Para o relator do caso, desembargador Fábio Clem de Oliveira, o pedido formulado é incompatível com a ação popular, cujo objeto típico é de natureza desconstitutiva – ou seja, a anulação de atos administrativos ilegítimos. Em seu voto, o relator consignou ainda que a concessão de qualquer benefício depende de lei específica (federal, estadual ou municipal), que precisa ser publicada no Diário Oficial para que possa entrar em vigor. A ausência de lei específica era um dos pontos questionados na ação popular.
O autor do processo, o bacharel em Direito, Sérgio Marinho de Medeiros Neto, listou uma série de irregularidades no contrato de competitividade entre o Estado do Espírito Santo e o Sindicato do Comércio Atacadista e Distribuidor (Sincades). No processo, ele acusou Hartung e o então secretário de Fazenda, Bruno Negris, de terem concedido o incentivo de forma ilegal e de que a suposta compensação – Fundo Sincades – não seria devidamente explicado pelo governo.
Na ação popular, Sérgio Marinho destacou ainda que os municípios capixabas estariam sendo lesados pelo setor atacadista, uma vez que o governo teria suprimido tributos que pertenceriam ao caixa dos municípios. A legislação prevê que o bolo do ICMS estadual é dividido entre o Estado (que fica com 75%) e municípios (25%), porém, a lei atribui que cada entre é o titular de sua parte. Por este motivo, ele defendeu que o Estado não poderia “transferir o dinheiro do município para particulares”. A renúncia fiscal do setor foi superior a R$ 3 bilhões nos últimos anos.
Essa polêmica teve grande repercussão na imprensa nacional após o pacote de benefícios concedidos às empresas atacadistas ter sido chamado pelo jornalista Elio Gaspari de “mimo sindical”. Gaspari escreveu que a manobra idealizada por Hartung teria conferido, por decreto, um benefício ao setor atacadista que acarretaria em uma renúncia fiscal de R$ 620 milhões por ano. O jornalista também criticou o repasse de verbas para o fundo cultural privado, administrado pela entidade do setor, que distribuía recursos sem qualquer fiscalização do Tribunal de Contas.
Mesmo com toda repercussão, a juíza da 3ª Vara da Fazenda Pública, Telmelita Guimarães Alves, lançou mão da tese de inadequação da via eleita para extinguir o processo. Para a togada, a declaração da inconstitucionalidade do Decreto nº 2.082-R, assinado por Hartung em junho de 2008, só poderia ser feita pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que examina uma ação direta de inconstitucionalidade movida pelo governo de São Paulo.
Em junho do ano passado, depois das duas ações judiciais no Estado e em Brasília, o governador Paulo Hartung decidiu enviar um projeto de lei à Assembleia Legislativa, que aprovou uma lei especifica – regulamentando a fórmula do incentivo, sem a manutenção do fundo cultural, além de convalidando todos os benefícios anteriormente concedidos. Por conta dessa lei, o Estado pede ao STF que encerre o processo sem julgamento de mérito. Já o governo paulista acusou o Estado de promover uma “maquiagem legislativa” para manter incentivos.
O então advogado-geral da União, Luiz Inácio Adams, e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, já se manifestaram pela procedência da queixa feita pelo governo paulista. Já o ex-governador Renato Casagrande (PSB), representante do Estado na época do ajuizamento do caso, defendeu a manutenção dos incentivos fiscais.