sábado, novembro 16, 2024
23.8 C
Vitória
sábado, novembro 16, 2024
sábado, novembro 16, 2024

Leia Também:

Justiça mantém condenação do Coronel Ferreira por morte do juiz Alexandre

A 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado (TJES) manteve a condenação do coronel reformado da Polícia Militar, Walter Gomes Ferreira, pelo mando da morte do juiz Alexandre Martins de Castro Filho, assassinado em março de 2003. Por unanimidade, os desembargadores negaram o pedido de um novo júri popular, mas aceitarem a redução da pena inicialmente fixada na primeira instância – de 23 anos para 16 anos de prisão, em regime fechado pelo crime. Também foi mantida a decisão dos jurados pela absolvição do ex-policial civil e hoje empresário Cláudio Luiz Andrade Baptista, o Calú.

O relator do caso, desembargador Willian Silva, também acolheu o pedido do Ministério Público Estadual (MPES) para a decretação da prisão de Coronel Ferreira antes do trânsito em julgado da sentença. No entanto, o magistrado ponderou que o mandado de prisão deve ser expedido somente após a conclusão do exame do caso na instância ordinária, isto é, pelo próprio TJES. Hoje, a defesa do oficial militar reformado só tem um último recurso no tribunal, os embargos de declaração – que visam sanar eventual omissão, contradição ou obscuridade no julgamento.

A sessão desta quarta-feira (21) teve um início tumultuado após o pedido do novo advogado de Ferreira, José Carlos Nascif, de adiamento do julgamento. Ele alegou que não teve tempo suficiente para analisar os autos, já que assumiu o caso há apenas dois dias. No entanto, o pedido foi negado pelo relator. Silva já havia rejeitado pedidos semelhantes sob alegação de que a defesa de Ferreira tentou adiar o julgamento em outras oportunidades. Com isso, o relator levou em consideração as peças anteriormente apresentadas pela defesa do réu.

Antes do início da leitura do voto, o advogado de Calú, Leonardo Gagno (foto abaixo, ao centro) fez sustentação oral pela manutenção da absolvição baseado no princípio da soberania do júri popular. O causídico voltou a criticar o que chamou de “atitude policialesca” das autoridades de segurança pública na época do crime, fato que teria “dragado” o empresário para dentro do crime. Gagno reforçou Calú que, apesar da relação de proximidade com outros acusados de participação na morte, não teria qualquer participação ou sequer interesse na morte de Alexandre, do qual foi aluno na escola preparatória de carreira jurídica.

O advogado destacou que o empresário e ex-policial não foi indiciado pelo Tribunal de Justiça no processo em que apurou o envolvimento do juiz aposentado Antônio Leopoldo Teixeira na trama do crime. Isso porque a denúncia do MPES ligou Calú ao crime pela atuação do juiz morto para atrapalhar o suposto esquema para liberação irregular de presos na 5ª Vara Criminal de Vitória, responsável pelas execuções penais. Leopoldo seria o titular da vara e atenderia aos interesses de Ferreira e Calú.

Gagno chegou a citar o voto do desembargador Sérgio Bizzotto – que presidiu o julgamento desta quarta e também fazia parte da Câmara naquela oportunidade – onde teria reforçado a separação entre Calú e a trama do crime. Na ocasião, o magistrado destacou a distância entre o empresário e Ferreira, não sendo claro o motivo de sua participação no crime. No final, o advogado de Calú criticou o recurso do MPES que teria repetido todas as supostas provas, incapazes de convencer os jurados em agosto de 2015, quando o réu foi absolvido por unanimidade.

Logo em seguida, o novo advogado de Coronel Ferreira se negou a fazer sustentação oral. Já no pedido de afastamento, Nascif destacou que seria irresponsável de sua parte fazer a defesa sem saber do que tratam os autos, antecipando que vai recorrer da decisão de Willian Silva – ratificado pelo restante do colegiado – de prosseguir o julgamento normalmente, mesmo sem a abertura de um prazo maior à defesa. Tanto o Ministério Público, quanto o assistente de acusação – no caso, o professor universitário, Alexandre Martins de Castro, pai do juiz morto, que sequer foi ao julgamento – decidiram não se pronunciaram.

Na sequência, o relator Willian Silva começou a leitura de seu extenso voto (clique aqui e leia na íntegra), que durou mais de uma hora. Inicialmente, ele relembrou a memória do juiz Alexandre, da grande repercussão da notícia do assassinato e das dúvidas iniciais sobre o crime – se havia ocorrido um latrocínio (roubo seguido de morte) ou um crime de mando. Jurista da área criminal, o desembargador passou a abordar sobre os aspectos do júri e as limitações no reexame do veredito dos jurados (juízes leigos) pelo Tribunal de Justiça (formado pelos juízes togados).

Neste ponto, Silva destacou que os dois recursos de apelação – tanto do MP, quanto de Ferreira – tratavam, em síntese, da suposta decisão manifestamente contrária aos autos. Ele destacou que caberia apenas ao Tribunal decidir caso a posição dos jurados fosse antagônica ao que foi apurado. Logo após, o magistrado passou a citar as principais provas levantadas nos autos, todas relacionadas à participação de Ferreira no crime, supostamente motivado pela passagem em que Alexandre teria algemado e acompanhado a transferência de Coronel Ferreira para um presídio no estado do Acre.

Silva rememorou os depoimentos de testemunhas ao longo da instrução do processo e, sobretudo, do juiz Carlos Eduardo Ribeiro Lemos – que atuava na mesma Vara do juiz morto. Apesar de o magistrado ter sido ouvido durante o júri na condição de “informante” (quando não há o compromisso de dizer a verdade, ao contrário de testemunhas, que podem até ser presas), o relator citou várias passagens em que Carlos Eduardo relacionou Ferreira ao crime. O voto também serviu para remir algumas situações embaraçosas levantadas durante o júri, como a denúncia do executor do crime, Odessi da Silva Martins, o Lumbrigão, de que teria sido torturado para confessar o assassinato a mando.

“Há nos autos base suficiente para a decisão [dos jurados]. Não cabe ao tribunal se esse é ou não o melhor caminho. Assim como o apelo [de Ferreira] não deve prosperar, a pretensão ministerial [pela realização de novo júri de Calú] também não”, antecipou o relator, quase 40 minutos após o início da leitura do voto, para alívio dos familiares do empresário (foto acima) que estavam presentes na Sala de Sessões do Tribunal Pleno.

Silva ponderou ainda que não se poderia negar a existência de provas contra a acusação, repetindo a menção ao voto de Bizzotto quando do julgamento da sentença de pronúncia – quando um juiz de Direito decide se os réus devem ou não ir a júri. Retornado aos tempos atuais, o relator afirmou que restava apenas ao tribunal respeitar a decisão dos jurados. “A sociedade escolheu condenar Walter Gomes Ferreira e absolver Cláudio Luiz Baptista”, emendou, terminando seu voto com a informação de que esse posicionamento também é adotado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de soberania dos vereditos do júri.

Logo após encerrar o voto de mérito, Silva passou a analisar outros pedidos da defesa e da acusação. Sobre a alegação de prescrição do crime de formação de quadrilha por Ferreira, o desembargador concordou que a demora no julgamento implicou na perda da capacidade de punir do Estado. Com isso, a pena de 23 anos estava sendo reduzida por quatro anos. Em sequência, Silva também concordou com a exclusão de cinco das oito circunstâncias negativas levadas em consideração pelo juiz que presidiu o júri para calcular a pena. Silva criticou que o MP não recorreu sobre a ausência de fundamentação na sentença – aceitando reduzir a pena dos 19 anos restantes para 16 anos de reclusão, em regime fechado.

O desembargador também analisou o pedido do Ministério Público para o início da execução da pena antes do trânsito em julgado, como já prevê o STF. O órgão ministerial requereu a decretação da prisão imediata de Ferreira, porém, o relator condicionou a expedição do mandado de prisão após o esgotamento dos recursos no próprio TJES. Silva também decidiu que a análise de possível detração na pena (quando os anos de prisão já cumpridos são descontados) ficará a cargo do juízo de Execução Penal.

O voto foi acompanhado pelos desembargadores Sérgio Bizzotto e Ney Batista Coutinho. O desembargador Pedro Valls Feu Rosa, que preside a Câmara, participou da primeira parte da sessão, mas deixou o local no início do julgamento do caso. Ele se declarou impedido para atuar neste processo envolvendo a morte do juiz Alexandre. Pedro Valls atua, no âmbito da segunda instância, na ação penal que trata do juiz Leopoldo, último acusado de envolvimento no crime a ser julgado.

A Justiça já determinou a realização do júri popular do ex-magistrado, mas a sua realização depende do exame de recursos nas instâncias superiores.

Mais Lidas