Homero Mafra espera ainda para esta semana o julgamento do habeas corpus em favor do militante petista Chico Linhares
“O direito de ir e vir foi proibido pelos manifestantes e fica evidente, aqui, que a ordem democrática está sendo ferida por esses atos, que as pessoas dizem que são pacíficos, mas não são, pois obstruem a livre circulação de pessoas”. A declaração é do advogado Homero Mafra, um dos defensores do militante do PT Francisco Emmanuel Soares dos Santos, o Chico Linhares, 65 anos, preso há 18 dias por furar um bloqueio organizado por grupos bolsonaristas na cidade de Linhares, norte do Estado, no último dia 5, acusado de tentativa de homicídio.
“O Estado tem o dever de desobstruir as vias públicas e existem várias medidas previstas em lei para a prática de atos democráticos”, explica Homero, que aguarda ainda para esta semana o julgamento de um habeas corpus em favor de Chico no Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES). Ele justifica a medida pelo fato de o militante ser “primário, de boa procedência, não existe fundamentação nenhuma para sequer se falar em tentativa de homicídio”.
Ao defender a “total falta de necessidade da prisão preventiva”, o advogado ressalta, no entanto, que não está caracterizado um ato político. “Eu não diria que foi um ato político, mas acho que a prisão e a tipificação feitas pela autoridade foram arbitrárias; eu não consigo enxergar nisso uma tentativa de homicídio. Esse ato, se é que houve alguma conduta, poderia ser considerada como conduzir o veículo embriagado, no máximo, e não daria prisão preventiva”, esclarece.
Esse entendimento é contrário às manifestações da militância de partidos políticos, como o PT, PCB, Partido Verde, Psol e PCdoB, que divulgaram extensa nota de solidariedade a Chico, repudiando a prisão e condenando “a arbitrariedade promovida por agentes públicos de extrema direita (…)”. A nota é assinada, também pelo Sindicato dos Servidores da Saúde Pública no Estado (Sindsaúde-ES), Sindicato dos Trabalhadores e Servidores Púbicos (Sindipúblicos-ES), Associação Brasileira de Juristas pela Democracia, Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Central dos Trabalhadores do Brasil (CTB) e Central Única dos Trabalhadores (CUT).
“As entidades e pessoas abaixo assinadas prestam total solidariedade ao lutador social Chico Linhares, diante da prisão arbitrária que o mesmo sofreu, quando furou bloqueio de via pública, buscando seu direito de ir e vir. Obstrução de vias públicas fere o direito de circulação estampados na Constituição e legislação ordinária em vigor. Além de ilegais, os atuais bloqueios descumprem ordem expressa do ministro presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes”, diz o texto.
Mais adiante, aponta que “desde o resultado das eleições presidenciais, manifestantes descontentes com o resultado têm se reunido em frente a quartéis e fechando vias públicas, defendendo pautas antidemocráticas, como intervenção militar”.
E destaca: “Neste momento em que a atual conjuntura política ataca sistematicamente o Estado Democrático de Direito, procurando por todas as formas descaracterizar o resultado das urnas e construir os alicerces para um golpe com intervenção militar, torna-se mais que evidente a necessidade de uma união das forças democráticas para enfrentar esse ataque e defender veementemente a legitimidade do resultado das urnas”.
A nota classifica a prisão como “arbitrariedade promovida por agentes públicos de extrema direita, se utilizando de sua função estatal para criminalizar cidadãos, lutadores sociais que cumprem a lei e não se curvam a fascistas”, e aponta como “inaceitável que a autoridade judicial tenha atendido ao pedido do Ministério Público para transformar a prisão em flagrante em prisão preventiva”.
Para a militância, não se sustenta a “alegação de que houve tentativa de homicídio, sem que a rigor, nenhum dos requisitos para a tipificação desse crime se fizessem presente no episódio. Não havia intenção de matar alguém, ninguém ferido, nenhum vestígio no veículo que indicasse ter atingido algo ou alguém”.
A nota conclui exigindo liberdade imediata para Chico Linhares e pede que “sejam criminalizados todos que participam do fechamento de vias públicas com pedidos antidemocráticos e impedindo o direito de ir e vir de cidadãos, bem como pedimos a responsabilização das autoridades que permitem que tais atos continuem ocorrendo”.
O caso
A prisão de Chico Linhares foi efetuada após furo a um bloqueio em via pública mantido por grupo bolsonarista em Linhares, sendo confirmada pelo juiz Tiago Favaro Camata, da 1ª Vara Criminal, que rejeitou a argumentação da defesa, apresentada pela advogada Alciene Maria Rosa, e acatou a acusação de tentativa de homicídio do Ministério Público Estadual (MPES). Chico está na Penitenciária Regional, no bairro Laguna.
Nos autos, a promotora Luziany Albany Scherrer diz que que Chico “tentou matar as vítimas Thainan Labibi Andrade Mendes e Gabriel de Oliceira Guzzo, somente não consumando o crime por razões alheias à sua vontade, eis que as vítimas conseguiam desviar do automóvel, bem como conduziu o veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência do álcool”.
Para a defesa de Chico, “policiais militares foram ao local, arrolaram testemunhas, supostas vítimas, e confeccionaram um Boletim Unificado (BU), no qual a ação de Chico ao volante foi caracterizada como tentativa de homicídio, embora não haja pessoas feridas nem o carro apresente amassados na lateria ou outro local”.
A ocorrência foi conduzida pelo policial militar Rodrigo Bonadiman, o cabo Bonadiman, conhecido apoiador de Jair Bolsonaro e candidato derrotado a deputado federal pelo PL nas últimas eleições.