Apesar da aprovação por ampla maioria de votos, a legalização do Compete-ES teve duros questionamentos por parte dos deputados, sobretudo do deputado Gilsinho Lopes (PR), que votou contra a medida – repetindo seu posicionamento no projeto que garantiu a regularização do Invest-ES. O republicano voltou a questionar o polêmico artigo que garante a convalidação de todos os benefícios anteriormente concedidos. “Não vou colocar minha cabeça na guilhotina para tirar a de ninguém”, afirmou. Gilsinho alertou sobre eventuais questionamentos jurídicos, caso os benefícios anteriores – hoje questionados até no Supremo Tribunal Federal (STF) – sejam declarados ilegais.
Ele relembrou que no ano de 2011, o Ministério Público Estadual (MPES) ameaçou processar os deputados que votaram em projetos semelhantes de incentivos fiscais, na época do governo José Ignácio Ferreira. “Se a lei fosse a partir de hoje, votaria a favor. Mas não voto convalidando atos pretéritos, de dois governos [Paulo Hartung e Renato Casagrande]. É uma responsabilidade muito grande”, destacou. O deputado reforçou ainda as suspeitas de que empresas beneficiárias dos incentivos possam estar por trás dos esquemas de sonegação fiscal investigados pelas autoridades, como a recente operação Caxangá, que desvelou a existência de uma “máfia das embalagens”.
Gilsinho lembrou que fez uma denúncia ao Gaeco (Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado, órgão ligado ao MPES) sobre uma empresa de fachada em Alfredo Chaves, localizada na região sul do Estado. Segundo ele, uma residência onde mora um casal é usada como endereço de mais de 150 empresas. “Tudo isso porque lá tem o ISS menor”, revelou. A denúncia foi rebatida pelo deputado Guerino Zanon (PMDB), que defendeu a atuação do poder público contra os sonegadores, embora tenha evitada generalizar às empresas que recebem incentivos. “Se eu souber de alguma irregularidade, vou denunciar. Mas um programa como o Compete-ES é importante”, justificou.
Em seu parecer na Comissão de Ciência e Tecnologia, o deputado do PR chegou a afirmar que poderia propor emendas, mas que elas dificilmente passariam pelo “doutor tesoura”, apelido que deu ao deputado Dary Pagung, que é presidente da Comissão de Finanças – última a se manifestar antes do projeto ir à votação no Plenário. Como acontece em outras votações, as demais comissões aprovam emendas, mas cabe ao colegiado derradeiro a tarefa de “acertar” o texto ao desejo do governo.
Só que desta vez a “tesoura” de Dary estava menos afiada – até mesmo pela urgência na aprovação do PL. O deputado Majeski, que teve todas as suas emendas rejeitadas no projeto do Invest-ES, poderia postergar a votação devido ao prazo regimental como relator na Comissão de Ciência e Tecnologia. Mas em uma articulação, que contou com a anuência do secretário de Desenvolvimento, foram acolhidas quatro das cinco emendas do tucano. A principal delas, porém, acabou sendo rejeitada. A proposta obrigava o governo a dar publicidade aos incentivos concedidos, indicando os respectivos beneficiários, a motivação e o montante do imposto reduzido ou dispensado.
No entanto, Majeski conseguiu passar emendas que garantem, no mínimo, um pouco mais de transparência – já que o governo conseguiu até mesmo suprimir da Constituição Estadual um artigo inteiro que obrigava a publicidade dos benefícios fiscais, manobra que é alvo de críticas recorrentes do tucano e de Gilsinho. As quatro emendas aprovadas tratam da publicação de relatório de cada setor sobre os incentivos, bem como a vedação da renovação dos benefícios a empresas condenadas por crime contra a ordem tributária e a previsão expressa de que o cancelamento dos incentivos pode acarretar no ajuizamento de ações para reparação do erário.
As medidas são um pequeno alento, uma vez que o texto do projeto encaminhado pelo governador repete a atual fórmula do Compete, que é responsável pela renúncia fiscal de quase R$ 1 bilhão por ano. Tanto que Hartung teve que recorrer à “maquiagem” ao tratar a proposta como Programa de Desenvolvimento e Proteção à Economia do Espírito Santo. Hoje, os incentivos são alvo de uma ação direta de inconstitucionalidade no STF. O então advogado-geral da União, Luiz Inácio Adams, e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, já se manifestaram pela ilegalidade dos benefícios concedidos por decreto. O caso está parado desde outubro de 2014 com o ministro-relator Gilmar Mendes.
A grande ameaça era o Supremo decidir a questão antes da aprovação de uma lei específica, que é uma das condições admitidas pela Constituição para instituição de benefícios fiscais. Com isso, os empresários incentivados poderão respirar aliviados, uma vez que o autógrafo de lei já foi encaminhado ao governador, que poderá sancionar a lei ainda esta semana. Só que desta vez, o governo teve que ceder um pouco mais à intenção de “tesourar” as sugestões dos parlamentares.