A disputa jurídica em torno da possibilidade da venda e consumo de bebidas alcoólicas em estádios do Espírito Santo recebeu dois apoios contra. O governador Paulo Hartung (PMDB) e o advogado-geral da União, Luís Adams, defenderam a ilegalidade da Lei Estadual nº 10.309/2014, que permitiu a venda deste tipo de bebida. O caso está em análise no Supremo Tribunal Federal (STF), após uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI 5250), protocolada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
As duas manifestações fazem parte dos autos do processo sob relatoria do ministro Dias Toffoli, que já autorizou a aplicação do rito abreviado para que a ação seja julgada pelo plenário do STF antes mesmo da análise do pedido de liminar. O presidente da Assembleia Legislativa, deputado Theodorico Ferraço (PMDB), também opinou no processo. Entretanto, o parlamentar defendeu a iniciativa da Casa, ao destacar que vários estados regulamentaram a venda e o consumo de bebidas nos estádios, casos da Bahia e Rio Grande do Norte. Em outros estados, a prática não é regulamentada ou a proibição atinge bebidas destiladas – permitindo a venda de cerveja, por exemplo – como no Distrito Federal, Rio de Janeiro e Goiás.
O governador e o chefe da AGU repetiram os argumentos do PGR para impedir a venda e consumo da bebida nos estádios. Eles afirmam que a Constituição garante à União, aos estados e ao Distrito Federal competência legislativa concorrente sobre os temas “consumo” e “desporto”. Isso significa que cabe à União editar normais gerais e, aos estados e ao DF complementá-las. Na ausência de normas gerais, cabe aos estados exercer competência legislativa plena para atender às peculiaridades locais.
“Feitas essas considerações, resta evidenciado que a União estabeleceu disciplina legal, aplicável em todos os estádios desportivos do País, sobre a comercialização e o consumo de bebidas alcoólicas, tendo vedado, como regra, a prática de tais atividades. Não obstante, a lei estadual questionada autoriza a venda e o consumo de bebidas alcoólicas nos estádios e arenas desportivos do Estado do Espírito Santo, nas condições que especifica. Desse modo, observa-se que a lei impugnada, ao invés de suplementar a disciplina normativa federal, pretendeu substituir as normas gerais da União que regulam a comercialização e o consumo de bebidas alcoólicas em eventos e estádios desportivos”, concluiu o chefe da AGU.
Já o governador capixaba fez coro ao discurso de que a venda de bebidas estaria associada a episódios de violência nos estádios, muito embora os casos envolvendo times de grandes centros não tenham se repetido em eventos no Estado – como a final do Capixabão 2015 entre Rio Branco e Desportiva, no mês passado, que não teve qualquer incidente. “Desse modo, é visto que assiste razão o procurador-geral da República quando aduz que o legislador estadual invadiu o campo reservado a União”, concluiu Hartung.
Questionamento
Na ADI, o chefe do Ministério Público Federal (MPF) garante que, ao editar o Estatuto do Torcedor (Lei 10.671/2003), o governo federal dispôs sobre normas gerais de proteção e defesa do consumidor-torcedor. Posteriormente, para reprimir a violência nos estádios, a Lei 12.299/2010 acrescentou artigo ao Estatuto do Torcedor proibindo, em todo o território nacional, o porte de bebidas alcoólicas em eventos esportivos.
Embora o artigo acrescentado refira-se à proibição ao porte de “objetos, bebidas ou substâncias proibidas ou suscetíveis de gerar ou possibilitar a prática de atos de violência”, a ausência do termo “alcoólicas” não pode fazer com que a referência legal seja entendida como sendo a líquidos como água, sucos ou refrigerantes, cujo consumo não gera episódios de violência entre torcidas, na avaliação do PGR.
Para Janot, a venda e o consumo de bebidas alcoólicas somente foram liberados no País, em caráter excepcional, durante os jogos da Copa das Confederações (2013) e da Copa do Mundo (2014). “A Lei 10.309/2014, do Estado do Espírito Santo, foi não só inconstitucional como extremamente infeliz e sociologicamente inadequada ao autorizar a comercialização de bebidas alcoólicas em estádios e arenas esportivas. Fazendo-o, extrapolou os limites da competência estadual, para indevidamente mesclar-se com as normas gerais editadas pela União em tema de consumo e desporto”, finalizou.