Fotos: Leonardo Sá e Facebook
A eleição para a diretoria da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), seccional Espírito Santo, prevista para a segunda quinzena de novembro deste ano, já movimenta a categoria e levanta questionamentos sobre a atual gestão da entidade, liderada pelo advogado Homero Mafra, que está no seu terceiro mandato.
Os advogados André Moreira e Francisco Celso Calmon, respectivamente, candidato ao governo do Estado pelo Psol, partido do qual é presidente no Espírito Santo, e ativista político, afirmam que nos últimos anos a OAB nacional alterou os princípios que serviram de base à sua criação.
“A OAB perdeu muito do respeito que teve no passado, ao mesmo tempo em que a advocacia perdeu seu prestígio, sendo especialmente atingida pelo desrespeito sistemático às nossas prerrogativas pela tirania da toga”, resalta André (foto à esquerda).
No Espírito Santo, segundo ele, essa situação não é diferente, e sim mais grave. André Moreira relembra a primeira eleição do atual presidente da Ordem e aponta resultados negativos.
“A eleição de 2009 teve como resultado a perda da importância da Comissão de Direitos Humanos, reconhecida por sua combatividade ante as constantes violações de direitos humanos pelo Governo Hartung, e o silenciamento do Conselho Seccional sobre a Operação Naufrágio, que buscava investigar esquemas de corrupção no Judiciário capixaba”.
Além disso, lembra Francisco Celso Calmon (foto à direita), Homero não só orientou a seccional capixaba a se posicionar pelo impedimento da legítima presidenta Dilma, como se promiscuiu na atuação da presidência do Conselho Seccional capixaba com o governo estadual, sendo por vezes uma correia dos interesses do Executivo.
“Mas não parou por aí, colocando seus interesses particulares à frente da imagem e respeitabilidade da instituição. Usando do cargo em benefício de interesses pessoais e profissionais, ocasionando, inclusive, noticiário desairoso na mídia e nas redes sociais, atingindo a dignidade do cargo, pela qual deveria zelar”.
Os advogados fazem um apelo: “É preciso reconquistar a OAB para a advocacia e para a sociedade. A Ordem deve deixar de ser um condomínio familiar hereditário, uma ação entre amigos, para ser a entidade respeitada por sua atuação em favor dos direitos fundamentais, da democracia, dos princípios republicanos e, sobretudo, da lisura ética da atuação de sua presidência”.
Atribuições institucionais
Para eles, a OAB, no Brasil, é a única instituição representativa de profissão com atribuições institucionais e, no mundo, não há outra entidade de representação da advocacia com o mesmo status constitucional. A responsabilidade do advogado é dupla, para com o seu cliente e com o Estado Democrático de Direito.
“A Constituição Federal ergue a advocacia e o Ministério Público a funções essenciais para a Justiça. Aos advogados, assegura papel indispensável à administração da Justiça e a inviolabilidade por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”, assegura André Moreira.
O advogado lembra as origens da instituição, para afirmar que “as atribuições da OAB e o grau de respeito pela instituição e pela profissão não foram uma dádiva”, o que significa sacrifício enfrentado com coragem para se opor e não audácia para servir, desde a sua fundação, em 7 de agosto de 1843, com o Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), inspirado na Ordem dos Advogados de Portugal, criada cinco anos antes.
Somente em 18 de novembro de 1930, o decreto presidencial de Getúlio Vargas, de nº 19.408, autorizava a criação da OAB no País. “Em seu art. 103, VII, a Constituição atribui legitimidade ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil de propor, perante o Supremo Tribunal Federal, ação direta de inconstitucionalidade e ação declaratória de constitucionalidade, portanto, é cristalino que a OAB participe, em paridade com o Poder Público, na provocação do controle direto de constitucionalidade da ordem jurídica infraconstitucional”.
Ele aponta, ainda, que o advogado inviolável constitui pilar do Estado Democrático de Direito. De forma que, à luz da Carta Magna, a Lei nº 8.906/94 – Estatuto da Ordem – define as suas finalidades: defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos e a justiça social; pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas; promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil.
“A construção de uma sociedade justa, livre e solidária é um dos objetivos fundamentais de nossa República Federativa (art. 3º CF), norteando, pois, na solução civilizada das lides. A Ordem tem por dever constitucional pugnar permanentemente pelo cumprimento desse objetivo maior”.
Mas, isso também não ocorreu ocasionalmente, como destacam. “O modelo institucional da OAB, seu sistema eleitoral indireto, sua eleição sem regras nem limites de gastos, por isso, cada vez mais onerosa, importou na elitização dos órgãos da instituição e, consequentemente, no afastamento dela daqueles objetivos institucionais que a engrandeciam. O mercantilismo engoliu a dignidade”.
Política partidária
No atual mandato de Mafra, afirma André Moreira, a atuação do Conselho Federal foi deslocada da política institucional, prevista no Estatuto da OAB, para a política partidária.
Cláudio Lamachia, que movimentou toda a Ordem em favor do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), ressalta o advogado, segue calado diante das múltiplas denúncias de corrupção contra o governo Michel Temer (MDB), bem como diante do sequestro dos direitos da classe trabalhadora, em afronta ao artigo terceiro da Carta Maior, e da inobservância ao devido processo legal e ao princípio constitucional da presunção da inocência até o trânsito em julgado.
“Hoje, a OAB, destituída daquela envergadura moral, perdeu sua capacidade de intervir positivamente na política para garantir seus compromissos institucionais e não se presta mais sequer à defesa das nossas prerrogativas profissionais que, ao cabo, são instrumentos daqueles compromissos, sobretudo a garantia da democracia, que é condição inafastável para o livre exercício da advocacia”, lamentam André Moreira e Francisco Celso Calmon.