisão como de “dano irreparável ou de difícil reparação”, além de poder pode configurar “medida vexatória”, com ausência do direito ao contraditório e da ampla defesa do servidor afastado.
O caso ocorreu em meio aos trâmites em ação popular movida por Raony contra um acordo firmado entre o município e a empresa Ambiental Urbanização e Serviços Eireli, avaliado em R$ 8 milhões, e aprovado, segundo o procurador, “de maneira apressada e sem a devida transparência”, resultando em um possível prejuízo aos cofres públicos. Raony relata que sua postura crítica em relação ao acordo descrito por ele como fraudulento levou ao seu afastamento, o que caracteriza “perseguição política” por parte do prefeito Enivaldo.
As denúncias de Raony Fonseca começaram em 2017, quando ele, como procurador municipal, apresentou uma contestação contra a empresa Ambiental Urbanização e Serviços Eireli, que havia ajuizado ação cobrando R$ 13 milhões do município. De acordo com a defesa elaborada à época, as dívidas alegadas eram incompatíveis com os valores reais liquidados pelo município, que indicavam apenas R$ 30,8 mil como devidamente empenhados e prontos para pagamento. O procurador ainda apontou que a empresa não havia prestado todos os serviços contratados.
Em 2022, o caso ganhou novos contornos com a aprovação de um acordo judicial entre o prefeito Enivaldo e a empresa, estipulando o pagamento de R$ 8 milhões em 23 parcelas. Raony questionou a legalidade do acordo, que teria sido firmado sem a participação dos procuradores municipais responsáveis pelo caso e ignorando uma perícia técnica anteriormente determinada pela Justiça. Além disso, a aprovação do projeto de lei que autorizava o pagamento foi conduzida na Câmara Municipal em menos de 24 horas, o que ele destacou nos autos como “‘desrespeito ao Regimento Interno da Casa”.
Outro ponto destacado pelo procurador é a suposta relação próxima entre Enivaldo e o ex-juiz Bruno Fritoli Almeida, que teria atuado no processo de “maneira tendenciosa”. Raony afirma na ação popular que eles “mantinham uma amizade íntima, fato que provocou uma atuação parcial do então juiz”, que “passou a impulsionar o feito de maneira absolutamente incomum e tendenciosa”. Em menos de 48 horas após o protocolo do acordo entre a empresa e o município, o ex-magistrado despachou para que o Ministério Público se manifestasse, desconsiderando a necessidade de perícia técnica previamente ordenada, como aponta a ação.
Em agosto deste ano, Bruno Fritoli foi preso na Operação Follow The Money, acusado de corrupção, lavagem de dinheiro, organização criminosa e uso de documento falso. Ele perdeu o cargo de juiz, por decisão do ministro Nunes Marques, do Supremo Tribunal de Justiça (STF). Em novembro, ele conseguiu decisão favorável e foi solto, porém, cumpre medidas cautelares e faz uso de tornozeleira eletrônica.
‘Abuso de poder’
O conflito envolve a ação popular movida por Raony que teve como consequência uma decisão do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), determinando a indisponibilidade de bens da empresa Ambiental Urbanização e Serviços Eireli e a suspensão de pagamentos relacionados ao contrato de R$ 8 milhões.
Pouco tempo após essa vitória judicial, Raony foi afastado do cargo por meio da Portaria nº 677/2024, assinada pela secretária municipal de Administração, Marcella Junia Gonçalves Mendes. O ato foi contestado em uma Ação Declaratória de Nulidade de Ato Administrativo e Reparação por Danos Morais, em que o procurador afirma ter sido “alvo de perseguição política, em virtude de sua atuação na fiscalização e combate à corrupção”.
A recente liminar que determina o retorno ao cargo destaca que “em que pese a previsão legal do afastamento cautelar, é indispensável que tal medida seja adotada apontando os riscos que o servidor possa apresentar para apuração dos fatos que ensejaram a investigação em questão, como por exemplo a destruição de provas, circunstância que não se visualiza nos documentos acostados”. Foi fixada multa de R$ 400 por dia de descumprimento da ordem, até o limite de R$ 3 mil, a ser paga pessoalmente pelo prefeito Enivaldo dos Anjos. Ainda cabe recurso.