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‘O Ministério Público deve ser a casa da sociedade’

Promotora Maria Clara Mendonça Perim propõe candidatura “independente” na eleição para a nova gestão do MPES

A promotora de Justiça Maria Clara Mendonça Perim é um dos nomes fortes a concorrer na eleição para a gestão 2022-2024 da Procuradoria-Geral de Justiça do Ministério Público Estadual do Espírito Santo (MPES), marcada para o dia 22 de março.

Atuante na Promotoria da Serra, na Grande Vitória, ela é mestre em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e doutoranda em Direito Público pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj).

Sua posição é a de independência em relação ao grupo que está há mais de uma década no poder e que, no atual certame, se dividiu em torno de duas candidaturas ao cargo máximo do órgão ministerial capixaba, que em 2024, tem um orçamento de R$ 527 milhões.

A divisão é decorrente de uma fissura entre a atual procuradora-geral, Luciana Andrade, e seu antecessor, o ex-procurador-geral Éder Pontes, nomeado desembargador pelo governador Renato Casagrande (PSB), após liderar a lista tríplice do MPES, que teve Maria Clara em terceiro lugar. Na lista sêxtupla, que antecedeu a tríplice, ela ficou na segunda colocação.

Oficialmente, a disputa já conta com outros dois nomes além de Maria Clara: o promotor Danilo Raposo, chefe de apoio ao gabinete da PGJ, e o também promotor Pedro Ivo de Sousa, ex-presidente da Espírito-Santense do Ministério Público (AESMP). Enquanto Pedro Ivo é visto como oposição, Danilo é reconhecidamente o candidato de Éder Pontes.

Outros nomes circulam nos bastidores, mas ainda não fizeram suas inscrições, cujo prazo se encerra na próxima segunda-feira (29). Entre eles, o promotor Francisco Martínez Berdeal, atual secretário-geral do gabinete da PGJ e, sabidamente, a preferência de Luciana Andrade. Também é aguardada a oficialização das candidaturas do subprocurador-geral de Justiça Judicial, Josemar Moreira; do subdiretor-geral do MPES, Lidson Fausto da Silva; e do procurador de Justiça Criminal Marcello Queiroz.

Os candidatos mais votados comporão uma lista tríplice que será enviada para o governador, a quem caberá a escolha final.

Divulgação

“A casa da sociedade”

Em sua proposta de independência e renovação, Maria Clara traz como foco um MPES que prioriza suas “atividades-fim”, cuja essência é a “afirmação de direitos”. Para implementá-la, ela defende “um Ministério Público reconhecido, estruturado e valorizado”.

Na entrevista a seguir, a promotora aborda o contexto político em que ocorrem as eleições desse ano e ressalta seu desejo de que o Ministério Público se torne efetivamente “a casa da sociedade”, por meio de um trabalho de aproximação com a população e que concilie seu caráter de autonomia em relação aos demais poderes com as necessárias ações colaborativas com as instituições.

Você se afirma como candidata independente e não de oposição à atual gestão. Por quê?

No Ministério Público do Espírito Santo, que conta com quase 300 membros, nós, que temos mais tempo de casa – eu, por exemplo, com 20 anos de experiência – conhecemos a maioria das pessoas. Me rotular como uma candidata de oposição significaria me posicionar contra colegas que fazem parte da atual gestão e que merecem ter seus méritos reconhecidos. A Administração Superior tem a função de orientar a gestão administrativa do MP, como uma espécie de coordenação. Nesse contexto, sem prejuízo de bons legados a serem mantidos, vejo a necessidade de uma mudança de paradigma na gestão e no projeto do MP do Espírito Santo, o que sustento já há algum tempo.

Além disso, eu tenho uma candidatura independente porque ela não está associada a nenhuma outra, tem uma identidade própria.

Quais são as diretrizes da sua proposta de gestão?

Minha proposta é de um Ministério Público voltado para nossa vocação, ou seja, que invista primordialmente nas atividades-fim, que são a sua essência na afirmação de direitos. Essa proposta se baseia em três pilares: um Ministério Público reconhecido, estruturado e valorizado.

‘Reconhecido’ tem dois sentidos. Um Ministério Público reconhecido “para fora”, é aquele visto como protagonista da transformação social. “Para dentro”, é um Ministério Público que eleva a visibilidade das atuações de todos os seus membros, procuradores e promotores de justiça, e de seus colaboradores.

‘Estruturado’ refere-se ao fortalecimento das promotorias, procuradorias e todas as unidades voltadas à atividade-fim para melhor servir a população, especialmente os promotores e procuradores da base.

‘Valorizado’ é um Ministério Público que é sujeito ativo da tomada de decisão em relação a assuntos importantes para a sociedade no campo externo, em relação aos temas que dizem respeito ao Ministério Público.

Internamente, promotores e procuradores de justiça devem ser valorizados na sua inclusão na tomada de decisão institucional. Por exemplo, o Colégio de Procuradores de Justiça é composto por membros com muita experiência institucional. Eu pretendo andar de mãos dadas com essa experiência se for escolhida Procuradora Geral de Justiça.

Entre as mudanças, você incluiria uma maior independência do órgão em relação ao Poder Executivo e uma maior aproximação com a sociedade?

A autonomia do Ministério Público é um princípio constitucional e fundamental. É um pilar do Ministério Público. Porém, a autonomia não impede que o Ministério Público atue de forma colaborativa. Na Promotoria da Serra, por exemplo, demonstrei que o MPES pode e deve contribuir com o Executivo para ser um exemplo de boas práticas e transparência.

Realizamos projetos colaborativos que trouxeram reconhecimento e eficiência, como o título de cidade mais transparente do Brasil para a Prefeitura da Serra, fruto da atuação conjunta da Promotoria de Justiça com o Município. O resultado foi divulgado pelo Ministério da Transparência e pela Controladoria-Geral da União (CGU). O anúncio aconteceu em 2018 e se manteve nos anos posteriores.

Recentemente trabalhamos junto ao legislativo municipal para criar um Fórum de Integridade para acompanhamento as políticas públicas e atuação dos vereadores. A iniciativa foi super bem recebida e obteve resultados positivos.

Outro exemplo, ainda mais recente, foi o projeto que desenhou, para o Município de Serra, o OCA – Orçamento da Criança e Adolescente. Isso é uma ferramenta de monitoramento desse orçamento que possibilita que o cidadão tenha informações diretamente no Portal da Transparência sobre a participação e execução real da população infantojuvenil no orçamento global da Prefeitura da Serra, tempo real.

Esses feitos só foram possíveis graças à colaboração e respeito mútuos. São iniciativas como essas, baseadas na reciprocidade, que aproximam ainda mais o MP da sociedade.

Após doze anos de predomínio de um mesmo grupo político na PGJ, é a primeira vez que há uma diversificação maior de candidaturas. Acredita que isso é um sinal de que a própria instituição percebe a necessidade de mudança no modelo de gestão?

Concordo parcialmente. A maior parte das outras candidaturas cogitadas, até o momento, provêm do mesmo grupo, que estava junto no último pleito e se fragmentou devido a divergências internas. Acredito que todo modelo de gestão precisa de uma autoavaliação e uma atualização.

Caso isso não ocorra internamente, será feito pelos membros ou pela sociedade. A nossa instituição tem a possibilidade de mudança de paradigma de gestão e eu acredito que precisamos disso. Esse é um dos motivos da minha candidatura. É salutar e democrático para qualquer administração que haja mudança de gestão.

Qual o lugar do Ministério Público Estadual junto aos demais poderes que regem a vida da sociedade. E de que forma ele faz a diferença na vida prática do cidadão?

Essa é a parte que mais me encanta na nossa atuação. O MP deve ser a casa da sociedade, deve ser a primeira instituição que a população recorre ao pensar na garantia de direitos e a primeira a não deixar que esses direitos sejam de alguma forma afetados. Direito à saúde, direito à educação, à segurança, à vida. Somos nós quem promovemos a garantia desses direitos, não à toa somos chamados promotores e promotoras. E só promovemos graças ao diálogo com as iniciativas cívicas e movimentos sociais e especialmente com a colaboração com os demais poderes. A garantia desses direitos só é possível se o MP atuar sempre de forma autônoma, mas colaborativa, com quem pensa e quem executa as políticas públicas para o cidadão, mas sem perder o foco da perspectiva de torná-los realidade.

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