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‘Antes da manifestação acabar, já tinha um mandado de prisão contra ele’

Presidente da ocupação Vila Esperança denuncia perseguição após prisão de jovem

Reprodução

Após ter sido preso durante o protesto por moradia realizado na manhã dessa terça-feira (25) na Prefeitura de Vila Velha, o morador da ocupação Vila Esperança, João Otávio Silva Lessa, um jovem de 18 anos, diagnosticado com autismo e transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), sob a alegação de ter agredido uma funcionária pública, terá uma audiência de custódia por videoconferência nesta quinta-feira (27). A detenção tem sido contestada pelos moradores da ocupação, familiares e movimentos sociais, que denunciam que o jovem foi alvo de perseguição do prefeito Arnaldinho Borgo (Podemos). 

A presidente da ocupação, Adriana Paranhos, a Baiana, ressaltou que, ao chegarem à delegacia, foi observado que uma secretária da prefeitura já estava no local, o que gerou estranhamento. Além disso, segundo ela, o delegado que cuidou do caso se recusou a considerar os laudos médicos do jovem. “O prefeito tem uma implicância com ele desde o ano passado, porque o João integra um movimento de juventude da região de Terra Vermelha e fazia enfrentamentos e denúncias em comícios durante a campanha eleitoral”, afirmou. 

O pai do jovem, Paulo Lessa, explica que o filho enfrenta dificuldades sensoriais devido ao autismo e ao TDAH, o que pode ter resultado em uma agitação no momento do tumulto. No entanto, ele nega que o filho tenha agredido alguém. “A prisão dele foi injusta, porque não tinha motivo para levarem só ele. Foi uma perseguição por ele estar lutando pela causa da moradia”, reforçou. 

Para a presidente da ocupação, Adriana Paranhos, a detenção de João Otávio foi premeditada. “Antes de terminarmos a manifestação, já havia um mandado de prisão contra ele”, afirmou. Segundo ela, a acusação de agressão à funcionária se deu em função de um tumulto gerado quando os manifestantes entraram na prefeitura. “A porta estava aberta e a Guarda Municipal tentou fechá-la para impedir a entrada dos moradores. No meio desse tumulto, uma funcionária caiu, mas não foi o João que provocou a queda”, explicou. 

Os manifestantes ressaltam que o protesto foi pacífico e tinha como único objetivo um diálogo direto com o prefeito Arnaldinho Borgo, apontado como responsável por ter aberto caminho para que a Justiça Estadual emitisse a reintegração de posse, ao revogar o decreto de 2020 do então prefeito Max Filho (PSDB), que declarava a área como de interesse social, o que permitiria a desapropriação do terreno para fins habitacionais. Com a anulação da decisão, a Justiça deu ordem de reintegração de posse para esta sexta-feira (28), o que deixou as famílias em extrema vulnerabilidade, diante da falta de soluções para garantir moradia digna. 

A comunidade da ocupação Vila Esperança, consolidada há nove anos na região de Jabaeté, tem travado uma luta pela permanência no terreno onde vivem. Os manifestantes foram até o prédio da administração municipal para exigir um diálogo direto com Arnaldinho, no entanto, ele se recusou a conversar com a comunidade. Representantes da administração pediram que uma comitiva fosse formada para ser recebida por um secretário e um assessor, enquanto os demais deveriam deixar o prédio. A equipe da prefeitura, porém, não discutiu soluções concretas para as famílias e se ateve a garantir que o protesto fosse dispersado para retomar a rotina do prédio, relatou um dos moradores da ocupação, Josué Santos. 

Enquanto a reunião ocorria, os moradores permaneceram em frente à prefeitura, entoando palavras de ordem como “Construir para morar, resistir, ocupar” e “Nossos direitos vêm, nossos direitos vêm. Se não vêm nossos direitos, o Brasil perde também”. Ao fim da reunião, quando os manifestantes começavam a se dispersar para retornar à ocupação, foram cercados pela Polícia Militar e pela Guarda Municipal, que utilizaram spray de pimenta contra os moradores e realizaram a prisão de João. 

Josué criticou a violência empregada pelos agentes na ocasião e considera que a ação da prefeitura representa uma criminalização da pobreza, pois apesar de terem realizado um protesto pacífico, os moradores foram tratados como criminosos. Ele reforça que o testemunho de uma policial militar presente na manifestação confirmou que o protesto foi pacífico e não houve agressão nem dano ao patrimônio público, conforme afirmou a agente em entrevista a um telejornal.

Adriana também criticou a demora no processo de depoimento do jovem, que se estendeu por mais de três horas. “O João já estava na lista do prefeito. Era réu primário, tinha que ter saído ontem [terça-feira, 25], não tinha motivo para manterem ele preso. Mas não, eles o atuaram, demoraram para fazer o depoimento, e recusaram ver os exames médicos e laudos dele”, afirmou. 

A expectativa da família e dos moradores da ocupação, que aguardam a audiência de custódia de João Otávio, é de que a Justiça conceda a liberdade ao jovem, para que ele retorne à comunidade. Enquanto isso, a ocupação Vila Esperança segue mobilizada para impedir a remoção determinada pelo TJES.

‘Insuficiente e insultante’ 

Em nota oficial divulgada no dia do protesto, o prefeito Arnaldinho Borgo reafirmou sua posição contrária à ocupação e defendeu a remoção das famílias, dizendo que “Vila Velha não aceita mais ocupações irregulares”. “As identificadas pela prefeitura e passíveis de regularização, o município está trabalhando para que isso ocorra. Neste exato momento, estamos construindo 280 moradias sociais para acolher famílias em vulnerabilidade social. E temos mais programas de habitação social que serão iniciados. Chega de grilagem de terra e manipulação das famílias de bem de Vila Velha por meio de informações falsas”. 

Em resposta, a comunidade publicou uma nota de repúdio em suas redes sociais: “Prezado Prefeito Arnaldinho Borgo, estamos tentando diálogo com você e com a gestão municipal há bastante tempo. Se você realmente se preocupa com a moradia das pessoas, como insiste em dizer, mesmo se recusando a dialogar, por que retirou a área de Vila Esperança da classificação de interesse social? E por que não apresentou nenhuma solução concreta para as 800 famílias e mais de 500 crianças que estão prestes a ficar sem lar?”. 

O documento prossegue: “muito se fala sobre acabar com as moradias irregulares em Vila Velha. Sendo assim, quando a prefeitura vai acabar com as moradias irregulares do Morro do Moreno? Queremos saber por que a política pública é seletiva e segue prejudicando o povo mais vulnerável. A oferta de 280 moradias para mais de 800 famílias é insuficiente e insultante. Vila Esperança exige respostas concretas e soluções eficazes para a crise habitacional. A comunidade merece respeito e dignidade!”, defende a comunidade. 

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