O quarto dia do júri popular dos acusados de mando da morte do juiz Alexandre Martins de Castro Filho foi marcado pelo primeiro embate entre a promotoria e a defesa dos réus do processo. No segundo depoimento desta quinta-feira (27), o perito Mauro Juarez Nadvorny expôs detalhes das análises feitas com pessoas envolvidas no crime. Em duas oportunidades, o especialista defendeu a ocorrência de latrocínio (roubo seguido de morte). No entanto, os representantes do Ministério Público Estadual (MPES) questionaram as conclusões do perito.
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O bate-boca teve início no momento em que o promotor de Justiça João Eduardo Grimaldi da Fonseca fazia perguntas ao perito. Ele questionava trechos do laudo que apontavam a existência de possíveis fraudes no depoimento de peças-chave do crime, como no caso de Odessi Martins da Silva Júnior, o Lumbrigão, assassino confesso do juiz Alexandre. Durante uma das duas entrevistas feitas com ele, o ‘detector de mentiras’ revelou imprecisões sobre a afirmação de que o executor do crime teria recebido dinheiro no caso.
Em sua resposta, Mauro Nadvorny alegou que a afirmação era irrelevante para considerar em seu parecer final. O perito explicou que Lumbrigão não havia mentido na primeira das três vezes (ciclos) em que foi questionado sobre o assunto. Sobre a diferença em uma das respostas, ele afirmou que o entrevistado poderia estar desconfortável com o assunto. Mauro citou uma possível influência da sessão de tortura cuja Lumbrigão teria sido submetido – policiais teriam torturado o assassino para confessar a versão do crime de mando.
Neste momento, o promotor questionou o porquê do perito não ter incluído um questionamento sobre a ocorrência ou não das agressões durante a entrevista com o equipamento. Entretanto, Mauro alegou que “aquela informação era desnecessária, já que ele estava apurando a existência ou não do mando no crime”.
A resposta não convenceu o promotor João Grimaldi que insistiu na abordagem ao perito, sendo retrucado pelo advogado Leonardo Picoli Gagno, que defende o ex-policial civil e hoje empresário Cláudio Luiz Andrade Batista, o Calú, um dos acusados de mando do crime. “Estamos tratando aqui da morte do juiz Alexandre e não da tortura. Se quiser, oficie à delegacia ou à Procuradoria de Justiça”, rebateu.
A discussão foi o ponto final de um depoimento marcado pelas explicações técnicas sobre a aplicação do sistema que identifica modificações na frequência da voz das pessoas. Mauro explicou que utiliza a técnica há 17 anos, sendo que foi treinado em Israel pelo idealizador do equipamento, Amir Liberman. Segundo ele, a precisão do sistema seria de 100% para verdade e 95% para mentira – esses 5% seriam por erros do operador, que não faria a leitura dos dados indicados em tempo real.
Nas investigações da morte do juiz Alexandre, a utilização da “máquina de verdade” foi de sugestão do delegado aposentado da Polícia Civil, André Luiz Cunha, que presidiu o 2º inquérito policial do caso – referente apenas à investigação sobre o crime de mando – por cinco meses. Na ocasião, o delegado convidou o perito para auxiliar os trabalhos. Coincidentemente, os dois chegaram à mesma conclusão: que o magistrado foi morto em uma tentativa frustrada de assalto à caminhonete conduzida por ele, na manhã do dia 24 de março.
Segundo o perito, ele e o delegado fizeram a primeira rodada de entrevista com a maior parte dos envolvidos no crime – os executores Lumbrigão e Giliarde; os intermediários André Yoxito, Leandro Pardal, Heber Valêncio, Ranílson Freitas (os dois últimos, ex-sargentos da PM); além de Calu e uma testemunha Silvana Borges. O laudo apontou que todos os envolvidos falaram a verdade, com exceção de Silvana, que aparece na denúncia do Ministério Público como a delatora da eventual ligação dos supostos mandantes com o crime.
O equipamento teria sido utilizado uma segunda vez, quando o rol incluiu novas testemunhas do caso. Entretanto, o parecer final teria ratificado as conclusões de que o crime foi latrocínio e não crime de mando. Mauro relatou ainda dois encontros que teve na época em que esteve no Espírito Santo: um na residência do juiz Carlos Eduardo Ribeiro Lemos, que estava prestes a prolatar a sentença de pronúncia (que leva os acusados a júri) dos executores do crime, e na Secretaria de Segurança Pública com o então titular da pasta, Rodney Miranda. Ele disse ter saído constrangido nas duas situações:
“Os dois se mostraram entusiasmado com o uso da máquina para desvendar os responsáveis pelo mando do crime. Mas o relatório final foi de que não houve crime de mando, mas sim um latrocínio. Ficamos [ele e André Cunha] com a impressão de que estávamos trabalhando para achar um mandante e não descobrir a verdade sobre os fatos”, revelou.
Em seu depoimento, o perito denunciou ainda uma tentativa de intimidação por parte do juiz que presidiu a audiência de instrução desse processo. Mauro relatou que se recusou a assinar o termo de declarações por não refletir o que havia afirmado. Na ocasião, o magistrado – não identificado por ele – aparentou, segundo ele, ter ficado ofendido com a atitude e ordenou aos gritos para que a escrivã levasse o documento ao perito para fazer as ratificações necessárias: “Logo após esse episódio, alguns advogados me procuraram para dizer se queria fazer uma representação na Corregedoria, mas o que eu queria era ir logo para o aeroporto”, disse o perito, que é do Rio Grande do Sul.
Nesta sexta-feira (28), será ouvida a última testemunha da defesa, o juiz aposentado e advogado criminalista, Antônio Franklin Cunha. Ele atuou no início do processo como assistente de acusação da Associação de Magistrados do Espírito Santo (Amages), mas recusou o serviço após constatar que se tratava de latrocínio. A previsão do magistrado é de que também seja realizado o interrogatório dos réus. Com isso, a conclusão do julgamento deve acontecer somente no sábado (29).