Francisco Celso Calmon defende uma OAB como instituição em defesa do Estado Democrático de Direito
Em manifesto que circula desde o início deste mês em grupos de profissionais do setor, entre eles o “Advogados Capixabas pela Democracia”, o advogado e militante político Francisco Celso Calmon faz um alerta: “a OAB-ES [Ordem dos Advogados do Brasil] não pode servir a dois senhores”, colocando em debate se a Ordem deve ser um órgão meramente corporativo ou uma instituição segundo as normas que a criaram, para defender a Constituição e o Estado Democrático de Direito.
O texto vem ao público duas semanas antes da eleição da diretoria da OAB, que será realizada no próximo dia 18, em Vitória no Centro de Convenções, no bairro Santa Lúcia. Serão eleitos pelo voto direto a diretoria do Conselho Seccional, os conselheiros seccionais titulares e suplentes, os conselheiros federais titulares e suplentes, as diretorias das demais subseções e a diretoria da Caixa de Assistência dos Advogados do Espírito Santo (CAAES).
Três chapas concorrem: uma do atual presidente e candidato à reeleição, José Carlos Rizk Filho, “Prá Frente OAB”, a outra liderada por Erica Neves, “É diferente, é OAB de verdade”, e a terceira, de Alexandre Rossoni, “Agora é nossa vez. Onde todos são iguais”.
Para Francisco Celso Calmon, é necessário evitar que a “OAB institucional se torne um sindicato dos interesses corporativistas e abandone seus deveres maiores, consagrados no artigo 44 dos Estatutos”.
O advogado cita o artigo 44. “A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade: I – defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas”.
A Ordem deve, segundo o os Estatutos, “promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil. § 1º A OAB não mantém com órgãos da Administração Pública qualquer vínculo funcional ou hierárquico”.
Francisco Celso Calmon questiona os programas divulgados pelas chapas concorrentes e afirma que “a Ordem não é um grêmio recreativo, um sindicato, é uma entidade que compõe a Justiça e tem deveres consoantes à Carta Magna, à democracia, ao devido processo legal, e se deles se afasta, é tudo menos OAB”.
Em 2015, ele foi chamado para participar da chapa de Rizk Filho, como estrategista da campanha, ocasião em que ele se colocou como postulante à função de conselheiro federal, condição que o faria aceitar o convite, considerando que poderia levar adiante a pauta memória, verdade e justiça, da qual a OAB nacional havia participado, movimento relacionado aos crimes cometidos pela ditadura militar, período no qual foi preso político. Na eleição de 2018, ele também participou, postulando o cargo de presidente da Caixa de Assistência dos Advogados do Espírito Santo (CAA-ES).
“Afastei-me de qualquer articulação. Mas diante das portas eleitorais, e com o pensamento em Tiago [Fabres, advogado que militou com ele e faleceu prematuramente com pouco mais de 40 anos] darei essa contribuição para a reflexão dos que pensam, não seguem como manada a objetivos menores, e não querem fazer da Ordem apenas um trampolim nas carreiras solos”.
Ele explica: “Existem três chapas em disputa, uma notoriamente de expecto bolsonarista, outra de no mínimo omissa quanto ao bolsonarismo e apoio ao lavajatismo, e outra, cuja ligação com o passado, foi de apoio ao lavajatismo e ao golpe de 2016. Diante desse quadro, como se posicionar?”, comenta.
Francisco Celso Calmon defende que temas como “mercado de trabalho, pró-labores e facilidades para o exercício da profissão não deveriam estar sob moldura corporativa e, sim, inserido no contexto maior, o social, de uma sociedade onde campeia a miséria, pobreza, desigualdade, exploração e preconceitos”.
E destaca que atualmente já morreram mais de 600 mil brasileiros, 2/3 desses poderia ser evitado, se a política bolsonarista não tivesse sido negacionista e genocida. “Não esqueçamos a origem do corporativismo na Itália fascista. Sendo portadora da missão institucional de defesa da justiça social e agindo como sindicato que busca melhorias da remuneração, como coadunar com os direitos humanos, especialmente na advocacia trabalhista?
Celso Calmon comenta ainda sobre o advogado dativo, uma “modalidade de advocacia que se justificava quando não existia a Defensoria Pública (DP). Onde tem Defensoria, não justifica mais a existência do advogado dativo. Sua existência paralela serve para enfraquecer a DP e explorar o jovem advogado recém-formado. O caminho correto é a abertura de novos concursos para a Defensoria Pública”.
Ele ressalta o papel histórico da OAB e afirma que antes poderiam alegar até ingenuidade, mas com o transcorrer da história, “ficou provado que o impeachment da Dilma foi um golpe”. Para ele, “se antes o moralismo pode ter induzido o apoio ao punitivíssimo da Lava Jato, com os fatos, não há mais como negar que esta serviu ao propósito de golpear a democracia, o devido processo legal, os interesses nacionais”.
“A OAB-ES foi aliada (por omissão ou apoio, explícito ou tácito) do golpe de 2016, da Lava Jato, do desvio do devido processo legal e do bolsonarismo. Portanto, tem digitais no morticínio da pandemia e no desmonte do Estado democrático de direito. Assim como membros do Judiciário estiveram de camiseta amarela apoiando o golpe de 2016 na praça do Papa, alguns líderes da OAB também por lá passaram. Até o presente, sequer uma autocrítica”, ressalta.