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MP aponta superfaturamento de R$ 46,8 milhões em contratos da Cesan e Odebrecht

Ação civil pública assinada por três promotores do Ministério Público do Estado (MPES) aponta superfaturamento de R$ 46,8 milhões em contratos firmados pela Companhia Espírito-Santense de Saneamento (Cesan) com a construtora Norberto Odebrecht, entre os anos de 2008 e 2015, períodos dos governos Paulo Hartung e Renato Casagrande (PSB). O órgão ministerial acusa 19 pessoas de improbidade administrativa, com pedido de bloqueio de bens e quebra de sigilos bancários. Os pedidos estão conclusos para despacho desde essa segunda-feira (23), na 2ª Vara da Fazenda Pública Estadual.

Entre os acusados de envolvimento nas irregularidades identificadas tanto por auditorias do Tribunal de Contas do Estado (TCE) como por análise técnica do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Patrimônio Público do MPES, estão nomes de confiança do governador Paulo Hartung, que sempre ocuparam cargos estratégicos em suas gestões, permanecendo no então governo de continuidade de Casagrande. 

Desse primeiro escalão, são apontados como réus o atual secretário de Estado de Transporte e Obras Públicas, Paulo Ruy Carnelli, que já ocupou a presidência e diretorias da Cesan; Neivaldo Bragato, atual assessor especial da Secretaria de Governo, ex-secretário, ex-chefe de Gabinete e articulador de Hartung; e Anselmo Tozi, ex-diretor da Cesan, ex-secretário, e que se desincompatibilizou em abril deste ano do cargo de diretor da Agência Estadual de Recursos Hídricos (AGERH).

O primeiro contrato alvo de investigação, de número 255/08, teve origem na Concorrência Pública 018/2008, para contratação de empresa para execução de serviços de operação e manutenção das Estações de Tratamento de Esgoto Doméstico (ETEs) e elevatórias de esgoto bruto (EEBs) em municípios da Grande Vitória e Guarapari. 

Com duração de 73 meses – início em 12 de setembro de 2008 e término em 11 de outubro de 2014 -, apresentou valor inicial de R$ 71,7 milhões, saltando para R$ 84,6 milhões ao final do contrato. Desse total pago pela Cesan à Odebrecht, o MPES aponta superfaturamento de R$ 35 milhões (R$ 43,3 milhões atualizados), um índice de 41,35%. 

O outro contrato apontado pelos promotores Dilton Depes Tallon Neto, Graziela Argenta e Manoel Milagres de Silva Ferreira, se refere a uma contratação emergencial, de número 064/2015, no primeiro ano do terceiro mandato de Hartung. Foi firmado sem licitação, com duração de apenas seis meses – 12 de abril  a 11 de outubro do mesmo ano -, e valor total de R$ 7,4 milhões, sendo R$ 3 milhões de superfaturamento (R$ 3,47 milhões atualizados).

Somando os dois contratos, como aponta a ação civil pública, chega-se ao total de R$ 46,8 milhões somente de superfaturamento, sem contar, como lembram os promotores, do contrato entre a Cesan e a Delta Engenharia, também investigado em ação civil pública, inclusive, repetindo vários personagens do atual processo judicial.

“As semelhanças nas contratações, principalmente pelo direcionamento e restrição a concorrências em benefícios dessas empresas, evidenciam um sistema de fraude a licitações montado para favorecimento de particulares em enorme prejuízo ao patrimônio público”, ressaltam no documento. 

Os promotores destacam ainda que a Odebrecht é uma das principais investigadas da Operação Lava Jato, por ter um departamento exclusivo de pagamentos de propinas a agentes públicos em contrapartida de favorecimentos em obras públicas, conhecido como Setor de Operações Estruturada. E que a Cesan apareceu no radar da investigação, quando da revelação de uma lista de obras acusadas de irregularidades e pagamentos de propinas.

A ação também alerta sobre o “intercâmbio” de cargos entre o governo do Estado e a construtora. Segundo apontam os promotores, um dos representantes da Odebrecht do contrato 255/08, como diretor operacional, foi Pablo Ferraço Andreão, indicado em 2012, e que, “algum tempo depois, presidiu a própria Cesan”. Este contrato recebeu vários termos aditivos de prazos e valor, como informa a ação.

“Por sua vez, o requerido Paulo Ruy saiu da Cesan, onde chegou a ser diretor-presidente, para trabalhar como consultor da empresa Foz do Brasil S/A, criada pelo Grupo Odebrecht, para atuar exatamente na área de saneamento, e retornou para a Cesan, situação que motivou, inclusive, questionamentos por dois membros do Conselho de Administração da Cesan sobre possível conflito de interesse e necessidade de observância da ética na administração pública”. 

Assim como Andreão, os promotores afirmam que Paulo Ruy assinou, como diretor-presidente da Cesan, termos aditivos ao já superfaturado contrato 255/08.

 “Realmente, essa proximidade e intercâmbio entre a Cesan e a Odebrecht não poderia render bons resultados para o interesse público”, constata o MPES.

Além do superfaturamento, também foram apontadas pela manifestação técnica do órgão ministerial irregularidades nos pagamentos de reajustes anuais do mesmo contrato, entre os anos de 2009 e 2012, aprovados pelas respectivas diretorias da Cesan. 

A ação alerta que não houve, para isso, análise de vantajosidade por meio de pesquisa de preços de mercado, descumprindo a cláusula 7.2 do referido contrato. Já em 2013, este foi aditivado em R$ 14,3 milhões, da mesma forma, sem a devida avaliação. As gestões desse período foram comandadas por Paulo Ruy e Neivaldo Bragato.

“O ato de improbidade administrativa praticado pelos requeridos também vulnerou os princípios constitucionais norteadores da administração pública, como a legalidade, moralidade e impessoalidade”. Já a Odebrecht, afirma os promotores, por concorrer e se beneficiar do ato de improbidade, também está sujeitas às sanções. 

Para garantir o devido ressarcimento aos cofres públicos, considerando os dano materiais e morais e multa, o MPES pede a indisponibilidade dos bens até atingir R$ 1,9 bilhão, valor da causa. 

E, ainda, a quebra de sigilo bancário entre os anos de 2008 e 2016, da construtora Odebrecht; de Paulo Ruy Carnelli; Neivaldo Bragato; Ricardo Maximiliano Goldschmidt; Carlos Eduardo Fernandes Saleme; Carlos Fernando Martineli; Luiz Ferraz Moulin; e Sandra Sily.

Também são citadas na ação Celso Luiz Caus; Denize de Moura Cadete Gazzinelli Cruz; Renato Lorencini; José Eduardo Pereira; Moacir José Uliana; Romeu Souza Nascimento Júnior; Hélio de Souza; Maria Elisabeth Camatta Bockel; Genivaldo Cotta; Fernando Rodrigues da Matta Baptista; e Dalton Luís da Cunha Ramaldes.

Lava Jato

Além das obras da Cesan, o Espírito Santo apareceu na Lava Jato nas delações de executivos da Odebrecht, em 2017, com a citação de diversos atores políticos por recebimento de suposto caixa dois, incluindo o governador Paulo Hartung – identificado na lista como Baianinho – e Neivaldo Bragato. 

Os depoimentos do ex-diretor da construtora Benedicto Junior apontaram encontros com Hartung em 2010 e 2012, na residência oficial e seu escritório, para acertos de repasses no valor de R$ 1,8 milhão para campanhas, que teriam sido entregues a Neivaldo.

Meses depois, porém, a Procuradoria Geral do Estado (PGE) conseguiu arquivar o procedimento no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Apesar de reconhecer que tratou-se de doação não contabilizada, o ministro Félix Fischer considerou que caberia ao destinatário da contribuição, e não ao solicitante, o dever de declarar oficialmente a doação. 

O arquivamento também beneficiou Bragato, mas foi feito com a ressalva de que “o caso poderá voltar a ser apurado diante novos elementos probatórios”.

 

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