Ação que aponta superfaturamento e irregularidades atinge a gestão do prefeito Edson Magalhães
Falhas na execução do contrato firmado entre a União, a Caixa Econômica Federal (CEF) e o município de Guarapari levaram os Ministérios Públicos Federal (MPF) e do Espírito Santo (MPES) a ajuizarem ação civil pública, nessa quarta-feira (1º), para suspender cautelar e imediatamente o prosseguimento do contrato para a construção do Hospital Maternidade Cidade Saúde.
A obra teve início em junho de 2015 e deveria ter sido entregue em 2017. No entanto, os serviços iniciais foram paralisados, gerando várias denúncias ao prefeito Edson Magalhães (PSD), por suposto superfaturamento, agora identificado na ação ajuizada pelos Ministérios Públicos.
A Prefeitura de Guarapari, através de um convênio com o Governo Federal, projetou o Hospital Cidade Saúde, que seria uma referência em toda a região, para avanço e melhoria da saúde pública de Guarapari e municípios vizinhos. A unidade contaria com uma estrutura de três pavimentos, como pronto-socorro adulto e pediátrico.
De acordo com o documento, o valor do contrato, entretanto, foi significativamente majorado em R$ 9,8 milhões, após a celebração de oito termos aditivos, atingindo, assim, R$ 23,8 milhões. Desse novo total, a União arcaria com despesas no montante de R$ 18,8 milhões e outros R$ 4,9 milhões ficariam a cargo da contrapartida municipal.
Com base no Relatório da Controladoria-Geral da União e nos documentos analisados, a aplicação de recursos federais em tal empreendimento é de alto risco, especialmente por conta da identificação de inúmeras falhas e situações.
Além disso, a ação destaca que setores do Ministério da Saúde, responsáveis pela liberação dos recursos, mantiveram-se e ainda estão omissos quanto a seu dever de tomar as medidas cabíveis sobre o indicativo de mau uso das verbas públicas.
Em 1º de setembro de 2011, utilizando-se de recursos próprios, a Prefeitura de Guarapari adquiriu um imóvel, constituído por um terreno com área de 7.582 m², onde havia uma estrutura edificada com dois pavimentos, mas ainda inacabada. A aquisição da propriedade pelo município se deu por desapropriação amigável, tendo o município pago uma indenização de R$ 2,9 milhões. Tal imóvel foi reservado pela prefeitura para viabilizar as obras, segundo contrato assinado em 29 de dezembro de 2011 com o Ministério da Saúde. O objeto formal diz respeito à conclusão das edificações que já existiam no imóvel, onde o município pretende instalar o Hospital Maternidade Cidade Saúde.
Além de ainda não ter sido concluído o objeto do contrato de repasse após longo período e de não ter sido demonstrada a conveniência da utilização dos recursos públicos previstos, diversas irregularidades foram identificadas pela Controladoria-Geral da União (CGU). Inclusive, oficiadas para que explicassem as falhas apontadas pelo órgão de controle, a Prefeitura não conseguiu rebater as conclusões da CGU e a União não adotou as providências cabíveis para fazer cessar as irregularidades.
Entre os problemas estão a ausência de demonstração da necessidade de construção do hospital e da adequabilidade do projeto às reais necessidades locais; o risco à efetividade do emprego dos R$ 23,8 milhões previstos para o contrato de repasse, devido à ausência de demonstração das fontes de recursos para mobiliar e equipar o hospital e, principalmente, mantê-lo em funcionamento após a conclusão da obra.
Também foi notada a ausência de estudo com estimativas dos recursos financeiros, humanos e materiais necessários ao funcionamento do hospital; e a indefinição do formato da gestão, com sinalização da possibilidade de que seja mediante terceirização ou parceria público-privada, sem que tenha sido demonstrada a vantagem da adoção de uma dessas modalidades em detrimento da gestão direta pela administração pública.
Foi constatada ainda a ausência do Plano Diretor Hospitalar, que buscasse adaptar a estrutura física do hospital privado já existente quando da desapropriação e demonstrar a adequabilidade da localização do hospital, com base nas demandas públicas que se pretendem atender, e a execução de apenas 9,57% do objeto após quase oito anos da celebração do contrato de repasse, sinalizando pela dificuldade dos gestores em realizar a obra.
As investigações identificaram imprudência de gestão no início da obra e realização de serviços posteriores sem autorizações prévias da Caixa, o que impactou no andamento de três processos licitatórios, prejudicando a evolução do contrato de repasse. Somam-se ainda à lista de problemas a assinatura de aditivo contratual em patamar superior ao permitido em lei, caracterizando desrespeito ao princípio da isonomia pela modificação do objeto inicialmente contratado.
A falhas na elaboração do projeto e na licitação, evidenciando negligência quanto à complexidade da obra, também foram identificadas, como indicado na ação, e vêm com o o sobrepreço por superestimativa de quantidades no valor de R$ 577,1 mil; e ainda a deficiência do orçamento da obra demonstrada na incompatibilidade entre os quantitativos da planilha orçamentária contratada e os definidos no projeto da obra.
Para os MPs, não houve demonstração da real necessidade da construção de um hospital municipal em Guarapari, principalmente quando confrontado com as necessidades e a realidade dos serviços públicos de saúde em todo o Estado. “A propósito, a construção e manutenção de um hospital municipal é tão complexa que nem mesmo o município de Vitória, capital do Espírito Santo e um dos municípios com maior PIB [Produto Interno Bruto] per capita do Brasil, possui hospital municipal”, diz a ação.