Uma notícia-crime denunciando fraudes na eleição para a presidência do Conselho de Engenharia e Agronomia do Espírito Santo (Crea-ES) foi enviada à Superintendência da Polícia Federal pelo advogado Luciano Ceotto, em nome de dois candidatos que perderam a disputa para a engenheira Lúcia Vilarinho, os engenheiros Jorge Luiz e Silva e Sebastião da Silveira, e do candidato a diretor geral da Mútua-ES, a Caixa de Previdência dos Profissionais do Crea, José Luís Miotto.
Jorge Luiz comentou que acredita numa rápida investigação da Polícia Federal, levando em consideração “a competência e a seriedade de suas ações”.
Além de relacionar nomes de funcionários do Crea e do coordenador da Comissão Eleitoral Regional, engenheiro João Bosco Anício, para serem ouvidos na investigação, o documento aponta as denúncias mais graves também feitas logo após o término da votação em 15 de dezembro do ano passado, às comissões eleitorais regional e federal, uma ligada ao Crea-ES e a outra ao Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea).
“Não se poderá admitir que a escolha de membros dirigentes de tão importante autarquia federal se dê por meio de procedimentos fraudulentos e antijurídicos, sobretudo nesse contexto de eleição viciada”.
Contundente em seus termos, a notícia-crime acusa de omissão não só o Confea como a Comissão Regional e a Mútua.
“Não se sabe por qual razão, mas, até o momento, nenhuma das providências foi levada a cabo. O procedimento mais próximo de que se tem notícia de algum tipo de averiguação quanto aos ilícitos apontados resume-se em visita feita ao Espírito Santo no dia 11/01/2018 pelo então presidente do Confea, Daniel Antônio Salati Marcontes. É visto no teor da anexa ata de reunião (com Daniel) que os ilícitos acima são referidos e alguns deles reconhecidos pelas autoridades do sistema Crea/Confea/Mútua, mas, inaplicadamente, permanecem sob o manto do silêncio e, quiçá, da intolerável prevaricação”, ressalta o documento.
Principais denúncias
Dentre as violações mais graves, o documento enumera “aquelas que afloram mais evidentes e notoriamente praticadas nesse último período de campanha eleitoral”, a saber:
“1) Modificação dos locais de votação (zonas eleitorais) às vésperas do pleito, entre os dias 15 de novembro a 15 de dezembro, causando tumulto e relevante índice de abstenção dos eleitores em decorrência de ato arbitrário da Comissão Eleitoral Regional. Os prejuízos causados pelo remanejamento de domicílios eleitorais deram-se à revelia dos eleitores, sem motivação, aviso prévio ou autorização legal;
2) Erro nas listas de eleitores, porquanto profissionais quites com suas contribuições e aptos a votar não tiveram seus nomes incluídos nas listas de votação ficando impedidos ilegalmente de participar do processo eleitoral. Tais situações foram objeto de registro em atas de sessões eleitorais e podem ser facilmente constatadas e comprovadas pela Comissão Eleitoral;
3) Instalação de urnas na sede de empresas como ArcelorMittal, que impediu o acesso de eleitores que não faziam parte do quadro de empregados de tal empresa. Dessa forma, houve impedimento físico intransponível dos alistados para votar nas urnas localizadas nas referidas empresas, sem que a Comissão Eleitoral Regional adotasse qualquer providência para garantir o direito ao voto;
4) Não divulgação dos locais de votação para os profissionais cujo domicílio eleitoral situava-se em Nova Venécia (ES). Neste caso, os inscritos na 22ª Zona/27ª Seção Eleitoral foram convocados para votar na Rua Mato Grosso, nº 96, Bairro Beira Rio – Nova Venécia (ES), CEP 29.830-000, mas, na realidade, a urna foi localizada em local diverso, qual seja, na Rua São Vicente de Paula, 70, Bairro Filomena – Nova Venécia (ES), 29.830-000. Não houve sequer aviso, cartaz, anúncio ou qualquer pessoa responsável por reorientar os eleitores;
5) Utilização de empregados e da estrutura administrativa do Crea/ES em favor de candidato preferido pela então presidência da autarquia. Fato que já é conhecido do Confea, que acertadamente rejeitou o registro de candidatura daquele postulante beneficiado pelo abuso de poder da máquina administrativa;
6) Abuso de poder econômico, porquanto houve candidatura cuja campanha recebeu benefícios indevidos do Senge – Sindicato dos Engenheiros do Espírito Santo, que pôs sua estrutura administrativa e de propaganda para beneficiar candidato de sua preferência;
7) Omissão da Comissão Eleitoral Regional em investigar e coibir condutas desviantes da Lei e da Norma Resolutiva negando-se, inclusive, a cumprir com sua competência legal de velar pelo bom andamento e pela legalidade do torneio. Veja-se, inclusive, que os recursos e incidentes apresentados por vários candidatos, fiscais e até mesmo eleitores não foram objeto de análise e deliberação até o presente momento;
8) Negativa de fornecimento de documentos públicos previstos na Resolução nº. 1021/2007, impedindo a adoção de medidas legais cabíveis para coibir as práticas ilegais verificadas ao longo do processo”.
Em Brasília
A nova presidente do Crea-ES, engenheira Lúcia Vilarinho, está desde sexta-feira (19) em Brasília para uma reunião de rotina que acontece sempre depois desse tipo de eleição, com a presença dos novos eleitos para comandar autarquias em todo o país. Segundo sua assessoria de comunicação, ela volta nesta terça-feira (23) para a plenária do Crea que convocou para escolher sua nova diretoria.
Em meio a tantas incertezas e pressões dos adversários que a cercam desde primeiro de janeiro, quando foi empossada no cargo, Lúcia exerce rotineiramente sua presidência, seguindo o que o regimento da autarquia determina. Ainda assim, não será dessa vez que se livrará de intimidações. O Senge (Sindicato dos Engenheiros do Espírito Santo) tenta abocanhar cargos na diretoria, impondo-lhe nomes que não são de sua confiança.
Como presidente do Crea, Lúcia é gestora de uma máquina administrativa (com relevante orçamento), por cujas ações ela responde perante a sociedade, a legislação e os associados. No entender de quem acompanha de perto essa articulação do Senge, “não são as entidades que compõem a plenária que devem impor nomes, e sim ela que os deve escolher conforme seu padrão ético. No máximo, lhes compete sugerir nomes para que Lúcia opte, mas nunca coagir”.
O retorno coincide com a expectativa do engenheiro José Roberto Hernandes, ex-vice diretor administrativo do Crea, de que ela seja notificada pela Justiça Federal de Vitória sobre a decisão recentemente tomada pelo juiz da Terceira Vara Federal, Rodrigo Reiff, reconhecendo a legalidade da portaria 88/2017, assinada pelo antigo presidente, Helder Carnielli, nomeando-o presidente provisório (era o quarto na lista sucessória). Foi com essa portaria que Lúcia, por meio dos seus advogados, conseguiu mandado de segurança para tomar posse, numa decisão de um juiz federal plantonista.
José Roberto disse nessa segunda-feira (22) que não tinha muito o que falar sobre a decisão judicial.
“Vou aguardar a notificação da presidente do Crea para tomar as providências que se fazem necessárias para garantir a normalidade da minha posse. Não vou colocar o carro na frente dos bois”, disse.
Enquanto isso, porém, José Roberto avançava com o carro (sem os bois) sobre o Crea. No final da tarde, compareceu à sede da entidade, acompanhado de um grupo apoiadores do ex-presidente Helder Carnielli e do engenheiro Geraldo Ferreguetti, outro candidato que ambiciona derrubar Lúcia, pressionando uma funcionária do setor jurídico a elaborar termo de posse para ele assinar. Mas os funcionários do Crea se recusaram, dizendo para José Roberto que inexistia qualquer suporte legal para sua pretensão.
Explica-se a confiança de Ferreguetti em José Roberto. Caso o ex-vice diretor administrativo do Crea se torne presidente interino, ele é que vai convocar e presidir novas eleições. Ferregueti, assim, se tornaria o grande beneficiário de uma poderosa máquina administrativa operada por um aliado de Carnielli.