Nos sete dias do júri popular da morte do juiz Alexandre Martins de Castro Filho, um nome circulou em quase todos os episódios relacionados ao crime: o do juiz Carlos Eduardo Ribeiro Lemos, atual titular da 5ª Vara Criminal de Vitória. Na época do assassinato, em março de 2003, o magistrado atuava ao lado do juiz morto na Vara de Execuções Penais. Logo após a morte do colega, Carlos Eduardo atuou na instrução do processo contra os executores do crime e até escreveu livro intitulado “Espírito Santo”, que apesar de ser classificado como um romance policial de ficção, descrevia a atuação dos dois juízes e fatos relacionados ao crime.
A publicação acabou sendo o ponto de partida para uma série de questionamentos feitos por militares, advogados e até mesmo pela imprensa sobre a conduta de Carlos Eduardo. O livro foi lançado em setembro de 2009 com a coautoria do então secretário de Segurança Pública, Rodney Miranda, hoje prefeito de Vila Velha pelo DEM, e do antropólogo Luiz Eduardo Soares – que ficou conhecido pelo livro que serviu de inspiração para a realização do filme Tropa de Elite. Do trio de autores, somente o juiz Carlos Eduardo se encarregou de processar judicialmente todos aqueles que se levantavam contra a obra.
Desde o início das ações judiciais, o magistrado obteve sentenças favoráveis em todos os casos, faturando R$ 330 mil em indenizações por supostos danos morais. O caso mais recente surgiu durante o próprio júri do Caso Alexandre, durante o depoimento do coronel da reserva da Polícia Militar, Carlos Augusto de Oliveira Ribeiro, que escreveu um livro com recursos próprios, “Espírito Santo, a Outra Face da Verdade”, com objetivo de oferecer um contraponto ao livro de Carlos Eduardo – que se propunha a dar um molho à tese do crime de mando.
No segundo dia julgamento – terça-feira, 25 –o representante do Ministério Público Estadual (MPES) questionou o militar se o juiz Carlos Eduardo havia movido algum processo sobre o livro e qual era o resultado do caso. “Na semana passada, pagamos R$ 260 mil para ele”, afirmou o coronel reformado Carlos Augusto. Diante do espanto da plateia – e satisfação da acusação, que já havia ouvido o juiz na condição de testemunha do MP –, a resposta chamou atenção da reportagem de Século Diário para levantar o total recebido pelo juiz Carlos Eduardo apenas em decorrência do crime.
Além do processo movido contra o livro resposta, Carlos Eduardo – que foi promovido à titularidade da Vara após a morte do colega e da aposentadoria compulsória do então titular, Antônio Leopoldo Teixeira, que também é acusado do mando da morte – moveu ações contra a advogada Carla Pedreira, que defendia o traficante Fernando de Oliveira Reis, o Fernando Cabeção, também incluído na trama da morte do juiz Alexandre, bem como o próprio jornal Século Diário, que destinou espaço em seu noticiário à controvérsia sobre o crime de mando e a possível ocorrência de um latrocínio (roubo seguido de morte).
Em todos os casos, o juiz Carlos Eduardo recorreu às Varas cíveis de Vitória, mesma comarca em que atua desde o início dos anos 2000. No processo envolvendo o livro dos militares, tombado sob nº 0001791-16.2012.8.08.0024, a sentença de 1º grau foi prolatada em março de 2014 pelo juiz da 7ª Vara Cível, Marcos Assef do Vale Depes, que condenou o coronel Carlos Augusto e duas associações militares (Associação dos Oficiais da PM, a Assomes; e a Associação dos Militares de Reserva e da Ativa, a Aspomires) ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15 mil por cada requerido, totalizando R$ 45 mil a serem corrigidos na forma da lei.
Na decisão, o juiz avaliou que os requeridos “extrapolaram seu direito de resposta ao escrever sobre o autor [Carlos Eduardo], fatos que ofendem sua honra, imagem e moral, principalmente, pelo fato do mesmo ser uma pessoa pública”. A sentença foi confirmada no final de junho passado pela 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado (TJES), que manteve o direito à indenização – que foi resolvido após uma “transação realizada pelas partes”, isto é, uma espécie de acordo, homologado nos autos do processo nº 0011732-82.2015.8.08.0024 no último dia 18 de agosto.
O segundo alvo de Carlos Eduardo foi o jornal Século Diário, que publicou uma série de reportagens sobre a sua atuação durante a investigação da morte do juiz Alexandre. Por meio de duas ações judiciais (0010339-64.2011.8.08.0024 e 0026415-66.2011.8.08.0024), o magistrado chegou a obter uma liminar da juíza da 5ª Vara Cível, Rozenéa Martins de Oliveira, que mais tarde prolatou sentença favorável ao colega, para impedir o jornal de citar ou fazer qualquer tipo de referência ao titular da 5ª Vara Criminal de Vitória, sob pena de cassação do funcionamento do site. A censura prévia vigorou entre agosto de 2011 e março de 2014, quando a restrição foi derrubada pela 3ª Câmara Cível do TJES.
Nos autos do primeiro processo (0010339-64), o juiz Carlos Eduardo pedia a remoção de cinco conteúdos que apontavam contradições na versão oficial para Caso Alexandre. Na decisão de 1º grau, prolatada em novembro de 2011, a juíza havia sentenciado o jornal ao pagamento de R$ 500 mil sob alegação de suposto dano cometido na publicação das reportagens. No mesmo julgamento que pôs fim à censura, os desembargadores reduziram o patamar da indenização para R$ 40 mil. Esse caso ainda está sendo discutido nas instâncias superiores.
A conquista mais recente de Carlos Eduardo veio por meio de uma ação ordinária movida contra a advogada Carla Da Matta Machado Pedreira, tombada sob nº 0011834-46.2011.8.08.0024. Ela foi processada pelo juiz após ter denunciado, em entrevista à imprensa, a ocorrência de irregularidades e abusos de direito no curso do inquérito que investigou a morte do juiz Alexandre.
Em maio de 2014, a juíza da 11ª Vara Cível, Ana Cláudia Rodrigues de Faria Soares, alegou que “ao dar entrevista com manifestações caluniosas, difamatórias e injuriosas, acabou a ré se distanciando da discussão da causa posta em juízo, partindo para a ofensa pessoal ao juiz”. A sentença prevê o pagamento de indenização no valor de R$ 30 mil a título de danos morais, mas o caso ainda cabe recurso. Na última terça-feira (1), a advogado interpôs a apelação à condenação. O processo deverá ser remetido para análise do Tribunal de Justiça.