Um dos pontos principais do questionamento feito pelo MPC é relacionado à mudança de entendimento por parte da área do TCE, quanto ao preenchimento dos requisitos legais para concessão de medidas cautelares. O Ministério Público afirma que, anteriormente, o posicionamento era de que a adoção de medidas cautelares – como o afastamento dos controladores da ponte, intervenção no serviço e o fim do pedágio – não deveriam ser aplicadas por conta do “adiantado estágio de instrução do Processo TC 5591/2013”, referente à auditoria do tribunal no contrato de concessão.
Naquela ocasião, o julgamento tinha sido iniciado e o processo se encontrava em fase de elaboração de nova manifestação técnica após sustentação oral. Entretanto, a nova manifestação da área técnica foi de que o pedido de medida cautelar não preenchia os requisitos legais – perigo na demora e fumaça do bom direito. O parecer levantou que até o momento não houve nenhuma manifestação do poder concedente contrária à transferência da concessão, o que seria essencial para a decretação de medida cautelar.
Em relação ao pedido de suspensão de cobrança do pedágio nas duas praças do Sistema Rodosol, em razão do desequilíbrio econômico sugerido pela auditoria, a área técnica entendeu que a matéria está sendo discutida naquele processo, enquanto não há provas suficientes para permitir a indisponibilidade dos bens das pessoas físicas e jurídicas responsáveis pela Rodosol.
Além de reiterar os pedidos iniciais, o MPC requer que seja determinado à ARSP e a Rodosol que forneçam novos documentos com cópias de contratos, aditivos e documentos comprobatórios dos serviços prestados à concessionária por empresas de consultoria. Esses documentos teriam sido colocados em sigilo a pedido da Rodosol. Por fim, o MPC pede o retorno da Representação TC 8336/2016 à área técnica para complementação da Manifestação Técnica 1138/2017, visando à efetiva análise de todos os pedidos liminares formulados pelo órgão ministerial.
Cartel
Para o MP de Contas, a concessão da Terceira Ponte foi “maior fraude à Lei de Licitações já perpetrada no Espírito Santo”, contando com a “imprescindível colaboração do grupo Banco Rural” por meio da empresa Servix Engenharia para disputar e vencer a concorrência pública em 1998. A vencedora – que fazia parte do núcleo de engenharia do Banco – teria atuado como laranja do consórcio local de empresários para ocultar os reais sujeitos titulares da relação jurídica, neste caso, os donos da ponte.
Segundo o documento, a fraude passou a ser executada imediatamente no dia seguinte à celebração do contrato. No dia 22 de dezembro de 1998, a Servix Engenharia transferiu 67% do total das ações da Rodosol para o consórcio Local, mediante cessão das ações para os grupos A. Madeira (por intermédio da Dudalto Veículos, do mesmo grupo) e Urbesa/Arariboia (por meio da Urbesa Administração e Participações Ltda.), passando os grupos à condição imediata de acionistas majoritários da concessionária. Posteriormente, as ações seriam cedidas aos grupos Coimex e Tervap, indicando uma prévia negociação entre os atuais controladores – ainda na época do início da concessão.
O MP de Contas destaca ainda que a Servix deixou, definitivamente, em 2001 o quadro de acionistas da Rodosol, empresa por ela criada para, em seu nome e sob sua exclusiva responsabilidade, explorar a concessão do sistema por 25 anos (1998/2023), e encerrou suas atividades no Espírito Santo em 2005, deixando o controle total da exploração para os grandes grupos econômicos capixabas, que teriam atuado nos bastidores políticos para “sobreviver incólumes a três CPIs, duas auditorias do governo, duas ações movidas pelo MP estadual, além de várias auditorias realizadas pelo TCE”.
Consta ainda da representação que, além de o consórcio local desfrutar do monopólio das obras do Departamento de Estradas de Rodagem do Estado (DER-ES) e ser beneficiário de expressiva fatia dos incentivos fiscais estaduais, obteve por “via oblíqua” o direito de explorar a concessão do trecho da BR 101 que corta o Espírito Santo. Vale destacar que os empresários capixabas saíram derrotados da licitação, mas a exemplo do caso da Terceira Ponte, eles são hoje os donos das concessões – no caso da rodovia federal, os empresários locais fizeram a aquisição de parte das ações da vencedora da licitação, consórcio ECO-101.
Além da nulidade do contrato e o fim dos pedágios, o órgão ministerial também quer a desconsideração da personalidade jurídica e a quebra do sigilo bancário da Rodosol. O MPC cobra ainda a responsabilização e a indisponibilidade dos bens de todas as empresas responsáveis direta ou indiretamente pela construção das obras construídas com qualidade inferior à contratada pelo Estado e remunerada pelos usuários consumidores ao longo do tempo.