O polêmico pagamento de auxílio-moradia a membros do Judiciário voltou ao centro dos debates no cenário nacional, regional e também nas redes sociais nos últimos dias. Apesar de previsto em lei, a moralidade do benefício é questionada. Afinal, servidores já bem-remunerados, que fazem parte de uma minoria no País, e ainda residem na mesma cidade em que trabalham, devem receber R$ 4,3 mil de ajuda de custo para moradia? Levantamento recente no Ministério Público Estadual (MPES) aponta que dos 291 promotores e procuradores, 255 recebem o auxílio-moradia. Na lista, estão os seis candidatos ao cargo de procurador-geral em campanha para comandar o órgão ministerial no biênio 2018-2020.
“Eu recebo e te pergunto: e se mudarmos a nomenclatura? E se fosse abono salarial para uma categoria sem reajuste há vários anos? Soaria melhor, né? Acho que é o que merecemos, ampliando-se inclusive aos aposentados”, justificou a candidata Márgia Mauro, 2ª promotora de justiça da Infância e Juventude de Vitória.
Ela alega que quando o subsídio foi fixado, a categoria de promotores e procuradores perdeu as outras vantagens, como o tempo de serviço. Além disso, segundo Márgia, a recomposição salarial anual, prevista na Constituição, não tem sido cumprida. “Nosso último reajuste foi em 2013, sendo 15% divididos em três vezes a serem pagos em três anos (2013, 2014 e 2015); depois disso, mais nada”, explicou a promotora, que oferece uma alternativa: iniciar uma discussão imediata para que a categoria consiga o reajuste salarial e abra mão do auxílio-moradia. “Poderíamos conversar com nossos órgãos de classe e achar uma solução imediata”.
Outro candidato, Marcello Queiroz, 13º promotor de justiça criminal de Vila Velha, destaca que nenhum promotor ou procurador se sente à vontade em receber o auxílio-moradia, que, na verdade, foi instituído para compensar um déficit salarial causado pela falta de reajuste anual. Para o promotor, os governos devem combater a sonegação fiscal, aumentando suas receitas para também valorizar as demais categorias, como a de professores, que precisam ser melhor remunerados.
Outra candidata, Sueli Lima e Silva, promotora de Justiça da mulher em Vitória, fez coro e disse que a categoria não quer a rubrica de auxílio-moradia, denominação que acaba trazendo dano para a Instituição, mas que o Congresso Nacional regulamente a gratificação por tempo de serviço. “É preciso tirar essa nomenclatura, que gera desgaste e crítica. O MPES desempenha um papel de extrema relevância e muitos servidores têm dedicação exclusiva. Eu não tenho outra fonte de renda, fiz vários concursos e optei por ser promotora. É claro que sei que existe uma dissonância com outros salários, a exemplo do professor, mas temos que nivelar por cima e não por baixo”, completou Sueli.
Além dos três candidatos, também recebem o benefício o atual subprocurador-geral administrativo, Eder Pontes da Silva, ex-procurador-geral por dois mandatos; Nicia Regina Sampaio, da Promotoria Cível de Vila Velha; e o atual ouvidor-geral e chefe da Procuradoria de Justiça Recursal, Alexandre José Guimarães, que completam o quadro da eleição que ocorre em no dia 23 de março.
O pagamento do auxílio-moradia aos membros do MPES representa aos cofres públicos, segundo o Sindicato dos Trabalhadores e Servidores Públicos do Espírito Santo (Sindipúblicos), R$ 1 milhão por mês. Isso sem contabilizar a quantia paga aos membros do Tribunal de Justiça (TJES) e do Tribunal de Contas (TCEES).
Em dezembro do ano passado, a entidade denunciou o Ministério Público do Estado ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), por omissão sobre informações relativas ao auxílio-moradia e pagamentos feitos de forma retroativa a 13 membros, confirmados pela Procuradoria-Geral de Justiça.
Assim como diversas instituições representativas da sociedade, o Sindipúblicos defende que o pagamento do auxílio-moradia seja revisto, cabendo apenas a servidores que estejam atuando temporariamente em local diverso ao seu domicílio. “Da maneira como está estabelecido atualmente, assume caráter de privilégio, de mais uma parcela instituída para que uma seleta casta de agentes públicos possam aumentar seus rendimentos e receber acima do teto remuneratório constitucionalmente instituído”, critica o Sindicato.