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População rebate argumentos do presidente do TJES para integrar comarcas

Manifestantes de municípios prejudicados apontam desconhecimento da realidade do interior

As declarações do presidente do Tribunal de Justiça (TJES), Ronaldo Gonçalves, para tentar afastar críticas e defender a extinção de 27 comarcas no Estado, não foram bem recebidas em municípios que perderão as unidades judiciárias e se organizaram em novos protestos nesta quarta-feira (10). Além de condicionar a medida à implementação do Processo Judicial Eletrônico no Estado, alegando necessidade de corte de gastos, o desembargador aponta benefícios para a população e advogados, na contramão do que tem sido pontuado pela própria Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-ES), que entrou com pedido de suspensão no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), pela sociedade civil e por deputados estaduais.

Para a estagiária de Direito Stela Vimercati Martins, da comarca de Dores do Rio Preto (região do Caparaó), onde foi realizado um protesto nesta quarta-feira (10), os argumentos refletem a visão de quem está na Capital e desconhece a realidade do interior.

Segundo ela, moradores como os da zona rural e dos distritos de Pedra Menina e Mundo Novo, já têm que percorrer uma distância considerável para ir até o Fórum no Centro da cidade. Com a integração à Comarca de Guaçuí, essa distância vai aumentar, dificultando ainda mais o acesso à Justiça.

Outro problema apontado por Stela, uma das organizadoras do ato, é que muitos estudantes terão que abrir mão do estágio. Ela afirma que a prefeitura paga as bolsas, o que não será mais possível com a integração. Caso seja encontrada alternativa para o pagamento, ainda assim, não seria possível a permanência. “Teríamos o gasto com transporte, e em muitos casos não daria tempo de sair do trabalho e ir para a faculdade à noite, pois a distância entre Guaçuí e a faculdade é maior”, explica Stela, que afirma que vários estagiários estudam na cidade mineira de Carangolas, que faz divisa com o Espírito Santo.

Ela diz que a possibilidade de perda da oportunidade de trabalho também faz parte da realidade de outros trabalhadores da comarca. “Quando a gente lida com o serviço público, lida com as pessoas, então nosso foco tem que ser as pessoas. Se gera desemprego, afeta a economia da região. Então a economia que o Tribunal quer fazer com a integração trará prejuízos no futuro”, destaca.

Em Fundão, cuja comarca será integrada a da Serra, também houve protesto na manhã desta quarta, com a participação de servidores e da população, inclusive, com apoio da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL). A advogada Rayssa Caldeira Ramos, uma das organizadoras, afirma que um dos argumentos para a integração foi de que Fundão dispõe de linhas do Transcol para que as pessoas possam ir até a Serra, o que é contestado por ela.

Foto leitor

Rayssa relata que existem somente duas linhas, uma que sai de Praia Grande e outra de Timbuí, e, mesmo assim, são escassas. A advogada afirma que as pessoas terão que pegar ônibus da viação Águia Branca, o que já é um custo alto de passagem, e parar na rodovia para pegar outro tipo de condução, já que o ônibus não adentra os bairros.

“Vai ser uma verdadeira peregrinação para ter acesso à Justiça”, reforça, ressaltando que em Serra Sede fica o Fórum Criminal, enquanto que o Fórum do Juizado e o Cível ficam em Novo Horizonte, ainda mais distante de Fundão. Segundo ela, o argumento do presidente do TJES sobre a medida gerar economia não se aplica à realidade de Fundão, pois o custo gerado pela comarca é pequeno, de R$ 40 mil mensais, e o prédio onde funciona é cedido gratuitamente pela prefeitura.

Já o promotor de Justiça de Muqui e Atílio Vivacqua, Fábio Baptista de Souza, acha importante a implementação do Processo Judicial Eletrônico, entretanto, acredita que é preciso levar em consideração que muita gente não tem domínio da tecnologia, acesso à internet e aos equipamentos necessários. “No interior, principalmente, as pessoas têm a necessidade de identidade visual proporcionada pela presença física do Fórum. Essa presença traz equilíbrio e segurança ao ver um local que, para os moradores, é um apaziguador de conflitos”, acrescenta. 

Foto Leitor

Para Fábio, a tecnologia deve ser conjugada com a presença física e é preciso unir esforços entre a OAB-ES, o Ministério Público do Espírito Santo (MPES), a Defensoria Pública (DPES) e municípios integrados, para que se encontre uma solução para a redução dos custos. Ele também sugere a possibilidade de suprimir Varas onde há mais de uma, em vez de deixar os municípios sem comarca.

Quanto à afirmação do presidente do TJES de que os municípios que perderão a presença física do Fórum têm preocupações maiores, como falta de hospitais e de saneamento básico, Fábio discorda. “Não adianta ter saneamento básico e outros serviços públicos, se não há a facilidade de ter na cidade o órgão que julga, se a pessoa está sendo tolhida do direito à Justiça. As pessoas têm que sentir a presença física”, defende.

Em Atílio Vivacqua, a comarca será integrada a de Cachoeiro de Itapemirim. Em Muqui, a de Mimoso do Sul, o que motivou uma carreata na última sexta-feira (5). Na segunda-feira (8) também ocorreu manifestação em Vargem Alta, cuja comarca será integrada à de Cachoeiro de Itapemirim. 

Defesa

Para defender a integração, o presidente do Tribunal de Justiça não poupou críticas, nessa terça-feira (9), aos opositores da medida, como a OAB. Ronaldo Gonçalves afirma que sem a integração não será possível implementar o Processo Judicial Eletrônico e que o cronograma busca cobrir a maioria das comarcas ainda este ano, começando pelas que são objeto da integração. O presidente do TJES salienta que entre as comarcas integradas a maioria não possui juiz titular e servidores em número suficiente.

“É razoável sacrificar a qualidade do serviço prestado a toda população e que beneficiará a grande maioria dos advogados, por causa da minoria supostamente prejudicada? Digo supostamente porque as Comarcas integradas serão as primeiras a receber o Processo Judicial Eletrônico já nos próximos meses. Receberão mutirões para solução do passivo físico, além de postos avançados para atendimento e realização de atos presenciais e virtuais, caso esse seja o interesse do executivo local”, justificou.

O magistrado apontou, ainda, que as cidades que não terão mais o prédio físico do Fórum têm outras prioridades públicas, uma vez que, segundo ele, a maioria “não possui hospital, Corpo de Bombeiros, carecem de água tratada e saneamento básico em vários bairros. ‘Seria mais importante preocupar-se e engendrar esforços para manter o Fórum, do que lutar por serviços essenciais à população?”, provocou.

Além disso, prosseguiu, “essas comarcas, em sua maioria, não tê m prédios da Justiça do Trabalho, da Justiça Federal, nem mesmo Cartório Eleitoral, não existindo movimentos sociais ou da própria Ordem para implantação dos mesmos”.

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Recados – Século Diário

Ronaldo Gonçalves mira nas críticas e protestos: lutar contra integração de comarcas é “retrocesso”

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