No processo, o plenário do TCU analisou um caso muito mais simples do que a denúncia envolvendo Hartung qual seria o período a ser considerado para atender à obrigação da compensação do valor que deixa de entrar nos cofres públicos em favor das empresas incentivadas. Além da necessidade de compensação das renúncias, seja pela elevação dos tributos ou outros meios, o governo deve permitir ainda que o Legislativo e o próprio Executivo verifiquem se a renúncia efetivamente foi compensada.
Levando em consideração, a situação da presidente Dilma Rousseff que é alvo de um processo de impeachment por conta das chamadas “pedaladas fiscais”, o caso de Hartung indica algumas similitudes. A presidente da República foi acusada de abrir créditos sem lei e de tomar empréstimos de forma indireta – pegando recursos emprestados de bancos públicos para cobrir com despesas sociais, caracterizando as pedaladas. No Espírito Santo, o governador não abriu créditos sem lei para despesas públicas, mas sim renunciou verbas para particulares – o que significa, de acordo com juristas, abrir mão de dinheiro público por decreto.
Na avaliação dessas fontes, o governador fez ainda pior do que a presidente ameaçada de deixar o cargo. “Ao invés de tomar emprestado de bancos, ele tomou do servidor. Vou dar apenas dois exemplos: a Procuradoria Geral do Estado (PGE) entendeu que o auxílio alimentação é devido. Ao não pagar o auxílio, o governo está tomando dinheiro emprestado a juros do servidor. Já quanto a não concessão de revisão geral [dos vencimentos], o Supremo Tribunal Federal (STF) considera a existência de inconstitucionalidade por omissão”, mencionou um dos juristas consultados sob condição de não ser identificado.
Segundo ele, a conduta viola a posição do Supremo que exige precaução do administrador público e pode ser cabível de indenização. “Se o STF decidir que cabe indenização, consequentemente estará configurada nova pedalada fiscal: tirar do servidor para dar para empresários sem lei específica, sem prova de compensação de receitas, sem transparência e impedindo a fiscalização da Assembleia Legislativa”, afirmou, lembrando da revogação do artigo 145 da Constituição Estadual, que obrigava a divulgação das informações sobre incentivos fiscais.
O acórdão do TCU já foi juntado à denúncia protocolada no TCE pelo advogado Luís Fernando Nogueira Moreira, que também é procurador do Estado. Ele denunciou o suposto descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Na ação, o autor afirma que o chefe do Executivo estadual não está respeitando a legislação ao omitir da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) os dados obrigatórios quanto às renúncias fiscais. Nogueira Moreira pediu ainda a responsabilização do peemedebista pela omissão quanto ao envio da lei da revisão anual dos servidores à Assembleia.
Pelo texto da LDO deste ano, o governo capixaba deve abrir mão de R$ 1,06 bilhão em tributos (ICMS e IPVA). Somente as empresas incentivadas vão deixar de arrecadar R$ 1,03 bilhão, sendo que o setor atacadista é responsável pela renúncia estimada em R$ 769 milhões. No entanto, a LDO não traz qualquer indicativo sobre a forma de compensação do tributo, se atendo a replicar dados sobre o faturamento do setor. Também não há qualquer projeção sobre elevação na arrecadação de ICMS.
Para os próximos anos, o palácio Anchieta prevê um salto no total de recursos que vão deixar de entrar nos cofres públicos por ação do próprio governo. Para 2018, a renúncia fiscal prevista é de R$ 1,22 bilhão (somente as empresas atacadistas vão deixar de arrecadar R$ 883 milhões). A denúncia foi encaminhada ao presidente do TCE, conselheiro Sérgio Aboudib, que deverá decidir se a corte vai prosseguir ou não com o exame do caso.