Projeto foi criticado por cargos comissionados e falta de convocação de concursados

A Assembleia Legislativa aprovou em regime de urgência, nesta segunda-feira (14), o Projeto de Lei Complementar (PLC) 194/2025, que promove alterações em quatro legislações que tratam da estrutura organizacional e administrativa do Tribunal de Justiça do Estado (TJES). A aprovação ocorreu sob críticas à criação de 50 novos cargos comissionados, especialmente no momento em que ainda há aprovados no último concurso público que aguardam nomeação. A votação teve 21 votos favoráveis, um contrário, da deputada Camila Valadão (Psol), e uma abstenção, do presidente da Casa, Marcelo Santos (União).
Encaminhada pelo presidente do TJES, desembargador Samuel Meira Brasil, a proposta altera dispositivos das Leis Complementares nº 566/2010, nº 234/2002, nº 788/2014 e da Lei Ordinária nº 7.854/2004, com o argumento de modernizar a estrutura do Judiciário. Em sua justificativa, o magistrado destaca “a necessidade de fortalecimento da área de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC)”, que defende como sendo essencial para a modernização e eficiência da prestação jurisdicional.
Na semana anterior à aprovação, representantes do Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário do Espírito Santo (SindjudES) procuraram os parlamentares para solicitar o adiamento da votação, devido à falta de diálogo com a categoria e ao tempo insuficiente para analisar o projeto. Segundo os deputados, as lideranças sindicais criticaram a criação de cargos comissionados enquanto há aprovados em concurso público ainda não nomeados.
A matéria aprovada cria 50 novos cargos comissionados de assessor de juiz; e transforma a atual Secretaria de Tecnologia da Informação em Secretaria de Tecnologia da Informação e Comunicação, com ampliação da estrutura e criação do Laboratório de Inovação e Inteligência Artificial. Também estão previstas a criação de coordenadorias especializadas nas varas Criminais, de Família, de Execuções Penais e de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, além de uma seção específica voltada à Ouvidoria da Mulher.
Essas mudanças, afirma o Tribunal, “são parte da estratégia de adequação à transformação digital da Justiça, com implantação de processo eletrônico, uso de inteligência artificial e reforço da segurança cibernética”. O projeto também busca atender a uma meta do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) relacionada à estruturação das unidades judiciárias de 1º grau.
Entre os principais pontos de crítica, estão a ausência de debate público; a burocratização no acesso ao Judiciário; a preocupação com unificações de secretarias e com o avanço das comarcas digitais; e o afastamento do Judiciário das necessidades reais da população.
Durante a tramitação, duas emendas foram apresentadas pelos deputados João Coser (PT), Iriny Lopes (PT) e Camila Valadão (Psol). A primeira previa a reserva de pelo menos 20% dos cargos comissionados para servidores efetivos, com base em recomendações do CNJ. A segunda modificava o percentual de gratificação de determinadas funções. Ambas foram rejeitadas pelo relator do projeto nas comissões de Justiça e Finanças – a matéria foi analisada em conjunto -, deputado Mazinho dos Anjos (PSDB). Ele apontou que “as alterações propostas nas emendas não são de competência da Casa. Cargos comissionados são de livre nomeação e exoneração, e o impacto financeiro das mudanças inviabiliza a aprovação”.
Camila e João Coser (PT) defenderam as emendas, ressaltando que foram construídas em diálogo com o sindicato dos servidores e que representam tentativas de garantir a valorização dos efetivos e maior transparência. “Um projeto com esse nível de complexidade precisa de mais debate e participação popular. O Judiciário diz respeito a todos nós, e não apenas a juízes e desembargadores. É com a convocação dos aprovados no concurso que vamos conseguir melhorar de fato o atendimento à população e sair dos piores índices de produtividade apontados pelo CNJ”, reforçou Coser.
Ele também destacou a importância de se garantir a presença de servidores efetivos na estrutura administrativa. “O servidor comissionado passa, o efetivo permanece. Garantir especialização técnica é essencial. Era uma proposta para valorizar o trabalho de quem sustenta a Justiça capixaba”.
Outra manifestação de preocupação com a defasagem de efetivos e a ausência de previsão de convocação dos concursados foi feita por Wellington Callegari (PL). “Reconheço o esforço de modernização, mas a base do Judiciário são os servidores efetivos. Há déficit nas comarcas e isso precisa ser resolvido”, pontuou.
Modificações
A recém-estruturada Secretaria de Tecnologia da Informação e Comunicação terá, agora, quatro coordenadorias — o dobro das existentes atualmente —, organizadas em diversas seções específicas. Para cada função de chefia dessas seções, será criada uma função de apoio: a de assistente de chefia de seção. Esta será ocupada por servidor efetivo, que receberá gratificação correspondente a 32% do salário base do cargo de técnico judiciário (padrão 5, classe V, nível 1).
Será instituído um Laboratório de Inovação e Inteligência Artificial, supervisionado por um desembargador escolhido pelo Tribunal Pleno e contará com um juiz coordenador. A proposta é que o laboratório funcione como um polo de ideias e soluções voltadas à modernização do sistema judiciário, em sintonia com a crescente digitalização dos processos.
Haverá também uma redefinição da supervisão dos Juizados Especiais, que passará a ser exercida por um único desembargador. A nova coordenação será formada por um juiz atuante na área ou com comprovada experiência no sistema dos Juizados Especiais, com atribuições estabelecidas pelo supervisor. Atualmente, três juízes compõem a coordenação.
Outras três coordenadorias — das Varas Cíveis, da Infância e Juventude e das Varas Penais (renomeadas para Varas Criminais) — passarão a contar com apenas um juiz, em vez de dois. As novas coordenadorias, como as de Varas de Família, de Execuções Penais e de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, surgem com essa nova estrutura: um desembargador e um juiz.
A legislação passa a incorporar formalmente a Ouvidoria da Mulher, instituída anteriormente por resolução do Tribunal de Justiça. A preferência é que o cargo de ouvidoria seja exercido por uma desembargadora eleita pelo Tribunal Pleno para um mandato de dois anos.
O projeto de lei complementar também prevê gratificações especiais: 15% sobre o vencimento do cargo de técnico judiciário (padrão 5, classe V, nível 1) para quem presidir a Comissão Disciplinar Permanente, e 10% para seus membros.
Essa gratificação de 15% será igualmente estendida a quem estiver à frente da Ouvidoria da Mulher, bem como aos integrantes do Conselho Superior da Magistratura, da Comissão de Reforma do Judiciário e da Comissão de Regimento Interno.
Além disso, o projeto estabelece que, em caso de vacância do cargo de juiz adjunto, o assessor vinculado será realocado para atuar em unidades com maior demanda, conforme avaliação e designação da presidência do TJES. Também autoriza o uso de todos os recursos tecnológicos disponíveis para assegurar o funcionamento das comarcas e unidades, especialmente aquelas sem juiz titular ou com quadro de servidores insuficiente.
Outra mudança afeta o quórum das sessões plenárias. O funcionamento do Tribunal de Justiça dependerá da presença de, pelo menos, metade mais um dos desembargadores, incluindo o presidente. Hoje, o quórum mínimo é de dois terços.
O projeto prevê, ainda, a suspensão de nomeações em diversas unidades, como o 14º e o 15º Juízos de Direito das Varas Cíveis, de Falência e Recuperação Judicial e de Acidente de Trabalho de Vitória; o 5º Juízo de Família e Órfãos e Sucessões de Cariacica; o 13º e 14º Juízos de Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública de Vitória; o 9º Juizado de Vila Velha; o 4º Juízo da Fazenda Pública de Cariacica; e o 5º Juizado de Colatina.